6. O hambúrguer está de prova

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Como aquela pilha de gordura e admito que o gosto é bom. Estou acostumada com vegetais e lanches naturais. A questão é que eu fui criada numa dieta saudável.

Termino o lanche e jogo a embalagem na cara de Austin.

- Ganhei – digo.

- Não me lembro de fazer nenhuma aposta. – Ele ri e recolhe o papel, deixando de lado.

Olho pelo vidro, está escurecendo.

- Você está com pressa? – pergunta ele.

- Não – respondo me virando para ele. Sinto que meu vestido não gostou do hambúrguer tanto quando eu.

- Então você vai me contar sobre a coisa do milkshake?

- Ainda com isso?

- Ainda com isso.

- Eu vou te contar, mas não tem como descontar depois – aviso.

- Sou todo ouvidos.

Penso um pouquinho no que dizer. Nem sei se é uma boa ideia contar, mas se ele não guardar o segredo, ninguém vai acreditar nele mesmo.

- Eu posso voltar no tempo e mudar as coisas – sou direta.

Ele pisca algumas vezes. Batuca no estofado com a mão apoiada no assento, esperando que eu prossiga, provavelmente antecipando um "Você precisava ver a sua cara! É claro que é só uma piada!". Vai ficar decepcionado.

- No dia do milkshake eu voltei e impedi que ela derrubasse em mim, depois impedi que ele derrubasse em mim e no chão. E no outro dia eu estava fazendo uma experiência – acrescento a última parte como se não tivesse importância.

- Você não tá zoando com a minha cara, né? – pergunta girando o canudo no copo quase vazio com a mão livre.

- Não. Ninguém consegue se lembrar, nunca, mas você lembra, e eu não sei porquê.

- Eu quero acreditar, mas parece loucura. – Ele se curva e toma o restinho de seu milkshake.

- Eu sei, no seu lugar também não acreditaria. Vou te mostrar. Olha o seu relógio.

- São sete e meia.

- Exato.

Volto para alguns minutos atrás. Quando abro o olho vejo um pedacinho do meu lanche na embalagem e o copo de milkshake de Austin está na metade. Ele olha confuso para seu copo e meu lanche, depois olha o relógio.

- Sete e vinte e três – diz ele boquiaberto.

- Nem sei porque te contei, mas mesmo de eu quisesse mudar isso, você ainda se lembraria.

- Como isso pode ser possível? Por que só eu posso me lembrar?

- Não sei, não sei mesmo.

- Não sabe nem como você adquiriu esses "poderes"?

- Acho que é porque minha mãe fez um pedido pra uma estrela cadente – conto, mas parece mais bobo dito em voz alta.

- Será que isso é um sonho super vívido? – indaga e balança a cabeça levemente. Volta a girar o canudo na bebida.

- Quando você era criança você teve esses lapsos de tempo?

- Não, começaram esse ano – responde. – A primeira vez foi a coisa com o milkshake.

- Acho que você tem que estar perto de mim pra perceber – deduzo. – Pelo menos no mesmo DDD.

Não foi tão ruim quanto pensei que seria. Ele aceitou bem. Quer dizer, ainda é loucura, até pra mim.

- Termina de comer seu lanche – fala ele rindo de repente e aponta para o saco na minha frente que não está mais vazio.

- Eu já comi – protesto.

- Esse pedaço de lanche aí insiste em me dizer o contrário.

- Você sabe que eu comi – argumento.

- Então eu vou ganhar – avisa se recostando no assento com os dois braços abertos apoiados no estofado.

- Você mesmo disse que não tinha aposta – lembro-o esperançosa.

- Agora tem – diz ele com um olhar de desafio.

- E se eu ganhar? Qual meu prêmio?

- Dá próxima vez que a gente sair vai ser pra um lugar que você escolher.

Ai meu Deus, talvez seja um encontro. Eu quero que seja?

Termino de comer o lanche. Tenho uma pequena divergência, afinal meu estômago não se lembra que eu já comi o lanche, mas meu cérebro sim, então...

Nós conversamos por mais um tempo, mas fica tarde e nós temos que voltar, dessa vez conversando entusiasmadamente durante a caminhada sobre adaptações de livros.

Novamente na porta do prédio das meninas, paramos, ficando em silêncio.

- Então, sabe onde quer ir? – pergunta ele. – Da próxima vez, quero dizer.

- Eu e a Spencer vamos ao shopping amanhã, por que você não vai também? – sugiro.

Ele é lindo, eu admito. No fundo que queria que fosse um encontro, eu admito. Mas eu não sei se posso namorar ele publicamente. Soa maldoso, eu sei, mas eu sempre fui a mesma pessoa nessa escola: Mary-Kate Lahey O'Brien, a pianista das competições de música; a garota da patinação artística no gelo; a amiga de Spencer, Liam, Logan, Britney e Kristen, agora Sarah também.

Fico com medo de que isso mude a visão que as pessoas têm sobre mim, não quero ser a Mary-Kate, a garota solidária namorada do bolsista. Mas acho que posso ser a amiga do bolsista e ainda ser a pianista e ginasta.

- Acho que pode ser legal – ele tenta não soar decepcionado, mas soa.

- Legal.

Quando entro no elevador fico pensando no que me tornei. Eu sou uma dessas garotas que tem vergonha de namorar alguém pobre. Dinheiro ou status social não diz nada sobre ninguém; não de verdade. Eu sei disso, pelo menos achava que sabia.

Me sinto culpada, porque acho que ele gosta de mim, mas só porque não conheceu essa garota detestável embaixo da menininha com frescura pra comer.

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