4. Meio que um convite

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Nós olhamos pela fresta da porta e vemos que não há ninguém no corredor, então saímos na ponta dos pés e vamos para o elevador, mesmo que o quarto seja no segundo andar. Andamos pelo gramado e passamos pelo grande prédio que é a escola. As salas de aula, refeitório e essas coisas ficam em um prédio relativamente perto dos prédios onde ficam os quartos dos alunos. Chegamos no portão de ferro e vemos o segurança na frente. Ele está na parte de fora e nós na de dentro, ou seja, nós vemos as costas dele, mas ele não nos vê.

Spencer joga uma pedra do outro lado e o segurança escuta o barulho e sai da frente do portão. Nossa chance de sair. Vamos correndo silenciosamente até o carro prata de Chris, Spencer entra na frente e eu atrás.

- Festa! – grita Spencer.

Chris pega uma cerveja de algum lugar e dá um gole antes de dar partida. Nada seguro. Ponho o cinto de segurança no banco de trás e me agarro a ele como se minha vida dependesse disso – e provavelmente depende.

De longe posso escutar a música vinda da fraternidade conforme nos aproximamos depois de Chris passar uns três sinais vermelhos, mas de perto é ainda pior. Isso que eu chamo de falta de respeito pelo próximo.

Spencer sai do carro já dançando e me deixa pra trás. Saio do carro e fecho a porta; tem tanta gente dentro daquela casa que acho que dá pra refutar a frase: "Dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço."

Quando vejo Spencer novamente ela está dançando coladinha com um cara qualquer e segura uma garrafa de cerveja. Eu, por outro lado, estou sentada em um sofá que provavelmente está repleto germes.

Às vezes vejo Spencer me chamar pra dançar com eles, mas não, obrigada. Sinto meu celular vibrar algumas vezes e olho; são mensagens de minha mãe. São sobre minha irmãzinha. Levanto rapidamente e aviso Spencer que vou embora.

- Por quê? – grita ela por causa do barulho. – Fica mais um pouco – pede, mexendo os ombros no ritmo da música para me fazer rir.

- Não posso – falo o mais alto que consigo porque acho gritar deselegante e não me vem naturalmente. – É a Margot – explico. Spencer para de dançar por um momento.

- Quer que eu vá com você? – pergunta.

- Não precisa.

Tenho que me esforçar pra sair do meio daquela multidão. Chego do lado de fora e respiro bem fundo antes de pedir pra um cara da festa me levar pra casa, ou pra escola, nesse caso. Ele concorda, apesar de não me conhecer; deve ser porque espera que eu faça sexo com ele. Quando chegamos na esquina da escola falo que ele pode parar.

- No carro não é muito confortável – diz ele com hálito de cerveja.

- Que bom que eu não pretendo dar pra você, então. – Saio do carro com pressa, vai que ele é um maluco que não aceita um "não". Entro na escola, pisoteando a grama enquanto o guarda fuma seu cigarro distraidamente. Ligo pra minha mãe andando até o prédio onde estudamos.

- Alô – atende ela.

- Recebi as mensagens. Você vem me buscar pra irmos ao hospital?

- Não, eu só queria te avisar.

- Mas mãe... – discuto.

- Sei que se preocupa com sua irmã, mas você estuda, não pode sair o tempo todo. Vai dormir agora, que já são dez horas.

- Ta bom – concordo, parando de andar.

Entro na escola ao invés de ir para o meu quarto; eu não estou com sono. Paro perto dos armários e deslizo até o chão. Enterro a cabeça nos joelhos e choro um pouquinho. Levanto o olhar rapidamente quando escuto alguém se sentar ao meu lado.

- Você está bem? – pergunta Austin.

Olho pra ele.

- Que pergunta mais idiota, claro que você não está bem, já que está chorando – diz ele, mais pra si mesmo do que pra mim.

- Que foi? Outra coisa louca aconteceu na sua vida e por coincidência eu estava por perto? – ironizo.

- Eu vim pegar uma coisa no meu armário e vi você.

Não digo nada. Passo a mão no rosto pra secar as lágrimas.

- Tem um cílio aqui – avisa ele, aproximando a mão e colocando no meu rosto.

- Deixa ele aí – digo com grosseria.

- Tá legal. – Ele tira a mão de perto do meu rosto e deixa entre as pernas estiradas.

- Desculpe – falo olhando pra baixo.

- Sem problema. – Austin vira a cabeça e olha para frente. – Por que você estava chorando?

- Minha irmãzinha está internada de novo.

- Sinto muito. O que ela tem?

- Imunodeficiência. Qualquer coisinha ela já passa mal e na maioria das vezes tem que ir ao hospital.

Sou contra contar coisas para desconhecidos, eu sei, mas quando estou vulnerável minhas regras ficam meio borradas em minha mente.

- Ela vai ficar bem, é só ter um pouco de fé.

- Em que? Em Deus?

- Também. Mas eu digo acreditar que ela vai ficar bem.

- Acho que posso fazer isso – concluo.

- Sabe o que sempre me anima? – pergunta ele.

Ele não deve esperar que eu adivinhe, né? Eu mal conheço ele, não sei nada sobre sua vida, especialmente o que o anima.

Balanço a cabeça negativamente.

- Ir a uma lanchonete retrô não muito longe daqui e comer hambúrguer, batata frita e tomar milk-shake – ele responde a própria pergunta.

Dou um sorrisinho, não entendo a relevância daquela informação.

- Isso foi meio que um convite – diz ele e coça a cabeça.

Ah, agora eu entendi a relevância daquela informação; era um convite pra ir a lanchonete.

- Eu não como nada tão calórico, desculpe.

Ele olha pra frente meio desconcertado.

- Acho que posso ir se eles tiverem algo que não seja frito – conserto minha resposta.

- A gente pode sair nos fins de semana, certo? – ele fica animado.

- Isso.

- O que acha de sábado?

- Acho que tudo bem.

- Em dois dias você vai experimentar a melhor comida de todo o país.

Duvido muito, mas não digo isso a ele, acho que seria meio grosseiro. Mais do que já fui.

- Tenho certeza que sim – digo por educação.

Ele olha o relógio com pulseira de couro.

- Quer que eu te leve até seu quarto? Você precisa dormir.

- Por favor, nunca mais fale isso. Soou exatamente como a minha mãe.

- Isso não é muito atraente. – Ele ri.

- Não. – Eu rio também.

Vamos até a entrada do prédio de garotas.

- É contra as regras um garoto entrar, então acho que é a sua deixa – observo, balançando no lugar.

- Você é sempre tão certinha? – pergunta ele.

- Sou – respondo com sinceridade.

- Okaaaay – Austin diz arrastado.

Acho que ele esperava uma resposta diferente.

- Então boa noite – despeço-me e entro no prédio.

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