Capítulo 35

367 44 0
                                    


       Logo a manhã veio e nos noticiários não se falava de outra coisa. Fotos do empresário Laerte Ferreira algemado estampavam as capas dos jornais, bem como as de Roger sempre com seu semblante frio aparentando planejar uma reviravolta ao caso. E era o que de fato Roger pensava saboreando um delicioso café da manhã ao lado de uma  amante numa cafeteria longe do centro da cidade. Não pretendia desistir do caso, iria sim entrar com recurso e provar para a imprensa e à OAB que ainda era o melhor advogado do Brasil. Porém, o que precisava no momento, era de umas férias de pelo menos quinze dias. Seria o suficiente para pôr a cabeça no lugar e tirar algumas pedras do sapato. Seria hora de descobrir quem era a misteriosa mulher grávida que o perseguia. Era hora de passar aquilo a limpo. Não podia voltar ao caso com este empecilho. E mais, era hora de tirar Camila da sua vida e estava disposto a oferecer o que não tinha no banco para isto. Sabia, na verdade, que não seria nada fácil, que a moça prometeria acabar com a sua vida contando tudo a sua esposa. Mas agora era a palavra dele contra a dela. Camila era a primeira amante a quem perdurara tanto tempo. Já não podiam mais viver juntos, e Roger estava decidido a esquecer aquilo que o mais a prendia à moça: o sexo voraz, a forma como Camila consumia o seu sexo, de um jeito como nenhuma outra amante fazia. Era difícil às vezes se concentrar, na verdade, para Roger, Camila também fora culpada pela má abstração na audiência, uma absolvição do mau desempenho. Na verdade, para Roger, o aceitamento da derrota era algo laborioso e buscava para si estas questões, estes subterfúgios.

Jennifer esperou até às dez horas da manhã para ligar para parentes e pessoas próximas a Roger. Procurou sua agenda telefônica e a colocou no criado-mudo. Pensativa, veio à lembrança da mulher gestante na festa de aniversário da filha. Aquele filho era de Roger, Jennifer tinha certeza. Provavelmente estava naquele momento com a cabeça encostada na barriga da mulher a ouvir os chutes do filho para acalmar a alma. Sim, era isto. Roger nunca havia dormido fora e não era de pedir favores a parentes, até porque eram poucos e quase não tinha contato, também tirava a hipótese de conhecidos, Roger sempre foi um homem altivo que nunca precisou de favores. Talvez a vida sofrida modulou aquele homem duro.

Por volta das 10:30 Roger entrou estacionando o carro. Apesar do banho, ainda exalava nos poros o cheiro da bebida da noite anterior. Adentrou a porta e encontrou a família reunida, Jennifer e Brenda sentadas no sofá, e a pequena Beatriz correndo para vir lhe abraçar.

– Papai! – exclamou a pequenina apertando forte o pai. Roger pôs a mão em sua cabeça, o semblante ainda frio. – Onde você dormiu, ficamos preocupadas com o senhor. Disse até para mamãe ligar para a polícia dizendo que o senhor estava desaparecido. Nem fomos pra escola.

– Eu dormi num hotel, filha.

– Num hotel?

– Sim.

– E como o senhor está?

– Estou bem. Apenas cansado.

Logo Brenda se aproximou abraçando Roger dizendo que acreditava no pai e na reviravolta do caso. Roger agradeceu beijando os macios cabelos da menina. Jennifer permaneceu estática no sofá. As pernas cruzadas, controlando os tremores instintivos da idade. Roger a olhou pelo o canto do olho e, sem esboçar um diálogo, foi direto para as escadas a fim de tomar novamente um banho decente. Jennifer levantou-se paulatinamente e seguiu o esposo o encontrando sentado na cama a tirar os sapatos.

– Onde você passou a noite, Roger, me diga com sinceridade?

Roger respirou fundo mostrando total inquietude com a pergunta da esposa.

– Acho que você ouviu na sala. Dormi num hotel, quis ficar sozinho, isolado de tudo, de perguntas, falatórios, de tudo.

– Até de sua família?

– Ah, Jennifer! Tente me entender. Cada pessoa tem a sua reação quando se depara com algo nunca visto. Para mim, perder este caso é algo novo. E a minha reação foi essa, simplesmente me isolei.

– Eu compreendo você, Roger, mas é difícil acreditar nisso. Você está cheirando a álcool e sabia que podia contar sempre com a sua família. Aliás, primeiramente a família.

– Sim, eu bebi, Jennifer. Bebi como um louco tentando esquecer estes malditos dias, este maldito caso, este maldito Laerte. Você acha que eu não sei que ele é um pilantra? Sim, eu sei. Ele não vale nada, um centavo sequer; porém meu nome não vai ficar sujo, principalmente pela situação que estou envolvido defendendo alguém que o povo odeia. Isso será revertido custe o que custar.

– Sei exatamente o que você está sentindo. Imagino o duro que é perder algo tão influente como foi esse trabalho. Não quero me estender falando disso e de questões de vida ou morte pra você. Você está defendendo um canalha e a partir do momento que o defende você também se torna um.

– O quê? – interpelou Roger aturdido.

– Oh, desculpe-me! Disse que não me estenderia sobre o seu trabalho e acabei me estendendo. Desculpe-me, mas é o que eu penso. Você só pensa em ganhar, Roger. Este é o seu problema. Ganhar é ótimo, todo mundo gosta, mas chega uma hora que temos aceitar a derrota, principalmente quando não se vale a pena.

– Mas, o que você é para se meter no meu trabalho? Ai, Jennifer, você não passa de um modelo pra mim. Alguém a quem as pessoas digam: Oh, a esposa do advogado Roger é um exemplo de mulher. Sim, e é isto que você é, Jennifer! Um exemplo de mulher. A mulher tão sonhada da família brasileira. Competente, verdadeira dona de casa que cuida bem dos filhos e do marido. Parabéns! Você está aprovadíssima neste quesito. Porém na cama você deixa muito a desejar. Quando te meto, me sinto vazio. Você não me preenche na cama, Jennifer. Nunca me preencheu.

Um ódio a possuiu fervorosamente e a palma da mão acertou em cheio a face do esposo. Roger não sentiu dor alguma, a feição continuou intacta, porém não pensou duas vezes em pressionar a garganta da esposa jogando-a na cama. Roger caiu em cima da mulher. A face de Jennifer se reverberou, tentou gritar, mas era impossível. As cordas vocais estavam prensadas por aquelas mãos grossas.

– Nunca mais faça isso, sua filha da puta! Da próxima vez você morre. – disse soltando a mulher que tossia como uma tuberculosa.

– Quero o divórcio! – conseguiu dizer com muita dificuldade.

– Não terá porra nenhuma de divórcio. Você é a mulher exemplo, esqueceu? Será para sempre o meu quadro na sala de estar.

Nove Meses Para MatarOnde histórias criam vida. Descubra agora