Era ainda de manhã, ninguém se levantara. O sol erguia-se timidamente no horizonte. Emma devia ser a única alma desperta àquele horário na casa. Nem mesmo a movimentação ágil dos criados podia ser ouvida. Com um bocejo involuntário, ela continuou a olhar pela janela. Perguntava-se a todo momento enquanto estava parada ali como o mundo inteiro fora capaz de mudar no decurso de uma noite.
Até mesmo Deus necessitara de seis dias para criar todas as coisas, uma obra tão extenuante, que no sétimo dia Ele descansou. Como tudo mudou? O canto do pássaros parecia mais afinado, a brisa que invadia o quarto possuía agora um maior frescor, e até a relva no campo apresentava um tom mais verdejante e bonito. Uma movimentação inesperada atraiu sua atenção. Emma desviou o olhar para um cavalariço que passava apressado em direção ao estábulo, puxando um cavalo por meio de uma corda.
O homem, até então meio sonolento, seguia em um ritmo lento, preguiçoso. Quando chegou próximo ao estábulo, acabou enterrando sua bota velha em um monte de excremento de cavalo recém produzido que ele não percebera em seu caminho.
— Mas que inferno de dia! — esbravejou o cavalariço, furioso, tentando desesperadamente limpar sua bota na grama.
— Malditos cavalos imundos!Pensando bem, talvez o mundo ainda fosse o mesmo. Talvez a vida seguisse o mesmo curso de sempre. No entanto, para Emma nada afastava a certeza de que o dia do seu casamento amanhecera como nenhum antes. Possivelmente a mudança ocorrera nela e não em seu exterior. Era o amor que sentia em seu coração que dava renovando sentido e beleza em tudo que seus olhos examinavam.
Emma desejou que aquela sensação não se esvanecesse nunca.
George pensou que um bom copo de uísque seria capaz de aniquilar aquela sensação do seu corpo. O único problema era que chegar a igreja no dia de seu casamento bêbado seguramente não iria agradar em nada Emma. Ele suspirou enquanto sua mão intranquila atacava seus cabelos, despenteando-os. Deveria ter simplesmente agarrado Emma pela cintura, jogado por cima dos ombros e ter lhe arrastado até a Escócia.Seu estado de espírito não obteve tampouco melhora quando, chegada a hora, seu valete veio até seu quarto para ajudá-lo a se vestir. Seu corpo estava tenso e inquieto e o pobre criado teve que refazer o trabalho com o nó da gravata dele pelo menos três vezes antes que George recobrasse o controle necessário para manter-se estático.
— Como se sente? — indagou Thomas, cerca de uma hora mais tarde, enquanto toda a família aguarda na igreja pela chegada da noiva.
— B-b-b-b... B-b-b-be... — George fez uma pausa. Inspirou fundo. — Be-be-be-bem...
Não se fazia necessário encarar Thomas para saber que ele não acreditara em sua mentira. Cristo, George mal podia pronunciar uma maldita palavra. Não era o tipo de homem que devia estar esperando Emma no altar. Não era o tipo de homem que devia estar casando-se com ela.— Não ande por esta estrada, meu irmão. — murmurou Thomas, como se pudesse ouvir os pensamentos do irmão.
George ficou em silêncio.— Está arrependido? — agora a voz de Thomas era quase inaudível, para que outros convidados não pudessem escutá-los.
Se seu irmão chegara a essa conclusão apenas olhando para ele, o que pensaria Emma quando o visse? O que enxergaria nele? Não desejava magoá-la. É claro que não estava arrependido, um homem não voltava atrás em sua palavra. Queria Emma. Amava-a com uma intensidade que não podia ser diminuída da noite para o dia. Perguntou-se se era loucura amar tanto alguém e ao mesmo tempo sentir medo de estar perto dessa pessoa? Isso fazia dele o homem um pouco mesmo digno do amor de uma mulher?George olhou para o homens de sua família. Eles tinham uma família. Tinham um corpo feminino para acariciar. Eram felizes. Faziam suas esposas e filhos felizes.
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A linguagem do coração
Historical FictionAlerta: Se você ainda não leu O segredo de Colin Bridgerton da Julia Quinn, ou o segundo epílogo que a autora escreveu, esta história pode conter spoilers. Emma Stonne vive cercada de admiradores desde sua primeira aparição na sociedade. A combinaçã...