Capítulo 17: Segredos revelados

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Sabe aquelas cenas de filme em que o casal dorme juntinho e quando um deles acorda, fica admirando o outro dormir? Ela sempre me pareceu algo tão mágica quando vista ali na tela, mas na vida real me custava entender o que há de tão especial e maravilhoso naquilo. "Deus me livre alguém me ver dormindo de boca aberta, talvez babando e ainda por cima toda esparramada pela cama" era o que vivia dizendo para Olívia quando comentávamos essas cenas.

Mas comecei a entender toda aquela mágica das cenas dos filmes na primeira vez em que João passou uma noite aqui em casa e pude vê-lo dormir. Isso, inclusive, está se tornando um hábito entre nós. Já estamos no final de abril e perdi as contas de quantas vezes ele dormiu aqui depois de uma das nossas reuniões da quinta, das festas ou nos finais de semana que queríamos curtir um pouco mais a companhia um do outro. E vê-lo dormir não é algo difícil; ele sempre chega tão cansado que, mesmo querendo muito estar comigo, acaba caindo no sono ou então aproveita o final de semana para dormir até mais tarde.

Não posso negar que o fato de ainda não conseguir me entregar para ele, mesmo após todos esses meses e todas as vezes em que dividimos a mesma cama, ainda me incomoda. João tenta não me dizer isso ou deixar muito nítido, mas sei que isso está começando a ser um incômodo para ele. Talvez ele esteja até começando a pensar que não confio nele o suficiente, não sei. Só que ele não é o único a se sentir incomodado com isso. Também é horrível para mim que vivo me perguntando o que há de tão errado comigo para não me sentir à vontade para continuar quando as coisas começam a esquentar.

Só que, mesmo com todo esse mal estar, não troco a sensação de acordar ao lado dele e ter o seu rosto como a primeira imagem do meu dia. Ao contrário de mim, ele dorme de uma forma tão serena que me parece o sono de uma criança, que ainda não conhece metade dos problemas do mundo; a sua expressão enquanto dorme carrega uma tranquilidade que nem mesmo nos seus melhores dias sou capaz de presenciar. E não quero nem falar de como o meu coração bate acelerado todas as vezes que os seus olhos se abrem devagar e um sorriso brota em seu rosto sonolento.

Mas não é isso que vejo agora. Essa tarde, quando chegou no meu apartamento, seu nível de cansaço era tão grande, que dormiu nos primeiros minutos do filme que ele mesmo sugeriu - não é o meu gênero preferido, mas quis dar uma chance e aproveitar sua companhia. Não achei ruim quando notei que ele dormiu logo nas primeiras cenas, mas também não continuei assistindo aquele filme. Fiquei o observando por um tempo, mas não me demorei, porque decidi aproveitar seu sono para escrever, algo que não estava conseguindo fazer em meio a tantos trabalhos. Mas, é claro, olhando para ele em alguns momentos para deixar que meu coração se encha desse sentimento bom.

Mergulho tão profundamente no universo de The Debate Club que só noto que o meu namorado acordou quando sinto seus braços me envolverem e seus lábios depositarem beijos em meu pescoço, descendo para o meu ombro. Sorrio com os seus carinhos.

- Posso saber o que a minha namorada está fazendo que tá deixando ela tão concentrada assim? - pergunta entre os beijos, com sua voz ainda rouca e seu hálito quente em minha nuca.

Aquela pergunta, que normalmente acharia divertida, dessa vez faz com que uma ideia surja. Não sei o porquê, mas ter sido pega escrevendo, de uma maneira que não dava para disfarçar, fez com que aquele momento parecesse perfeito para me abrir com ele sobre esse assunto, compartilhar, mesmo que por alto, essa paixão e, de quebra, ainda tirar aquele restinho de dúvida sobre ele ser ou não o meu leitor misterioso.

- Estou escrevendo! - digo, tentando soar empolgada e aguardando a reação dele. Será que ele me perguntará o que? E será que se interessará pelo que estou escrevendo?

Leitor AnônimoOnde histórias criam vida. Descubra agora