24. Piscadela

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Caminhamos ensopados até a casa de Austin.

- "Eu sou Mary-Kate O'Brien" - recita ele com o seu melhor sotaque francês que Gerald absolutamente não tinha, apesar de estar me imitando. E o restaurante tinha uma pegada mais mexicana também. Mas rio mesmo assim, porque me sinto feliz quando estou perto dele. - Você devia ter dito que era a filha do senador. Ou uma atriz famosa da Irlanda.

- Ou que eu estava morrendo.

- Não dá pra saber se ele ia mostrar compaixão.

- Seria um mostro se não mostrasse.

- O inferno está vazio. Os demônios estão aqui.

Não acredito que ele citou Shakespeare.

- Tããão dramático. Esse papel devia ser meu.

- O que posso dizer? Sou feminista.

Antes mesmo de entrar na casa podemos ouvir gritos de uma discussão. Ajeito o casaco de Austin nos meus ombros. Senti frio no caminho pelo fato de estar molhados e ele, atencioso do jeito que é, me cedeu o casaco. Aceitei porque 1) estava com frio e 2) sei que ele queria que eu aceitasse. É o que namoradas fazem.

Hesitante entramos. Tem um vaso quebrado perto da porta e Emily e Stephen estão discutindo na cozinha. Austin respira fundo e fecha os olhos. Subimos em silêncio até o quarto dele e visto uma roupa quente e seca. Ele faz o mesmo.

- Dorme comigo esta noite? - pede ele.

E porque sei que ele precisa de mim, e porque eu preciso dele (e porque o amo?), fico.

∞֍∞

Na segunda-feira, já na escola, um novo aluno é introduzido. Engasgo com a água que estou bebendo na hora quando vejo o garoto alto de olhos azuis e cabelo encaracolado entrar na sala, sorrir enquanto dizem o seu nome e depois escolher um lugar. Mas antes de sentar, Isaac Daniels olha pra mim e dá uma piscadinha.

Afundo na cadeira com os olhares que recebo de todos da sala, incluindo Austin e Spencer.

No final da aula estou pronta para receber as perguntas da minha melhor amiga e do meu namorado, mas o sr. Davis me pede pra esperar porque precisa falar comigo. Fico tensa.

- Bem, srta. O'Brien, acho que você está ciente de que tem as melhores notas.

Não confirmo nem discordo.

- Queria te pedir um favor - continua ele. - Seria de grande ajuda pra mim se a srta. pudesse dar umas aulas de reforço para o aluno novo. Apesar de ser muito inteligente, ele está um pouco atrasado.

Penso por um instante. Não vejo por que não.

- Não vejo por que não - digo em voz alta.

- Tudo bem. Aprecio muito a sua ajuda.

Faço um meneio com a cabeça e saio da sala. Austin e Spencer me esperam do lado de fora. De longe vejo Isaac conversando com Peter.

- Oi - cumprimento, e eles direcionam sua atenção a mim.

Austin me dá um beijo e Spencer só fica lá parada. Isaac está olhando pra mim quando abro os olhos. Finjo não perceber.

- Você quer fazer alguma coisa? - pergunta Austin.

- Que pergunta abrangente - digo.

- Nada disso. Ela vai ficar comigo no quarto. Ou em qualquer lugar. Conversando como as melhores amigas que somos. Vocês já passaram bastante tempo juntos esses dias.

- Isso porque somos namorados. Mas como você saberia?

- Você é um grosseiro. Vai me escolher, não é Mary-Kate?

- Sorvete? - pergunto a ela.

- Estou oficialmente bravo - fala Austin.

- Mais tarde, tá bom? - Beijo sua bochecha e saio de braços dados com Spencer.

Vamos conversando e rindo até a cantina, onde compramos um pote de sorvete de flocos e vamos para quarto. Sentadas na cama, dividimos o pote e assistimos a um filme na Netflix. Quando termina, vou jogar o pote vazio no lixo e ela está deitada na cama.

- Você não achou lindo aquele novo menino? Isaac.

- O nome dele você fala certo.

- O jeito que ele te olhou... E ainda por cima deu aquela piscadinha.

- Eu conheço ele - conto casualmente.

- De onde? - Ela levanta rápido e parece meio desorientada.

- Conheci ele ontem. No hospital.

- E por que eu não estava sabendo disso?

- Não achei que o veria de novo. Foi ele quem Crystal atropelou.

- Que babado!

- Nem tanto. - Dou de ombros.

- Você acha que ele está interessado em você?

- Acho que não. E ele me viu com Austin, então...

- Como se a garota ter namorada fosse um problema pros caras.

- O sr. Davis me pediu pra dar umas aulas pra ele. Porque ele está meio atrasado no conteúdo.

- Bem que ele podia ter pedido pra mim. Mas eu ensinaria umas outras coisas, se é que você me entende.

- Ugh!

Deito na cama e ela vai para o lado. Fecho os olhos e ela acaricia meu cabelo. Mesmo sendo cedo acabo dormindo. Então no meio da madrugada acordo. Saio pelo corredor só pra tomar um ar. Parece haver alguém atrás do grande vaso de planta, mas quando chego lá não vejo mais. Talvez esteja imaginando.

- Oi - diz uma voz e eu olho pra trás rapidamente, com a mão no peito.

Isaac Daniels sorri.

- O que faz aqui? - quero saber.

- Estava procurando o banheiro? - pergunta, quando deveria afirmar.

Empurro ele, ou tento empurrar. Ele é forte, mas vai dando passos lentos.

- O sr. Davis me disse que vai me dar umas aulas - ele fala enquanto tento levá-lo ao elevador. Depois de perceber que ele vai andar se quiser, desisto.

- Pois é. Tem muitas meninas que adorariam fazer isso, se quer saber.

- Não quero as outras.

Não sei por quê, mas coro.

- Tenho notas muito boas, mas outras também tem.

- Mas você é diferente.

- Diferente como?

- Não sei explicar.

Olho para os lados.

- O que realmente está fazendo aqui?

- Só explorando. - Dessa vez não é uma pergunta.

- Nada a ser encontrado aqui.

- Achei você, não achei?

- Estou aqui faz tempo, então vou dizer que não.

- Mas você já foi descoberta? - Ele faz a pergunta com um tom presunçoso.

Volto para o quarto e nem olho pra trás. Sinto falta de Austin. Talvez essa tenha potencial pra ser a melhor parte de se estar em um relacionamento, mas aí a gente ferra tudo por transformar em dependência.

Ele é sim meu mundo, mas Spencer, Margot, Crystal, minha mãe... todos eles são. Consigo dormir pouco tempo depois.

Shooting StarOnde histórias criam vida. Descubra agora