Que ridículo. Eu não devia ter de fugir.
Decidi permitir-me um olhar de relance para a mesa dos amigos do Bieber. Se ele estivesse a olhar-me com um ar ferroz, eu faltaria a próxima aula, como cobarde que eu era.
Mantive a cabeça baixa e olhei por baixo das minhas pestanas. Nenhum deles estava a olhar na minha direção. Levantei um pouco a cabeça.
Estavam a rir-se. Tanto Justin como Ryan e Carly tinham o cabelo completamente repleto de neve a derreter-se. Desfrutavam do dia nevoso, tal como todos os outros, só que eles pareciam mais formar uma cena retirada de um filme do que o resto de nós.
No entanto, além do riso do espírito de brincadeira, havia algo diferente e eu não conseguia determinar ao certo em que é que consistia essa diferença. Examine Justin de forma mais minuciosa. Cheguei à conclusão de que a sua pele estava menos pálida. Havia, porém, algo mais. Ponderei, olhando-os fixamente, tentando isolar a mudança.
- "Sell, para que é que estás a olhar?" - Intrometeu-se Cristiana, seguindo o meu olhar fixo.
Nesse preciso momento, os olhos dele deslocaram-se para se cruzarem com os meus.
Baixei a cabeça, deixando os cabelos caírem para me ocultarem o rosto. Tinha, todavia, a certeza de que, no instante em que nossos olhares se cruzaram, ele não parecia descortês ou hostil como acontecera da última vez que o vira. Parecia, de novo, meramente curioso, insatisfeito sob algum aspeto.
- "O Justin Bieber está a olhar-te fixamente." - Comentou Cristiana ao meu ouvido, soltando risinhos.
- "Não parece zangado, pois não?" - Não consegui evitar a pergunta.
- "Não" - Respondeu ela, parecendo confusa com a minha pergunta - "Devia estar?"
- "Acho que ele não gosta de mim." - Confessei.
Sentia-me ainda indisposta. Pousei a cabeça no braço.
- "Tanto o Bieber como os amigos dele, não gostam de ninguém... bem, não se mostram delicados o suficiente para que as pessoas gostem deles. Mas ele continua a olhar-te fixamente."
- "Pára de olhar pra ele" - Murmurei com alguma exasperação.
Soltou um riso abafado, mas desviou o olhar. Levantei a cabeça o suficiente para me certificar de que ela o fazia, encarando a possiblidade de recorrer à violência se ela oferecesse resistência.
Nick interrompeu-nos nesta altura. Estava a preparar uma épica batalha da nevasca parque de estacionamento depois das aulas e queria que nós participassemos. Cristiana acenou com entusiasmo. A forma como ela olhava agora para Nick deixava pouca margem de dúvidas relativamente ao facto de que estaria disposta alinhar no que quer que fosse que ele sugerisse. Eu mantive-me calada. Teria que me esconder nos alunos que iriam no autocarro para que assim pudesse passar por despercebida e ir pra casa.
Durante o resto da hora de almoço, mantive, com extremo cuidado, os olhos pregados na minha própria mesa. Decidi honrar o compromisso que firmara mim mesma. Como ele não tinha um ar zangado, eu assistiria a próxima aula. O meu estômago dava pequenas voltas de pavor ao pensar que iria sentar-me novamente ao seu lado ao ver as mesas todas ocupadas menos a que ele sempre ia.
Não queria propriamente caminhar até à aula na companhia de Nick, como era hábito, ele parecia ser um alvo privilegiado para os atiradores de neve, mas quando olhamos sobre a janela se lamentaram uníssono. A chuva caia, apagando todos os vestígios de neve em faixas límpidas e glacias que escorriam pela berma da passagem para peões. Coloquei o capuz na cabeça, estando, no meu íntimo, satisfeita. Estaria livre para ir diretamente pro autocarro após a aula de ginástica.
O professor Jorge circulava pela sala, distribuindo um microscópio e uma caixa de dispositivos por cada mesa. Ainda faltavam alguns minutos para o início da aula e na sala imperava o burburinho das conversas. Mantive o olhar afastado da porta, rabiscando a capa do meu caderno de apontamentos.
Ouvi nitidamente a cadeira que se encontrava ao meu lado mover-se, mas os meus olhos permaneceram cuidadosamente concentrados nos motivos que eu estava a desenhar.
- "Olá" - Disse uma voz suave, melodiosa.
Ergui o olhar, aturdida por ele estar a dirigir-me a palavra.
Estava sentado tão distante dm relação a mim quando a bancada permitia, mas sua cadeira estava virada na minha direção. Tinha o cabelo molhado ao ponto de gotejar, em desalinho, mesmo assim, parecia alguém que acabara de participar na filmagem de um anúncio publicitário a gel capilar. O seu rosto deslumbrante tinha uma expressão amigável, aberta, com os lábios perfeitos a esboçarem um ligeiro sorriso. Os olhos, porém, espalhavam algum cuidado.
- "Chamo-me Justin Bieber." - Prossegiu - "Não tive a oportunidade de me apresentar na semana passada. Deves ser a Sell Gomez."
A minha cabeça girava de tão confusa. Será que tudo aquilo fora fruto da minha imaginação? Ele estava, agora, a ser perfeitamente delicado. Eu tinha de falar, ele estava à espera. Não me ocorria, contudo, nada convencional para dizer.
- "Como é que sabes o meu nome?" - Balbucei.
Ele riu-se de uma forma suave e encantadora.
- "Oh, acho que todos sabem o teu nome. Está na lista de quando o professor faz as apresentações e chama pelos nossos nomes."
Esbocei um esgar. Sabia que tal correspondia à verdade.
- "Não" - Insisti estupidamente - "O que eu queria perguntar era porque motivo me chamaste Sell."
Ele pareceu confuso.
- "Preferes Selena?"
- "Não, gosto de Sell" - Retorqui - "Mas julgo que o meu pai deve chamar-me Selena nas minhas costas, parece que é por esse nome que todas as pessoas daqui me conhecem" - Tentei explicar, sentindo-me uma completa imbecil mental.
- "Ah"
Deu o assunto por encerrado. Eu desviei o olhar com algum constrangimento.
Felizmente, o professor Jorge deu início à aula nesse momento. Tentei concentrar-me enquanto ele explicava o trabalho do dia. Os dispositivos que se encontravam na caixa desenrolados. Trabalhando como parceiros de laboratório, tínhamos de separar os dispositivos referentes às células da extremidade da raiz da cebola consoante as fases mitose que representavam e classifica-los em conformidade com estes aspetos. Não podíamos consultar os livros. Vinte minutos depois, ele faz uma ronda pelas mesas para ver quem acertara.
- "Comecem" - Ordenou.
- "Primeiro, as senhoras, parceria?" - Perguntou Justin.
Eu levantei o olhar e vi-o a esboçar um sorriso constrangido tão belo que eu conseguia apenas fita-lo como uma idiota.
- "Ou, se desejares, posso ser eu a começar."
O sorriso esbateu-se, ele começava evidentementea perguntar-se se eh seria mentalmente boa da cabeça.
- "Não" - Disse eu - "Eu começo."
Estava a exibir-me, apenas um pouco. Já realizara este trabalho e sabia procurar. A tarefa adivinhava-se fácil. Coloquei o primeiro dispositivo sob o microscópio e regulei este rapidamente para a objetiva de 40x. Examinei o dispositivo durante breves instantes.
A minha avaliação era segura.
- "Prófase."
- "Importas-te que dê uma olhada? - Perguntou ele quando eu começava a retirar o dispositivo.Continua...
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Luz E Escuridão
Romance"Nunca refletia longamente sobre a forma como morreria, ainda que, ao longo dos meses anteriores, tivesse tido de sobra para tal, mas mesmo que o tivesse feito, jamais teria imaginado que seria assim. Olhei fixamente para o lado oposto da longa sal...