Capítulo 21 - Scorpion

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Raios reluzentes despontam no céu, o que nos faz cessar os passos. Foco a visão tentando identificar, mas isso me causa uma vertigem que quase me faz cair no chão.

- Consegue ver o que é? - Pergunto à Melina que também se esforça para descobrir. Ela abre um sorriso instantaneamente e me olha empolgada.

- É um Jet! - Exclama e pula de felicidade. - Eles vieram nos buscar! - Ela gargalha e acena para o Jet, que continua se aproximando. Desconfiada, eu apenas respiro fundo desejando que seja real, que seja o fim dessa tortura.

- Vamos! - Ela me puxa ao notar que o Jet pousou a alguns metros a nossa frente. Seguimos em direção, mas eu me canso facilmente e fico para trás. Melina corre e alcança o Jet. Esforço-me a continuar caminhando mesmo sentindo-me zonza.

Alcanço o Jet e me pergunto o por quê dele estar vazio.

- O que aconteceu? - Melina murmura enquanto verifica o interior do transporte. Penso que talvez ela não saiba sobre o ataque à Base. Nem mesmo eu sei se é real. - Por que eles mandariam um Jet sem soldados para nos resgatar?

- Talvez já esteja configurado para nos levar de volta. Ou esperam que a gente resolva isso. - Respondo, decidindo se conto a ela sobre a ligação inoportuna do comandante Lion. Eu ainda não conheço suas reais intenções.

- Acho que não. - Ela diz, pensativa. - Esse não é o padrão de provas do professor Page. Algo não está batendo...

- Muita coisa não está fazendo sentido. Eu quase fui morta por uma máquina KJ. Desde quando isso existe na base? - Faço um desabafo enquanto tento analisar a situação.

Não faria sentido os KJ's atacarem agora se eles me capturaram e obrigaram-me a descobrir os podres do Presidente num prazo de trinta dias. O sistema de segurança do Centro de Treinamento é repleto de dispositivos capazes de identificar e impossibilitar a entrada de um KJ.

- Existem muitas coisas que você e os outros alunos não sabem, Jamie. - Ela diz de modo soturno, enquanto se escora na lataria do Jet, fecha os olhos e solta um suspiro cansado.

- O que, por exemplo? - Questiono interessada em alguma informação que ela possa revelar. Ela balança a cabeça e abre um meio sorriso.

- Eu vejo muitas coisas no laboratório. Coisas que às vezes até eu mesmo chego a duvidar. - Ela limpa o suor na testa com o dorso da mão. - Eu passei muito tempo lá embaixo, Jamie. Sem permissão para conversar com os outros, porque eu poderia soltar informações perigosas.

- Mas você está fazendo isso agora. - Eu aviso de antemão, pois mesmo precisando do máximo de informações possíveis, eu não conseguiria fazer isso prejudicando uma pessoa que me salvou.

- Eu sei. - Ela sorri com sagacidade. - Quando se faz parte de uma equipe de engenheiros e cientistas, você meio que desbloqueia novas habilidades. Por exemplo, saber que a base está sem comunicação neste exato momento. Eles não estão nos ouvindo, apesar de estarem nos vendo.

- Como você sabe? - Indago perplexa com a perspicácia dela. Melina dá de ombros.

- Você deve se lembrar da onda de choque que danificou metade das câmeras da base no semestre passado, não lembra? - Eu assinto com a cabeça. Lembro perfeitamente, pois esse evento facilitou minhas invasões noturnas na despensa da cozinha várias vezes.

- Enfim, a Torre de comunicação também foi atingida e nós, engenheiros da base, não conseguimos reverter o estrago causado. Então, com o pouco material que tínhamos de reserva, construímos um único ponto de áudio e imagem. - Ela ergue a sobrancelha. - O que eu quero dizer, é que esse ponto foi desconectado. Eu sei disso porque a linha da base está fora de sintonia. Os comunicadores estão enviando apenas chiados externos.

- Tá, ok. - Levanto as mãos e peço para ela esperar. - Aonde você quer chegar exatamente?

- Só há uma coisa capaz de interferir nos dispositivos tecnológicos de uma base aérea, Jamie. - Ela murmura, taciturna.

- Kj's? - Pergunto completamente aterrorizada. Ela nega com um aceno, contudo, aquele gesto não me deixa menos preocupada.

- Outra onda de choque. E dessa vez, triplamente mais forte. Uma nova descarga elétrica pode fazer a base despencar.
**

Não tive tempo para entrar em desespero. Assim que Melina terminou a frase, quase fomos atingidas por uma faca Scorpion. Melina se abaixou e eu desviei, fazendo com que a faca se fincasse na lataria do Jet.

Após me recuperar do susto, olho para a floresta em busca da pessoa que nos atacou. Não demora muita e ela se revela, aproximando-se displicentemente com um sorriso debochado nos lábios.

- Você tem sempre a necessidade de ser o centro das atenções, não é? - Melina se levanta e cruza os braços. Tina levanta os ombros e umedece os lábios.

- Eu sou. E sempre tem algum peso morto entrando no meu caminho. - Ela gargalha.

Quando ela chega mais perto, eu vejo que seu estado é péssimo. Sangue seco nas roupas, hematomas pelo corpo e um corte no canto inferior do lábio esquerdo. Seu cabelo antes platinado está com um aspecto endurecido e escuro, como se ela tivesse mergulhado numa piscina de lama.

- Mas é fácil eu me livrar de coisas indesejadas. O que, eu acho realmente decepcionante. Nunca encontro um oponente a altura. - Ela solta uma risada ácida e ergue as sobrancelhas para Melina, desafiando-a para um embate.

Observo a postura de Melina, ela parece confiante e sedenta por uma luta. Tento dizer algo para impedi-la, mas antes que eu possa falar qualquer coisa, ela corre em direção a Tina e tenta golpeia-la, mas Tina desvia agilmente. Melina rosna de ódio e ataca novamente, dessa vez, ela consegue acertar o chute na lateral da perna dela.

Tina gargalha e não mede esforços quando golpeia o rosto de Melina, que tenta se proteger com as mãos. No último movimento, Melina consegue interceptar o soco e rapidamente rodeia Tina, conseguindo prende-la num mata leão. Abro um sorriso apreensivo, torcendo internamente para que Melina coloque Tina em seu devido lugar. Mas a felicidade não dura muito, porque com uma força exacerbada, Tina consegue puxa-la por cima dos ombros e derruba-la de costas no chão. Melina arqueja e geme de dor. Tina ajoelha em seu tórax e Melina grita de dor.

Consternada, penso em uma forma de faze-la parar. Minhas mãos tremem, um suor gelado desliza pelo meu rosto e minha vista começa a falhar. Sei que são sinais da minha doença avisando-me que ela ainda existe e que vai me fazer falhar. Respiro fundo e cambaleio para trás, parando ao lado da faca fincada no Jet. Sem tempo para escolhas, arranco-a de lá e aproximo-me sorrateiramente de Tina, colocando a faca em seu pescoço.

- Cuidado, Jamie. Essa faca pode machucar alguém. - Ela murmura debochadamente. Concentro-me em firmar o aperto na faca, pois o tremor nas minhas mãos pode derruba-la.

- Levanta. - Digo em tom ameaçador. Tina solta uma risada, mas faz o que eu pedi. Melina arfa de dor no chão. - Que merda você quer, Tina?! Você está enlouquecendo. - Eu grito com todo o ódio que estou sentindo.

- É sempre sobre o que eu quero. - Ela diz. - Mas o problema é esse, afinal. Eu faço o que eu quero, mesmo que não seja certo. Mesmo que machuque pessoas. Eu venho em primeiro lugar.

- Você está doente! Nem todos são seus inimigos. - Eu digo tentando manter o foco, mas sinto uma pontada forte na minha cabeça. Algo eletrizante começa a circular pelo meu corpo. Sei que é o vírus. Tento não me contorcer, mas minhas pernas começam a falhar. Tina percebe que há algo acontecendo e se aproveita do momento para retomar o controle.

Num reflexo ágil, ela toma a faca da minha mão e aponta para meu rosto. Na medida em que me afasto, ela se aproxima com um olhar cominador. Com um sorriso dúbio nos lábios, ela diz:

- Eu sou meu próprio inimigo. - E corre em minha direção. Um som alto chicoteia o ar e Tina paralisa a centímetros de mim. A faca cai sobre meus pés, depois Tina cai debruçada no chão. Em seu ombro há um dardo tranquilizante.

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