Capítulo 7 - Mirian

379 64 30
                                    

  A enfermeira retorna ao quarto  e ao notar a ausência de Danton, aproxima-se do ANL estragado.

— O que está acontecendo? - Pergunto, ao vê-la abrir e fechar a boca diversas vezes. Ela se assusta e solta o ANL rapidamente.

— Ah, Jamie, eu pensei que estava dormindo.. - diz, estralando os dedos das mãos em sinal de nervosismo.

— Sue, vá direto ao ponto. - Peço. Ela solta o ar dos pulmões e me encara, com pesar.

— Eu sei que você esteve com os KJ. - ela dispara, deixando-me totalmente sem palavras. Passa longos minutos com ambas em silêncio, minha mente não consegue processar nada, parece estar eternamente em estática.

— Jamie... - Ela quebra o ensurdecedor silêncio.

— Eu não sei do que você está falando.. - tento disfarçar ao encontrar minha voz que estava perdida dentro da bagunça na minha cabeça. Ela entrelaça as mãos e desvia os olhos para o colo.

— Os resultados apontaram o vírus que você carrega no sangue, Jamie. E eu sei disso, porque conheci uma pessoa que passou por uma situação parecida. - Ela diz, soltando o ar de uma vez. — Ela se chamava Mirian e era minha colega de profissão.

— O que houve com ela? - indago, cedendo a curiosidade. Ajeito-me na cama e ela se ajeita na cadeira. Ambas procuramos uma posição confortável, pois sabíamos que a história seria longa.
**
Ano: 1964

  As pessoas na terra estavam enlouquecendo.

O governo totalmente indiferente ao sofrimento da sociedade, não dava a minima para as condições de vida das minorias. O lema era: "Trabalhe e sobreviva. Não trabalhe e morra de fome" No entanto, o desemprego era algo comum, portanto muitas pessoas acabavam morrendo.

Todavia, ninguém se atrevia a questionar o governo. Aceitavam o destino que lhe eram imposto e seguiam suas vidas miseráveis, esperando ansiosamente pela morte. Só assim para poderem descansar daquela vida sofrida.

Naquela tarde de trabalho cansativo, Mirian contava as horas para poder voltar pra casa. Ela estava com fome, sono e dor. O sol castigava os trabalhadores, deixando-os com a pele queimada e uma extrema dor de cabeça. Muitos morriam por causa da exposição constante aos raios ultravioletas, pois uma consulta custava mais do que ganhavam nas colheitas. A maioria não tinha dinheiro para ter um plano de saúde decente.

Quando a primeira corneta tocou, todos soltaram as pás, machados e arados. Suor escorrendo por seus semblantes exaustos, coluna curvada e passos lentos voltando a entrada do campo, onde esperariam o ônibus que os levariam de volta a Comunidade ATP.

Mirian limpou o suor com o antebraço e, com um suspiro pesaroso, se pôs a caminhar na mesma direção que os outros trabalhadores. Porém, lembrou-se de sua bolsa, que ficara num dos armários perto do lugar onde faziam um pequeno intervalo. Xingou-se mentalmente por tê-la esquecido e voltou a passos apressados, temendo perder o transporte.

Entrou na pequena área e abriu o armário, recolheu a bolsa e o fechou novamente. Prestes a sair da área, ouviu duas vozes vindo dos fundos, atrás de um portão de metal. Apurou os ouvidos a fim de ouvir melhor.

— Eu ouvi, Renderick! Eles irão explodir a bomba em breve, temos que agir! - Uma voz feminina clamava, tensa.

— Eu sei! Maldito governo! - A voz, que pertencia a Renderick, exclamou irritado. — Nós iremos a Base esta noite. Recrute o máximo de pessoas dispostas a lutar. Nós resistiremos até o último minuto, Ellien.

Mirian assustou-se ao ouvir o motor alto do ônibus estacionando. Ela olhou para trás, na direção do automóvel velho e viu que faltava apenas duas pessoas para entrar e, se ela demorasse mais um pouco, ficaria para trás.
Encheu o pulmão de ar e começou a correr, chegando a um segundo dele partir.

ResquíciosOnde histórias criam vida. Descubra agora