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🚨Esta é uma fanfic inspirada na série os Bridgertons, da Julia Quinn. Pode conter spoilers 🚨
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Prólogo

Londres, 1838.

Mais um dia e ele estaria livre.
George mantinha o olhar fixo na paisagem que se estendia através da janela, distraído com a imagem de um criado podando a relva do jardim. Ao fundo, a voz rouca e estoica do professor de matemática tentava explicar a um grupo desinteressado de meninos como resolver o cálculo escrito no quadro. John Wadsworth, filho do duque de Lander foi o único disposto a solucionar a questão. O jovenzinho colocou-se de pé diante da turma e inflou o peito de modo exagerado, encarando os alunos a sua volta.
– A resposta é quatro, Sr. Faithfull. – Exclamou com ar de sabedoria, assegurando-se que sua voz estivesse suficientemente alta para que todos o ouvissem.
Seis, George o corrigiu em pensamento. Era uma conta simples, que ele já havia aprendido sozinho dois anos antes, enquanto explorava a biblioteca de seu pai. Ele então pressionou a testa contra o vidro frio e começou a soprar, o ar quente de seus lábios embaçando o vitral transparente, criando formas indistintas. Em algum momento, ele achou ter visto um pequeno urso se formar a partir das lufadas de sua respiração. Evidentemente, havia a possibilidade de ser apenas um borrão, pensou o menino, tudo dependia do expectador.
– A resposta correta é seis. – O Sr. Faithfull declarou com voz de desânimo. Passara a manhã inteira esforçando-se para transferir um pouco do seu conhecimento para aqueles garotos ingratos.
O jovem John sentou-se, engolindo sua inconformidade com a petulância do professor em corrigi-lo. Ele era um futuro duque! Certamente existia uma regra que proibia tal afronta a um futuro duque. Mas, ao que parecia, toda a sala ignorava naquele instante a relevância de sua posição. Ouvia-se risinhos e cochichos. Alguém, audaciosamente, começara a emitir sons estranhos e John demorou longos dez segundos para dar-se conta que se tratava de um som animalesco.
Ele franziu a testa, confuso. Já ouvira aquele som antes em algum lugar, só não se lembrava onde.
Não muito tempo depois, seus colegas de classe explodiram em uma gargalhada incontrolável. Um deles, não se soube qual, sussurrou a palavra "burro" e John finalmente identificou o som que ouvira na sala. Sua face foi imediatamente incendiada por uma mistura de raiva e constrangimento. Foi preciso um esforço sobrecomum para não ceder a vontade de baixar a cabeça e encarar os próprios pés.
A mão infantil, pequena e frágil do menino fechou-se, formando punhos cerrados com toda força que possuía. Ele olhou ao redor, fulminando a todos com um olhar enfezado.  No entanto, os outros garotos continuavam a rir sem receio algum, a despeito de o quanto aquilo o irritava. Com apenas sete anos de idade, nenhum deles preocupava-se em levar a vida e os sentimentos alheio muito a sério. Que mal podia fazer uma simples brincadeira entre colegas?
Mas John Wadsworth não estava rindo. Era inaceitável ser alvo de chacota. Impulsionado pela fúria, se pôs novamente em pé, consciente de que um duque jamais se acovardaria diante da zombaria de pessoas que estavam bem abaixo em posição e fortuna. Como um soldado em marcha, começou a andar pela sala ordenando que todos se calassem, ou faria que seus punhos os silenciassem.
Não adiantou.
O grupo parecia imune à sua aura aristocrática imponente. E o menino não estava certo se podia realmente bater em todos eles. Eram no mínimo vinte garotos. Doze deles pelo menos uma cabeça mais alto do que ele. Aquele era um dia complicado na sala de aula do Sr Faithfull.  Desastroso até.

Foi quando uma figura franzina no lado oposto da sala atraiu a atenção de John,  que o caos se instaurou por completo. Lá, próximo a uma janela, à margem de todo àquele tumulto que se formara, estava o silencioso George, seus olhos compenetrados na vida que se desenvolvia fora daquela sala de aula. O inteligente George Bridgerton. Será possível, refletiu John, que o menino Bridgerton se achasse mais esperto que ele?
Oras, era inaceitável!
Determinado, o menino atravessou o curto espaço, indo de encontro aos únicos lábios que não se abriram para insultá-lo, a única boca que não curvou em um sorriso para debochar de seu pequeno deslize matemático.
– Pare de rir de mim, Bridgerton! – o futuro duque ralhou com a voz alterada. – Pare ou irá se arrepender.
George ergueu o olhar, encarando seu companheiro de turma com uma expressão indefesa no rosto.
– Você se julga mais inteligente que eu? – prosseguiu John, despejando toda sua frustação no oponente mais fraco que encontrou.
Balançando a cabeça veementemente, George negou.
– É verdade! Você se acha o mais esperto de nós porque tira as melhores notas, mas todos sabem que os professores o favorecem por pena. Porque você é retardado.
Por um instante o olhar de George cruzou com o de seu professor, e ele desejou imensamente perguntar a ele se aquilo era verdade. Mas não o fez. A perguntar ficou reverberando em sua mente, criando teias em seu cérebro, mas ele não conseguia fazê-la sair. Será que o favoreciam?
A sala agora estava em silêncio. O único som que podia se ouvir era a respiração ofegante do jovem John, que se mantinha de pé diante dele. Um constrangimento nunca sentido tomou conta do coração de George. Ele não conseguia falar. E ali não havia ninguém que usaria sua voz para defendê-lo.

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