Capítulo 4

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Miguel

Depois de ajudar Claudia, eu voltei para o meu consultório e trabalhei o restante da tarde, me pegava pensando na menina com carinha de anjo e sua tristeza mal disfarçada, uma garota linda, encantadora, doce, mas infelizmente sem futuro, parada no tempo, vivendo uma vida que não existe e esperando algo que não vai acontecer. Eu não tenho motivos para me preocupar, mas mesmo assim não consigo evitar, deve haver algo que eu possa fazer e com esse pensamento ligo pra minha amiga.

- Oi, Miguel.

- Oi, ainda é boa tarde ou já devo dizer boa noite?

- Boa noite seria o ideal, mas vá direto ao ponto, não teria me ligado se não fosse importante.

Ela me conhece, bem. Tantos anos de convivência. Sabe que eu jamais ligaria sem um motivo real.

- Queria saber como ela está, fiquei preocupado o dia todo, desde que me encontrei com ela no elevador hoje cedo.

- Que elevador?

Elisa não contou. A situação é pior do que eu pensei. Imaginei que Claudia soubesse de tudo.

- Ela não contou?

- Não, solta logo Miguel.

- Pensei que soubesse, ela não estava bem hoje cedo, eu realmente imaginei que ela tivesse contado.

- É disso que eu estou falando, é teimosa feito uma mula empacada, eu não sabia de nada, na verdade foi por você que descobri como ela estava. Essa menina vai me deixar careca viu, não adianta falar Miguel, ela não me ouve mais, já fizemos vários exames, ela não tem absolutamente nada, é fraquinha e fica doente fácil, mas nunca descobrimos nada.

- É algo emocional, coisa da cabeça dela?

- Imagino que sim, eu sugeri terapia, ajuda profissional pra superar tudo, mas foi uma guerra. Ela ficou revoltada, disse que iria largar o emprego e que eu não devia me preocupar tanto, desde então ela sempre me evita e eu não sei mais como ajudar.

É como eu pensei. Elisa precisa muito de ajuda, mas não quer se sentir frágil, pensa que atrapalha a vida das pessoas. Eu consigo entender como se sente.

- Eu poderia ajudar?

- Como? Topo qualquer coisa, já tentei de tudo.

- Não sei bem, não pensei em nada, talvez me aproximar, ela parece ser bem sozinha, se eu conseguir sua amizade pode ser uma forma de tentar uma outra abordagem.

- Pode ser, mas tenho medo disso piorar tudo, ela pode achar que você está fazendo isso por mim.

- Entendi, me deixa falar com ela então, vou tomar cuidado.

- Eu já falei que ela é uma mula empacada, aquela teimosa está na casa dela faz tempo, se eu não levasse teria ido de taxi. Quando coloca algo na cabeça ninguém tira.

- Tudo bem, me passa o numero dela, acho que vai ser bom que ela veja que mais alguém se importa.

Fiquei um tempo pensando se devia ou não ligar, o que falar, e principalmente tentando descobrir o motivo da preocupação. Eu mal conheço essa garota, não quero me envolver, não posso, não quero esse problema. Eu devia me afastar e esquecer essa coisa estranha que ela despertou em mim, mas como sempre a vontade de ajudar é mais forte.

Meu pai bate em minha porta avisando que está de saída.

- Já vai Pai?

- Sua mãe me ligou pra avisar que o jantar está pronto e que te quer em casa essa noite, sem desculpas.

Ele tenta parecer serio, eu consigo ver o sorriso no canto de seus lábios. Não nega nada pra mamãe e por conseqüência disso eu também aprendi a não negar.

- Claro pai, eu estou indo, mas só pra jantar. Não vou passar a noite.

- Se resolva com sua mãe, eu não tenho nada com isso.

- Fala serio pai, medinho da mamãe nessa etapa da vida. Seja homem Dr. Elias.

- Seja homem você e enfrente os seus problemas garoto, se aparecesse mais em casa sua mãe não faria isso, agora levanta essa sua bunda gorda e vamos que eu estou faminto.

Levanto-me e vou até ele, passo meu braço por seu ombro, saímos lado a lado, falando de como foi o dia, e da ligação da mamãe para me convocar pra jantar.

Conversar com meu pai é fácil, tudo flui, ele pensa como eu, ou eu penso como ele. O que importa é que nos damos bem.

- Sua mãe vai ficar maluca quando disser que não vai passar a noite.

Ele diz quando passamos pelo portão principal e avistamos mamãe da janela observando nossa entrada.

- O senhor bem que podia me ajudar.

- Eu? Nem pensar, ela está certa, só quer o filho em casa, o que tem pra fazer sozinho no seu apartamento que não pode ficar pra amanha?

- Nada pai, o senhor tem razão, eu fico.

Mamãe merece que eu fique um pouco mais. Consegui um pouco mais de liberdade e privacidade quando fui morar sozinho. Não custa nada agradar um pouco,

- Eu sempre tenho razão moleque, por isso sou seu pai.

- Certo, super pai. Vamos entrar e ver a super mãe.

Mamãe abre a porta e me abraça antes mesmo de me deixar entrar. Um abraço silencioso que me diz mil palavras. É maravilhoso viver um pouco de calmaria.

- Boa noite filho. Veio pra ficar?

- Vim mãe, sei como à senhora pode ser insistente, sei também que vou perder a briga, então é melhor pular pra parte final. Eu fico.

- Bom garoto, vamos jantar e depois podemos conversar mais tranquilos, seu pai deve estar com fome.

Eles trocam um breve olhar. Cresci vendo esses pequenos gestos entre eles, um amor que é inspirador.

- Eu sempre estou com fome da sua comida, meu amor.

- Ele sempre está com fome mãe.

Falamos ao mesmo tempo e os risos ecoam na sala, é incrivelmente bom passar um tempo com minha família.

- Então vamos jantar, seu irmão não vem essa noite.

- Achei que seria um jantar em família, Por que insiste tanto comigo se com eles não é assim?

- Eles são casados Miguel, tem alguém que cuide deles.

Ela diz como se isso fosse desculpa para tudo, minha solteirice é sempre o motivo pra me encher, mas eu sinceramente não me importo, estar aqui é como voltar à infância, antes do medo e das preocupações.

Ter um canto pra mim é bom, eu amadureci muito morando sozinho. Mesmo o jantar da mamãe sendo o melhor, não imagino como seria voltar a viver aqui.

- Quem sabe eu contrate uma enfermeira pra morar comigo, assim vou ter alguém pra cuidar de mim, e a senhora pode descansar em paz. Não vou me casar tão cedo mãe, as coisas não acontecem dessa forma mãe.

- Não vai contratar ninguém, mamãe cuida de você. Devia voltar a morar aqui filho.

Ela diz me abraçando novamente enquanto caminhávamos para a mesa. Estou acostumado com esse pedido, ouço essas mesmas palavras desde o dia em que me mudei.

- Viu pai, falei que ela não vai desistir nunca.

Digo sorrindo e piscando para o meu pai. 




Agora é boa noite mesmooooo.
Super obrigada por esse carinho.

Seguindo em Frente (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora