Capítulo III

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   O sol está apontando ao leste da floresta de Mistic, onde um cervo está calmamente a beber um pouco de água no leito de um riacho. Algo passa zumbindo próximo a suas orelhas, a criatura se coloca em alerta no mesmo instante, levantando a cabeça. O bichinho olha para todas as direções e o som de um galho se partindo o assusta. Ele corre. Uma dupla de arqueiros, se apressa atrás dele. O fim está próximo, o pobre cervo já consegue sentir a dor da lâmina afiada perfurando seu couro.

   Um dos arqueiros, uma mulher, se abaixa e passa a mão sobre a terra verificando rastros.

   – Foi para o leste, deve ter passado aqui à menos de um minuto – diz ela ao outro caçador.

   – Devemos seguir o leito do rio e o encontraremos adiante.

   – Creio que não. – Ela se levanta. – Melhor nós seguimos por terra.

   O homem ergue o arco, mira e dispara uma de suas flechas.

   – Está ficando louco? – grita a mulher.

   O homem coloca o dedo indicador sobre a boca. Um gesto mandando que ela se cale. A mulher vira de costas, calada, e olha na direção para qual a flecha sobrevoou.

   – Venha, vamos. – O homem a chama.

   A mulher o segue, ainda em silêncio, não faz ideia do que havia caído logo a frente. O homem, leva o braço e puxa a moita de capim para trás. Um cervo está caído, dando seus últimos espasmos de vida.

   – Você o pegou. – A mulher abre um sorriso. – Como?

   O homem ri da ingenuidade dela.

   – É outro deles – informa – Esse devia estar indo beber água.

   Ela dá de ombros e guarda suas flechas, de volta, numa bolsa de couro que carrega presa às costas.

   – Não importa – diz ela – Só sei que hoje, finalmente vou comer algo diferente de mingau.

   O homem ri da irmã.

   – Sorte sua que a mamãe não está aqui, senão já iria começar com as ladainhas dela, de que temos que agradecer a tudo.

   – Verdade. – Ela sorri. – Obrigada, oh grandioso Ska, pelas semanas que comi apenas mingau – diz ela, num tom brincalhão.

   Os dois riem.

   – Me ajuda aqui, temos que limpar ele para levarmos para casa – diz o homem ao se abaixar para cortar a barriga da criatura.

   – Odeio essa parte. – Ela contraí os lábios. – Mas, pelo menos não é mingau.

   Montu corta a barriga do cervo, deixando que suas tripas caíssem para fora do torso. O sangue vermelho e a buchada da criatura umedece a terra seca. Com a mão, ele separa os órgãos comestíveis dos demais.

   – Coloque isso aí dentro – diz ele, entregando um órgão flácido para que Skaravela guardasse em sua bolsa.

   Ela guarda a carne na bolsa, louca para vê-la em uma panela.

   A bolsa se enche rapidamente, com todos os órgãos julgados bons por Montu. O sangue pinga pelo pano da bolsa, formando uma pequena poça na terra abaixo.

   – Me ajude a retirar o couro – pede o homem.

   Já eram quase meio-dia e eles ainda estavam ali, ajeitando a carne do cervo para levarem para sua casa.

   – Temos que nos apurar, antes que alguém nos perceba aqui – diz Montu – Não posso ser taxado como meliante perante o rei, ainda mas agora que estou perto de me tornar um soldado.

A Skaravela.Onde histórias criam vida. Descubra agora