Encaminhei-me para a aula de inglês num estado de estupefacção. Ao entrar na sala, não me apercebi sequer de que a aula já começara.
- Obrigado por se juntar a nós, menina Gomez - disse o professor Carlos de forma depreciativa.
Enrubesci e precipitei-me para o meu lugar.
Só quando a aula terminou é que me apercebi que Nick estava sentado no seu lugar habitual, ao meu lado. Senti uma ponta de culpa. No entanto, tanto ele como Pedro se encontraram comigo à porta como era costume e, assim, deduzi que o seu perdão era possível. Nick parecia tornar-se mais ele próprio à medida que íamos caminhando, passando a estar entusiasmado ao referir-se às previsões do boletim meteorológico para o fim-de-semana seguinte. Supostamente, iria haver uma pausa mínima no tempo chuvoso e, deste modo, talvez a sua viagem à praia pudesse realizar-se. Tentei parecer anciosa, de modo a compensa-lo pela desilusão que eu lhe provocara no dia anterior. Era difícil, com ou sem chuva a temperatura não ultrapassaria os nove graus, se tivéssemos sorte.
O resto da manhã passou sem que nada ficasse retido na minha memória. Era difícil acreditar que eu não imaginara aquilo que Justin dissera nessa manhã e o seu olhar. Talvez se tratasse apenas de um sonho extremamente convincente que eu confundira com a realidade. Está hipótese era mais provável do que a de que eu o cativava fosse a que nível fosse.
Assim, estava impaciente e assustada quando eu e Cristiana encontramos na cantina. Desejava ver o rosto dele para verificar se voltara a ser a pessoa fria e indiferente que eu conhecera ao longo das semanas anteriores ou se, por algum milagre, eu realmente ouvira aquilo que pensava ter ouvido nessa manhã. Completamente alheia à minha desatenção, Cristiana tagarelava incessantemente a propósito dos seus planos para o baile, Ana e Inês tinham convidado os outros dois rapazes para irem juntos.
A desilusão invadiu-me quando os meus olhos focaram infalivelmente a mesa de Justin. Só os quatro ali se encontravam, ele estava ausente. Será que foi pra casa? Arrasada, segui Cristiana que continuava a tagarelar, ao longo da fila. Perdera o apetite, comprei unicamente uma garrafa de limonada. Desejava apenas ir sentar-me e amuar.
- O Justin Bieber está, de novo, a olhar-te fixamente - afirmou Cristiana, rompendo finalmente a minha abstração ao pronunciar o nome dele - Pergunto-me porque estará ele hoje sentado a uma mesa sozinho.
Levantei a cabeça bruscamente. Segui o olhar dela e deparei com Justin, esboçando um sorriso constrangido, olhando-me fixamente a partir da mesa vazia no lado da cantina oposto aquele em que costumava sentar-se. Assim que os nossos olhares se cruzam, levantou uma mão e fez um gesto com o dedo indicador para que eu fosse fazer-lhe companhia. Enquanto o fitava com incredulidade, ele piscou o olho.
- Está a dirigir-se a ti? - perguntou Cristiana com uma admiração insultuosa patente na voz.
- Talvez precise de ajuda nos trabalhos de casa de biologia - murmurei por entre os dentes - Hum, é melhor ir ver o que ele deseja.
Sentia o olhar dela fixo na direção em que eu seguia à medida que me asfatava.
Quando cheguei junto à mesa, mantive-me de pé, insegura, atrás da cadeira que se encontrava defronte dele.
- Porque não te sentas à minha mesa hoje? - perguntou, sorrindo.
Sentei-me automaticamente, observando-o com cautela. Ele ainda estava a sorrir. Era difícil acreditar que alguém tão belo pudesse ser real. Temia que ele desaparecesse numa súbita nuvem de fumo e eu acordasse.
Ele parecia estar à espera que eu dissesse algo.
- Está situação é fora do vulgar - consegui finalmente afirmar.
- Bem.
Deteve-se e, em seguida, as restantes palavras sucederam-se num ímpeto.
- Decidi que, já que ia para o inferno, mais valia fazê-lo de forma consumada.
Esperei que ele dissesse algo que tivesse sentido. Os segundos passaram.
- Tu sabes que eu não faço a menor ideia daquilo a que te referes - acabei por salientar.
- Pois sei.
Voltou a sorrir e, depois, mudou de assunto.
- Acho que os teus amigos estão zangados comigo por te ter roubado.
- Hão-de sobreviver.
Conseguia sentir os seus olhares a trespassar-me as costas.
- Mas posso não te devolver - disse ele com um brilho perverso nos olhos.
Eu engasguei-me. Ele riu-se.
- Pareces preocupada.
- Não - respondi, mas, ridiculamente, a minha voz falhou - Na verdade, estou surpreendida... A que se deve tudo isto?
- Já te disse, fartei-me de tentar manter-me afastado de ti. Portanto, desisto.
Ainda sorria, mas os seus olhos ocres estavam sérios.
- Desistes? - repeti num estado de confusão.
- Sim, desisto de tentar ser bom. Apartir de agora, faço apenas o que me apetece e o resto que se dane.
O seu sorriso esmoreceu à medida que se explicava a um laivo de rispidez insinuou-se na sua voz.
- Baralhaste-me de novo.
O espantoso sorriso constrangido ressurgiu.Continua...
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Luz E Escuridão
Romance"Nunca refletia longamente sobre a forma como morreria, ainda que, ao longo dos meses anteriores, tivesse tido de sobra para tal, mas mesmo que o tivesse feito, jamais teria imaginado que seria assim. Olhei fixamente para o lado oposto da longa sal...