Capítulo 8 - Os beduínos

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Chegaram em Suez, após poucas horas de viagem. Rumaram direto ao porto, onde o amigo do senhor Kames pagou um bom preço pela carroça e os dois cavalos que haviam comprado em Alexandria.

Almoçaram na casa de Akin, primo em terceiro grau de Montop, que conhecia um beduíno que esta­va perto da cidade e que os ajudaria a atravessar o deserto. Montop deixou-os com seu primo, precisava voltar para sua cidade.

– Meus amigos, é hora de nos despedirmos! – falou Montop.

– É verdade! Adorei revê-lo, amigo! – falou Albert apertando a mão de Montop.

– Gostei muito de conhecê-lo, Montop. Espero que seja muito feliz com Hasayn.

– Espero que venham ao nosso casamento!

– Faremos o possível, meu amigo! – falou Albert.

– Antes que eu me esqueça, tenho um presente para cada um de vocês! Acho que lhes será muito útil! – falou Montop entregando um pacote para Albert e outro para Jaqueline. Albert e Jaqueline abriram seus pacotes, que continham um livro: “De Humani Corporis Fabrica”.

– Este livro foi publicado pela primeira vez em 1543. É um tratado de anatomia do corpo humano. Eu tenho um e é muito bom. Achei que vocês iriam gostar. – falou Montop.

– É maravilhoso, Montop! Obrigada! Com ele posso treinar meu latim. – falou Jaqueline folheando o livro.

– É verdade, Jaqueline! E, obrigado, meu amigo! Sei que usarei muito este livro. – falou Albert.

Montop montou em seu cavalo, que durante a viagem do Cairo a Suez veio amarrado na parte de trás da carroça.

– Agora eu tenho que ir. Até breve! – falou Montop.

– Até breve, Montop! – falou Jaqueline.

– Até breve, meu amigo! – falou Albert.

Albert e Jaqueline ficaram ali parados, olhando Montop se distanciar. Depois, foram com Akin pegar suas coisas para partirem. Akin, Albert e Jaqueline, montaram cada um em um camelo. Suas bagagens eram levadas por outros dois camelos. Atravessaram o canal de Suez e seguiram em direção a península do Sinai, por um grande deserto areno­so, onde encontrariam o beduíno e sua família.

Ao se aproximarem do acampamento, um jovem veio encontrá-los. Ele vestia uma túnica comprida e folgada, abotoada no pescoço e feita de algodão branco. Na cabeça usava um gorro de algodão branco. Sobre o gorro, usava uma peça de algodão quadrada, com um padrão enxadrezado nas cores da tribo, enrolada de um modo que protegia sua cabeça da poeira, do calor e das moscas. Carregava uma adaga de prata amarrada a cintura. Seus cabelos negros, que iam até o meio das costas, estavam trançados.

Este jovem chamou outros homens, que festejaram com a chegada dos visitantes matando um camelo jovem para oferecer-lhes. Logo, acenderam a fogueira e indicaram um tapete em volta dela para cada um se sentar.

Jaqueline estranhou que não havia mulheres ali, mas ficou sabendo por Akin, que era costume elas se esconderem na tenda quando chegava algum visitante homem que elas não conheciam.

Normalmente, Jaqueline, por ser mulher, não poderia permanecer junto aos homens, mas por ser visi­tante e estrangeira, os beduínos concordaram.

O jantar foi trazido por um menino e consistia em uma travessa de arroz cozido com manteiga e carne de camelo.

Todos os homens da tribo e Akin ficaram de cócoras em torno da travessa. Albert e Jaqueline os imi­tavam. Com a mão direita, faziam pequenas bolas de arroz e as levavam à boca. Akin avisou Albert e Jaqueline que deveriam tomar cuidado para deixar alguma comida na travessa, pois quando terminassem, devolveriam o que sobrou ao interior da tenda para que as mulheres comessem. Ao saber disso, Jaqueline não conseguiu mais comer. Albert a acompanhou.

Terminado o jantar, os homens pegaram areia e a esfregaram em suas mãos para limpá-las. Albert tirou um lenço de seu bolso e ofereceu-o para Jaqueline limpar a sua.

O mesmo menino que havia trazido o jantar, colocou água para ferver em uma panela de latão e pôs para tostar grãos de café em uma frigideira. Depois, moeu os grãos em um pesado almofarizde bronze. Em seguida, despejou o pó em um bule junto com a água fervente, o colocando sobre o fogo para uma nova fervura. Encaminhou-se até a tenda e voltou com sementes de cardamomo. Moeu-as e as adicio­nou ao café. Provou-o e, depois, veio servi-lo.

Com o bule na mão esquerda e várias xícaras em uma bandeja na direita, ele percorreu todo o grupo oferecendo uma xícara para cada um, primeiro os visitantes e depois aos outros, de acordo com a idade de cada um. Ele fez a mesma coisa com uma travessa repleta de tâmaras.

Naquela noite, Akin também dormiria na tenda junto aos outros, mas na manhã seguinte, quando partissem, ele voltaria para Suez.

Na hora de dormir, Jaqueline foi levada pelo menino até o quarto das mulheres. Albert e Akin ficariam com os homens.

A tenda era feita de pelo de cabra, aberta de um dos lados e muito escura em seu interior. O interior da tenda era dividido em dois por uma cortina, que separava o quarto dos homens do quarto das mulheres.

Ao acordarem, o desjejum já havia sido preparado pelas mulheres e consistia de tâmaras, leite de ca­melo e um pouco de pão cozido nas brasas.

Logo, chegaram mais alguns homens trazendo o rebanho de camelos, pois deveriam partir. Es­tava chegando a época da migração de inverno, que seria uma longa marcha rápida para o Nor­te. Nesta época, as chuvas faziam florescer uma rala vegetação e formariam uma vasta pastagem. Precisavam chegar logo a estas pastagens, que eram reservadas para todos os beduínos, mas resguardada apenas pela ordem de chegada ao local. Eles não podiam perder um único dia de boas pastagens, pois os camelos precisavam de um bom pasto para engordarem e suas corcovas ficarem repletas de gordura. Era nessa época que eles procriavam.

Rapidamente desmontaram a tenda e juntaram o rebanho. Akin se despediu de todos e rumou para Suez, enquanto eles rumaram para o norte.

Jaqueline e Albert, então, puderam ver as mulheres. Elas vestiam calças que cobriam completamente as pernas e blusas de gaze branca, sobre os quais usavam vestidos coloridos de mangas compridas e mantos pretos que chegavam até os pés. Cobriam o rosto com véus pretos, deixando apenas uma fresta para pode­rem enxergar. Chegavam a usar de dez a vinte braceletes em cada braço. Nos dedos, usavam anéis de ouro e prata incrustados com pedras preciosas, como a ônix, a turquesa, as cornalinas ou as granadas.

A frente da caravana, ia o chefe, que era seguido pelo resto da tribo e o rebanho. Jaqueline e Al­bert foram colocados exatamente no meio da caravana para que ficassem protegidos e não tivessem problemas.

Ao meio-dia, a caravana parou. Os homens e mulheres desmontaram e curvaram-se sobre a areia, na direção de Meca. O filho mais velho do chefe desenhou um arco na areia. Em seguida, todos os homens jogavam areia sobre o rosto e iniciaram um cântico. As mulheres fizeram suas preces em silêncio. Termi­nado o ritual de oração, comeram e voltaram aos camelos.

Três horas antes do pôr-do-sol, pararam novamente. Arrumaram a tenda e prepararam o jantar que consistia de arroz cozido e parte da carne do camelo abatido no dia anterior. Uma hora depois, houve ou­tra pausa para as orações e, em seguida, jantaram. Albert e Jaqueline foram chamados para ver a ordenha das fêmeas dos camelos.

O ordenhador esfregou com areia uma vasilha. Em seguida, retirou os protetores de lã dos úberesde uma fêmea, deixando que o filhote mamasse um pouco. Apoiou o pé direito no joelho esquerdo e equili­brou a vasilha no colo, enquanto a colocava em baixo do animal. Afagou com suas mãos um dos úberes para estimulá-lo a soltar leite.

Enquanto o jovem trabalhava, Jaqueline e Albert estavam encantados com a agilidade e o equilíbrio que ele possuía. Algumas horas depois, todas as fêmeas estavam ordenhadas e prontas para dormir.

Eles voltaram ao acampamento.

Junto ao crepúsculo houve outras preces e, em seguida, reavivaram a fogueira para fazer o café. Após o tomarem, se recolheram para dormir.

Nos três dias seguintes, os acontecimentos se repetiram como em um ritual diário. Perto da cidade de Auja, que ficava na divisa entre o Egito e Israel, montaram acampamento e dormiram.

Na manhã seguinte, Jaqueline e Albert se despediram dos beduínos. Com seus camelos, Albert e Jaqueline seguiram para a cidade de Beersheba, onde almoçaram. De lá, seguiram para Jerusalém, onde dormiram.

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