Capítulo 15

3.1K 380 18
                                    

— Podemos conversar em outro lugar que não seja no hall da casa? — pediu Emma, tentando ganhar tempo.

George a observou por um breve momento, tomado pela perplexidade. Por fora, certamente aquela garota refletia todo o esplendor de uma dama inglesa, vestida em seu vestido elegante e adequadamente recatado, com um belo chapéu que harmonizava perfeitamente com o penteado que adornava seu cabelo. Ela também possuía uma postura e linguajar refinado, o que fazia com que ele se perguntasse repetidas vezes o que, em nome de Deus, acontecera para alguém como ela, que recebera uma perfeita educação, exibir um comportamento constantemente escandaloso.
Sabia a esta altura que era quase impossível, contudo, não seria o homem que sempre foi senão tentasse ajudá-la a recuperar o juízo.

— La-lady St-t-tonne...

— Sr. Bridgerton, permita-me poupá-lo de um discurso que será desperdiçado por completo ao confrontar com meu temperamento intratável. — Levando suas mãos até a altura do queixo, ela desfez o laço que prendia seu chapéu e o retirou.  — Não há nenhum risco que me seja desconhecido, meu senhor. De modo, que eu vim até aqui voluntariamente e consciente do que estou fazendo, e se pularmos a parte do sermão seguramente sábio que você deseja pronunciar, lhe garanto que a minha visita será mais curta e duas vezes mais proveitosa.

Ele estava sem palavras. E dessa vez não tinha relação com sua própria falha humana na comunicação. Era Emma a culpada. Emma Stonne e sua mente sagaz e suas opiniões fortes e irredutíveis. O que ele poderia fazer? Certamente não havia um modo de convencer alguém que não desejava ser convencida. Resignado, e um pouco curioso sobre o que a levara até ali, ele fez um gesto sutil para que ela o acompanhasse, que foi prontamente obedecido por Emma. Que inusitada tarde de junho era aquela, tendo uma jovem solteira e desacompanhada vagando pela sua sala de estar, os olhos atentos em cada objeto que encontrava.

— O que é isto? – perguntou ela, detendo-se diante de um artefato de ferro em um formato similar a de um triangulo, corroído nas extremidades e aparentando pertencer a algum século passado.

George não se esquecera que Emma vinha tentando esquivar-se da pergunte dele sobre as razões que a levaram até ali, mas, por ora, ele escolheu deixar de lado a questão.

Aproximando-se, parou a alguns passos atrás dela e seguiu a direção de seu olhar.

— N-n-não te-tenho cert-teza. Decidi acre-credit-tar q-q-que é o q-qu-que so-brou de u-m-m ca-canhão. Cont-t-tudo, n-n-não se-sei ao cert-t-to. Eu o-o achei na-na prai-a, em mi-minha via-agem a Fra-frança.

Rapidamente Emma percebeu que o Sr. Bridgerton era uma espécie de colecionar de destroços, o que ele mesmo definiu como sendo "partes esquecidas da História".

Segundo ele, as civilizações protegiam tudo o que julgavam preciosos em sua época, para que a geração seguinte fosse brindada com a glória dos tempos passados. Mobília luxuosa, prataria, estátuas de mármore, tapetes, todo objeto feito de ouro que já fora construído. O Sr. Bridgerton, entretanto, ostentava com orgulho partes de navios antigos que naufragaram e jaziam no fundo do mar.
A decoração da casa deles, pensou Emma, sonhadora, seria divinamente peculiar. Nada ali era inteiro, mas todos aqueles objetos pareciam ter conquistado a afeição de George. Emma era a única na sala que ainda precisava conseguir a proeza de conquistá-lo.

Era um diálogo despropositado e claramente agradável, mas Emma sabia que não podia continuar eternamente lançando perguntas triviais para postergar as que realmente sentia necessidade de fazer. Da mesma forma que George sentia no ar o peso de uma conversa não pronunciada.

— Você me beijou. — sussurrou Emma, ainda sem olhar para ele, apenas dando voltas e voltas na sala. — Por que fez isso?

— E-e-eu n-n-não de-devi-a-a te-ter fei-t-to.
Com muito esforço, Emma escondeu de sua expressão a tristeza que a resposta lhe causou e virou-se para ele, assegurando que seu queixo estivesse erguido com dignidade.

A linguagem do coração Onde histórias criam vida. Descubra agora