Olá Justin!

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Seguimos em silêncio. Estava tão absorta nos meus pensamentos que mal notava a presença do meu pai. Tinha a certeza de que o meu comportamento defensivo de Justin no corredor era a confirmação das bizarras ocorrências que ainda mal acreditava ter presenciado.
Quando entramos em casa, o meu pai falou finalmente.
- Hum... temos que falar com a tua mãe.
Baixou a cabeça, invadido por um sentimento de culpa.
Fiquei aterrada.
- Contaste à mãe!
- Desculpa.
Ao sair bati com a porta do carro do meu pai com um pouco mais de violência do que a necessária.
A minha mãe estava histérica, como é evidente. Tive que lhe dizer que me sentia otimamente no mínimo trinta vezes até que se acalmasse.
Estava consumida pelo mistério que Justin representava e mais do que um pouco obcecada pelo próprio Justin. Parva, parva, parva.
Decidi que mais valia deitar-me cedo nessa noite. O meu pai continuava a vigiar-me cheio de cuidados e este fato começava a enervar-me. Ao dirigir-me ao quarto, fiz uma paragem na casa de banho para ir buscar três comprimidos Tylenol. Surtiram, de facto, efeito e, à medida que a dor se atenuava, eu adormecia.
Essa foi a primeira noite em que sonhei com Justin Bieber.
No meu sonho, estava muito escuro e a luz esbatida que existia parecia irradiar da pele de Justin. Eu não conseguia ver-lhe o rosto, amas apenas as costas, à medida que se afastava de mim, deixando-me no negrume. Por mais depressa que corresse, não conseguia alcança-lo, por mais algo que o chamasse, ele nunca se virava. Agitada, acordei a meio da noite e não consegui voltar a adormecer durante aquilo que me pareceu um longo lapso de tempo. Depois disso, ele esteve presente nos meus sonhos praticamente todas as noites, mas sempre na perifera, nunca ao meu alcance.
O mês que se seguiu ao acidente foi intranquilo, tenso e, a princípio, embaraçoso.
Para minha consternação, dei por mim a ser centro das atenções durante o resto daquela semana. Marcos estava impossível, seguindo-me para todo o lado, obcecado com a ideia de me ressarcir de alguma forma. Tentei convencê-lo de que o que eu queria, acima de tudo, era que ele esquecesse aquilo, mas ele manteve-se insistente. Seguia-me nos intervalos das aulas e ao almoço sentando-se à nossa mesa, que estava agora apinhada de gente. Nick e Pedro mostraram-se ainda mais hostis relativamente a ele do que em relação ao outro, e preocupou-me o facto de ter conquistado um novo admirador indesejado.
Ninguém parecia preocupado com Justin, embora eu tenha explicado repetidas vezes que fora ele o herói.
Tentei ser convincente. Nick, Pedro e todos os restantes comentavam sempre que nem sequer o tinham visto lá até a carrinha ter sido removida.
Perguntei a mim mesma porque motivo é que ninguém o vira de pé a uma distância tão considerável antes de estar súbita e incrivelmente a salvar-me a vida. Com desgosto, apercebi-me da causa provável, mais ninguém estava atento a Justin como sempre eu estava. Ninguém o observava da mesma forma que eu. O que era muito estranho para alguém que tinha anteriormente uma fama nada agradável. Ou será que foi invenção de Cristiana? Quem o vê, não daria em hipótese alguma que ele era de namoricos.
Justin esteve rodeado por multidões de curiosos espectadores ávidos do seu relato de primeira mão. Como de costume, as pessoas evitavam-no. Os amigos dele sentaram-se à mesma mesa, como sempre, não comendo, mas apenas conversando entre si. Nenhum deles, sobretudo Justin, voltou a olhar na minha direção.
Quando se sentou ao meu lado na aula, tão longe de mim quanto a mesa permitia, parecia totalmente alheio à minha presença. Só as vezes, quando os seus punhos se cerravam subitamente, é que eu me interrogava se estaria tão absorto como aparentava.
Ele gostaria de não me ter afastado da trajetória da carrinha de Marcos, não haveria outra conclusão a que pudesse chegar.
Queria muito conversar com ele e, no dia posterior ao acidente, tentei. Da última vez que estivemos juntos, à entrada do serviço de urgência, estávamos ambos imensamente furiosos. Eu estava ainda mais zangada com o facto de ele se recusar a confiar-me a verdade, ainda que eu estivesse a cumprir à risca a minha parte do acordo. No entanto, ele salvara a minha vida, independentemente da forma como o fizera, e, de um dia para o outro, o calor da minha raiva extinguira-se para se transformar em temerosa gratidão.
Ele já estava sentado quando cheguei à aula, olhando-me em frente. Sentei-me, esperando que se voltasse na minha direção. Não evidenciou qualquer sinal de que se apercebera da minha presença.
- Olá Justin! - Exclamei de forma amável, para lhe mostrar que iria portar-me bem.
Ele virou um pouco a cabeça em minha direção sem cruzar o seu olhar com o meu, acenou uma vez com a cabeça e, em seguida, olhou no sentido oposto.
Este foi o último contacto que tivemos, embora ele estivesse ali, a trinta centímetros de distância, todos os dias. Por vezes, observava-o, não sendo capaz de o evitar, ainda que alguma distância, na cantina ou no parque de estacionamento. Via os seus olhos claros tornarem-se mais escuros a cada dia que passava. Na aula, todavia, eu não aparentava dar-lhe importância do que ele a mim. Estava infelicíssima. E os sonhos continuavam.
Nick, pelo menos, ficou satisfeito com a manifesta frieza que existia entre mim e o meu colega de sala. Eu via que ele estava preocupado com a possibilidade de o ousado resgate que Justin protagonizava me ter impressionado e ficou aliviado por tal parecer ter surtido o efeito contrário. Tornou-se mais confiante, sentando-se na minha mesa para conversar antes da aula ter início, ignorando Justin tanto quanto ele nos ignorava.
A neve desapareceu definitivamente depois daquele único e perigoso dia. Nick estava desiludido por não ter chegado a organizar a sua lua de neve, mas satisfeito pelo facto da viagem à praia poder realizar-se em breve. A chuva, porém, continuava a cair copiosamente e as semanas foram passando.
Cristiana informou-me acerca de um outro acontecimento que começara a surgir do horizonte, telefonou na primeira terça-feira de março pedindo a minha permissão para convidar Nick para o baile de Primavera, que decorria dentro de duas semanas, e para o qual eram as raparigas que escolhiam o seu par.

Continua...

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