Prólogo - Resquícios

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  Seus pés se locomoviam sobre os escombros, ultrapassando alguns corpos destroçados e evitando demorar o olhar sobre os mortos, que variavam entre adultos e crianças.

— Já averiguamos todo o perímetro, senhor. Não há sobreviventes. - Um dos soldados disse, firme e objetivo.

— Tem certeza disso? - Perguntou, e o soldado confirmou rapidamente. O Comandante não sentiu firmeza nas palavras do soldado, porém decidiu não contestá-lo. — Tudo bem! Digam aos demais soldados para retornarem, eu checarei uma última vez. - informou decidido, enquanto afastava-se daquela área.

— Não quer que eu o acompanhe, senhor? - O soldado ofereceu.

— Não será necessário. Agora, vá! - ordenou seguindo adiante, disposto a checar minuciosamente a área da explosão. Seus instintos apontavam para um determinado lugar, algo ali o atraía de uma maneira que ele não conseguia explicar. 

  Deu uma volta no perímetro retirando alguns entulhos que o atrapalhavam na busca por sobreviventes soterrados e, bufando, tanto de cansaço quanto de frustração por não obter sucesso, decidiu retornar ao abrigo improvisado. Na manhã seguinte partiriam de volta a Base.

  Seus pés cessaram quando ouviu uma espécie de tosse. Ele ficou estático por alguns segundos enquanto apurava os ouvidos para conseguir ouvir melhor.
Sons de entulho sendo empurrados.

  O comandante deu uma volta de 360 graus com os olhos, parando num montinho de escombros que, antes, deveria ter sido uma pequena casa de madeira. Ele se aproximou cautelosamente e ficou apenas olhando, para se certificar que fora apenas fruto da sua imaginação.

  Contudo, o escombro fora empurrado novamente. Havia alguém tentando sair dali. Havia um sobrevivente! Ele se animou com a ideia e começou a escavar o resto do que um dia fora uma casa.

Cansado, ele limpou o suor que escorria por sua testa com o antebraço. Suas mãos estavam sujas de terra e com alguns machucados. Seus olhos se iluminaram quando encontrou a mão do sobrevivente. Escavando com mais determinação, ele conseguiu retirá-lo dos escombros.

Era uma garota totalmente desnutrida e esquelética. Ela estava completamente encardida e com o corpo seminu, pois suas roupas estavam rasgadas.

— Meu deus... - Ele sussurrou diante tal sofrimento. Pegou seu cantil de água e a derramou na boca entreaberta da garota. Devido seu estado de saúde ser visivelmente grave, ele acreditou que ela não passaria daquela noite.
**

Fora uma surpresa para o comandante quando recebeu a noticia de que a garota estava entubada e não corria risco de vida.

  Naquela noite, quando retornou ao abrigo improvisado, fora recepcionado pelos olhares inquisitivos dos demais soldados.

— Senhor, nós...

— Não quero ouvir suas desculpas, Soldado. Apenas prepare o soro.

— Sim, senhor. - ele bateu continência se dirigindo a uma parte da tenda que servia como uma cozinha e começou a preparar soro para a sobrevivente. Fora um descuido e o soldado odiava desapontar o comandante.

O comandante aplicou o soro na veia da sobrevivente, desejando secretamente que a mesma conseguisse permanecer viva. Pelo estado da garota, ele a considerava uma guerreira.

— Você acha que ela sobreviverá? - Um dos soldados indagou, observando o corpo anoréxico da garota. O comandante suspirou pesadamente.

— Eu espero que sim.
**
— Comandante? - Uma enfermeira o chamou vindo em sua direção. Ela tinha feições delicadas, embora firmes e determinadas. — A sobrevivente acordou. Achei que deveria avisá-lo, visto que o senhor a salvou.

— Sim. Obrigado. - Ele agradeceu indo em direção a ala onde os casos mais graves eram tratados. Sentiu-se tenso de repente, não sabia o que dizer a ela.

Espiou pela pequena janela que ficava na porta, tendo a visão da frágil garota de cabelos castanhos escuros e curtos, deitada em seu leito. Ela ainda tomava soro e seu rosto transparecia o quanto ainda estava debilitada. "É claro, ela acabou de acordar de um coma." ele pensou, balançando a cabeça de um lado a outro.

— Senhor, não vai entrar? - A mesma enfermeira indagou, atrás dele.

— Ahn, eu... Volto amanhã. - Ele disse, se afastando da porta e sumindo pelo corredor.

Na manhã seguinte ele retornou ao quarto da garota, ficou observando-a novamente pela pequena janela, mas decidiu entrar.

A sobrevivente dormia serenamente, sua feição transparecia tranquilidade. Sem as camadas de sujeira, ele podia notar pequenas características da menina. Ela tinha a pele branca, como se nunca tivesse saído a luz do sol, e pequenas escoriações pelo rosto e pescoço. Além de pequenas cicatrizes, as quais pareciam antigas.  Seus cabelos eram castanhos escuros, lembrando-o a cor de chocolate.

Submerso em observar os detalhes da garota, nem percebeu quando seus olhos se abriram e o fitaram, curiosa.

Q-Quem é você...? - murmurou, com dificuldade. Ele assustou-se momentaneamente com a voz fraca da menina, mas se recompôs direcionando o olhar para os olhos amendoados da sobrevivente.

— Olá. Sou o comandante. - respondeu, acanhado. Ela não demonstrou reação.

— Onde eu estou? O que aconteceu? - Ela o bombardeou com perguntas. — Onde estão os outros? - Ele franziu o cenho com a colocação da menina, mas decidiu não interrogá-la. Certamente, estava com os pensamentos confusos.

— Você está na Base de Treinamento. Houve um grande bombardeio, e... Você foi a única sobrevivente que encontramos. Sinto muito. - Ele disse, sincero. A garota desviou os olhos, embora não demonstrasse nenhum sentimento. O silenciou perdurou por muitos minutos e percebendo que ela não diria mais nada, ele abandonou o quarto.

No dia seguinte, ele retornou a visitá-la, porém foi uma surpresa quando a cumprimentou.

— Quem é você? - Ela indagou como se fosse a primeira vez que o via. Ele franziu o cenho, não entendendo o que havia acontecido.

— O comandante. - respondeu, incerto. Ela assentiu, não falando mais nada. Ele saiu do quarto e parou no corredor, alinhando os pensamentos. Ela era a quinta sobrevivente que perdia a memória após chegar a base.

O Presidente sempre se esquivava de seus questionamentos, mas ele estava disposto a descobrir sozinho.

  Algo de errado estava acontecendo naquela Base, e o comandante temia que suas teorias fossem confirmadas.

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