Capítulo 7

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Elisa

Fui andando pra casa logo após a saída do Miguel. Eu tenho meu carro, mas usá-lo me traz muitas lembranças, algumas são maravilhosas, mas eu tento deixar guardadas o máximo possível. Meu pai me ensinou a dirigir e foi um tempo bom, eu devia ter aproveitado mais, ter curtido mais o tempo que tinha com ele e com minha mãe, a adolescência é uma fase em que normalmente a gente se afasta um pouco dos pais e eu tive a sorte de não ser assim, hoje seria muito pior se eu fosse uma dessas garotas que teve vergonha dos pais, não seria só saudade, seria saudade e culpa.

O olhar do Miguel quando saiu era tão estranho, não sei se fiz certo, na verdade eu sei que o que eu fiz foi errado, eu sempre afasto as pessoas, é mais forte que eu. Num minuto está tudo bem e no outro eu travo completamente, fico sem saber o que dizer ou fazer, minha mente me prega peças o tempo todo e eu nunca sei se a pessoa realmente se importa ou é apenas pena da pobre órfã, não quero a piedade de ninguém, já basta a Claudia com seu amor exagerado. Sei que ela me ama de verdade, mas sei que sente pena também, nos momentos em que eu sinto o amor eu simplesmente gosto de estar por perto, mas às vezes posso ver nos olhos dela a pena, a vontade de me mudar a todo custo, como se eu não tivesse mais ninguém, e eu realmente não tenho mais ninguém. É uma realidade que dói muito. Sempre soube que em algum momento eu iria precisar de mais, só não sabia que seria assim, que a solidão iria bater tão forte.

Foi uma escolha minha me isolar, perder meus pais e meu futuro irmão foi uma paulada repentina da vida e eu não soube como reagir. Estar bem financeiramente me estagnou um pouco e eu parei no tempo, aos poucos os amigos foram sumindo até que não sobrou ninguém. Eu não fiz muito pra que alguém ficasse.

Reencontrar Luíza foi um presente pra mim, ela trouxe alguma leveza com a sua excentricidade, me deu mais ânimo, mesmo que seja de uma forma tão única, ela me ajuda a me arrumar mais, me obriga a sair, diz que é pra recuperar o tempo perdido, mas ainda assim tem uma vida além de mim. Existem momentos como esse de agora que eu me sinto muito sozinha, ligar pra ela é uma opção, ela viria ate mim no mesmo instante, mas eu não posso mais fazer isso, ela não precisa de uma amiga com tantos dramas, Claudia quando some assim eu sei que tirou um tempo pra ela e Eduardo. Eles precisam disso, um tempo pra eles, longe dos problemas, principalmente dos meus problemas.

Não me dei conta de como cheguei em casa, foi tudo tão automático, apenas me desliguei e fiz tudo de forma repetitiva, estou tão acostumada com o caminho que às vezes apenas ando, meu cérebro desliga de tudo a sua volta e eu não penso, não sinto, é bom não sentir, porém, depois de três anos assim eu não consigo decidir o que é pior, a dor ou o vazio.

Luiza sempre diz pra procurar ajuda, é a única que ainda tenta isso, ela me trata de igual pra igual, sem medos, sem papas na língua. Isso só me faz gostar mais da amizade dela, somos amigas desde sempre, desde o jardim de infância, quando tínhamos dezesseis ela se mudou com a família, tentamos manter contato, mas com o passar do tempo foi inevitável o distanciamento. Revê-la foi bom, trouxemos de volta tudo que vivemos juntas, tudo como antes. Ela entende minha dor e não me deixa afundar nela, mas tudo tem um limite e ela precisa viver sem mim um pouco e todo o peso que eu carrego.

Me jogo no sofá e posso ouvir os meus soluços, choro tudo que tenho em mim, descarrego o meu desespero em forma de lágrimas ate que elas somem e eu vou acalmando a minha respiração, tento secar a bochecha com as costas das mãos, mas eu sou uma bagunça completa agora, mais um suspiro e vou para o banho, acho que a crise de choro de dez ou mais minutos foi o suficiente por hoje.

Tento me desligar do mundo e me concentrar somente em mim, eu sei que preciso reagir, superar tudo e seguir, ser feliz, mas sinto tanto a falta deles aqui. Posso sentir a presença deles em cada canto dessa casa, é como se a qualquer minuto eu fosse ouvir o grito da minha mãe me avisando pra adiantar logo esse banho e mais uma vez eu caio em lágrimas. Sento-me no chão do banheiro e fico por um tenho apenas sentindo a água caindo em mim, disfarçando minhas lágrimas, na esperança de que a água lave a minha dor.

Seguindo em Frente (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora