- Tens a certeza de que não te importas... não tencionavas convida-lo? - Insistiu ela quando lhe disse que não me importava minimamente.
- Não, Cris, eu não vou - Assegurei-lhe.
A dança não era claramente um dos meus talentos.
- Vai ser extremamente divertido.
A sua tentativa no sentido de me convencer era desprovida de entusiasmo. Suspeitava que Cristiana preferia a minha inexplicável fama à minha companhia propriamente dita.
- Diverte-te com o Nick - Incentivei-a.
No dia seguinte, fiquei surpreendida com o facto de a Cristiana não se mostrar efusiva como era seu hábito nas aulas de Trigonometria e espanhol. Permaneceu calada enquanto caminhava ao meu lado nos intervalos das aulas e eu receava perguntar-lhe o motivo. Se Nick recusara o seu convite, eu era a última pessoa a quem ela quereria contar.
Os meus medos foram reforçados durante o almoço, quando Cristiana se sentou tão longe de Nick quanto possível, conversando animadamente com Pedro. Nick estava invulgarmente calado.
E continuava calado ao acompanhar-me até à aula, sendo a expressão de pouco à vontade estampada no seu rosto um mau sinal. No entanto, só abordou o assunto quando eu me sentei no meu lugar e ele se empoleirou na minha mesa. Como sempre, eu estava eletricamente ciente da presença de Justin, sentado ao alcance do meu toque e tão distante como se fosse um mero fruto da minha imaginação.
- Pois - Disse Nick, olhando para o chão - A Cristiana convidou-me para o baile de Primavera.
- Isso é ótimo - Fiz com que a minha voz parecesse animada - Vais divertir-te imenso com a Cristiana.
- Bem... - Hesitou ao examinar o meu sorriso, nitidamente nada satisfeito com a minha reação - Eu disse-lhe que tinha de reflectir sobre o assunto.
- Porque farias isso?
Deixei que a reprovação marcasse o meu tom de voz, embora tivesse ficado aliviada com o facto de ele não lhe ter dado um não redondo como resposta.
O seu rosto estava tingindo de uma tonalidade vermelho ao baixar novamente o olhar. Um sentimento de pena abalou a minha determinação.
- Estava a perguntar-me se... bem, se estarias a pensar convidar-me.
Detive-me por um momento, odiando a onda de culpa que me assolava, mas vi, pelo canto do olho, a cabeça de Justin inclina-se na minha direção.
- Nick, acho que devias aceitar o convite dela - Afirmei.
- Já convidaste alguém?
Será que Justin reparou na forma como os olhos de Nick tremularam na sua direção?
- Não - Assegurei-lhe - Nem sequer vou ao baile.
- Porque não? - Perguntou Nick.
Não queria correr riscos de segurança que a dança representava, pelo que fiz rapidamente novos planos.
- Vou a Seattle nesse sábado - Expliquei.
De qualquer modo, precisava de sair da cidade, subitamente, sugeriu a altura ideal para o fazer.
- Não podes ir noutro fim-de-semana?
- Lamento, mas não - Respondi - Não deves, portanto, fazer a Cris esperar mais. É uma falta de educação.
- Sim, tens razão - Resmungou ele e voltou-se, abatido, para regressar ao seu lugar.
Fechei os olhos e exerci pressão com os dedos sobre as têmporas, tentando expulsar a culpa e a compaixão da minha cabeça. O professor Alberto começou a falar. Suspirei e abri os olhos.
Justin estava a fitar-me com um ar curioso, sendo agora aquele conhecido laivo de frustação ainda mais distinto nos seus olhos agora negros.
Retribui-lhe o olhar, surpreendida, esperando que ele se apressasse a desviar o seu, mas, em vez disso, continuou a fixar os seus olhos nos meus com uma intensidade inquisidora. Não se colocava a questão de eu desviar o olhar. As minhas mãos começaram a tremer.
- Sr. Bieber? - Chamou o professor, pretendendo a resposta a uma pergunta que eu não ouvira.
- O ciclo de Krebs - Respondeu Justin, mostrando relutância ao virar-se para dirigir o olhar ao professor Alberto.
Olhei para o meu livro assim que os seus olhos me libertaram, tentando situar-me. Cobarde de sempre, coloquei o meu cabelo sobre o ombro direito para ocultar o rosto. Não conseguia acreditar na torrente de emoção que pulsava o meu íntimo, apenas, porque, por acaso, ele me olharia pela primeira vez em meia dúzia de semanas. Não poderia permitir que exercesse tamanha influência sobre mim. Era patético. Mais do que patético, era doentio.
Esforcei-me enormemente por me alhear da sua presença durante o tempo que restava da hora de aula e, visto que tal era impossível, pelo menos por não dar a perceber que lhe dava importância. Quando a campainha tocou, virei-lhe as costas para reunir os meus pertences, esperando que ele saísse logo, como era habitual.
- Sell?
Eu não deveria estar tão familiarizada com a sua voz, como se tivesse conhecido o seu som durante toda a minha vida e não apenas durante umas escassas semanas.
Voltei-me, lentamente, de má vontade. Não queria sentir o que sabia que iria sentir quando olhasse para a sua face demasiado perfeita. Tinha uma expressão de cautela estampada no rosto quando finalmente me virei para ele, a do seu era indecifrável. Ele nada disse.
- O que foi? Já voltaste a falar comigo? - Perguntei finalmente, com um laivo de petulância não intencional na minha voz.
Os seus lábios controceram-se, tentando conter um sorriso.
- Não, nem por isso - confessou.
Fechei os olhos e inspirei lentamente pelo nariz, consciente de que estava a ranger os dentes. Ele esperou.
- Então, o que queres Justin? - Perguntei, mantendo os olhos fechados, assim, era mais fácil conversar de forma coerente.
- Desculpa. Eu sei que estou a ser muito indelicado, mais é melhor assim, a sério.
Parecia sincero. Abri os olhos. O seu rosto estava extremamente sério.
- Não sei ao que te referes - Afirmei, com uma voz cautelosa.
- É melhor que não sejamos amigos - explicou - Confia em mim.
Semicerrei os olhos. Já ouvira aquelas palavras antes.
- É pena que não tenhas percebido isso antes - Disse, com raiva entre os dentes - Terias evitado todo esse arrependimento.
- Arrependimento?
O termo e o meu tom de voz apanharam-no desprevenido.
- Arrependimento em relação ao quê?
- Em relação ao facto de não teres simplesmente deixado que o raio daquela carrinha me tivesse esmagado.
Ele ficou atónito. Olhava-me quase parecia enfurecido.
- Julgas que eu me arrependo de te ter salvado a vida?
- Eu sei que te arrependes de tê-lo feito - Disse com brusquidão.
- Tu não sabes nada.
Estava, sem dúvida, enfurecido.
Virei-lhe a cara bruscamente, cerrando os maxilares para travar todas as desenfreadas acusações que queria dirigir-lhe. Reuni os meus livros e, em seguida, levantei-me e encaminhei-me para a porta. Queria realizar uma saída dramática da sala, mas, como é evidente, fiquei biqueira da bota presa na ombreira da porta e deixei cair os meus livros. Fiquei ali especada por um instante, pensando deixá -los ali. Depois, suspirei e curvei-me para apanha-los. Ele estava ali, já os empilhara. Entregou-mos, com uma expressão dura no rosto.
- Obrigada - Disse glacialmente.Continua...
VOCÊ ESTÁ LENDO
Luz E Escuridão
Romance"Nunca refletia longamente sobre a forma como morreria, ainda que, ao longo dos meses anteriores, tivesse tido de sobra para tal, mas mesmo que o tivesse feito, jamais teria imaginado que seria assim. Olhei fixamente para o lado oposto da longa sal...