33. Por tempo limitado

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Não sinto mais dor. Se fecho meus olhos consigo encontrar uma memória e viver nela por um tempo, até que alguma coisa me traga de volta à realidade.

Descubro que o nome do careca é Rick pela enfermeira. Ela vem de vez em quando dar uma olhada em mim. Mal fala comigo, mas é gentil, considerando tudo.

Rick entra no quarto em que me encontro deitada, mas não mais com os braços presos, só com a pulseira-algema. Em suas mãos carrega uma bandeja com um pão de forma com geleia e um copo com suco de laranja. Ele coloca na mesinha do lado da cama.

- Como você está se sentindo hoje? – Rick puxa uma cadeira e senta.

- Como se alguém tivesse me esfaqueado e depois me sequestrado – digo com hostilidade.

Ele ri e balança a cabeça.

- Por que eu estou aqui? O que você quer?

- Estou de bom humor hoje, pra sua sorte. Vou te responder algumas perguntas. – Ele me olha. – Te deixamos dormir por dois dias porque não sabíamos se nosso dispositivo iria funcionar. Sabemos que você, em condições ideias, não costuma ultrapassar quarenta e oito horas quando volta no tempo.

- Quem são "nós"?

- Não importa agora.

- Como sabem tanto sobre mim? Era Peter me seguindo?

- Você perguntou e respondeu agora mesmo. Sabemos coisas sobre você porque Peter nos contou. Mas descobrimos sobre você em primeiro lugar porque temos uma equipe muito inteligente. Posso até te contar umas coisas que você não sabe.

- Acho que vou passar, mas valeu.

- Não seja arrogante. Deixe-me te perguntar uma coisa – ele se aproxima. – Você acredita em magia, Mary-Kate?

- Seria uma hipócrita se não acreditasse.

- E você gosta de séries, não é?

Não respondo. Não entendo aonde ele quer chegar.

- Foi retórico. Sei que sim. Você se lembra de algo que Rumpelstiltskin sempre dizia em Once Upon a Time?

Pela minha expressão ele sabe que eu entendi, então sorri maliciosamente e sai.

Toda magia tem um preço.

∞֍∞

Rick acende um cigarro ao lado da minha cama. O efeito do último sedativo está passando. Olho para a parte que pega fogo. A brasa me leva até uma memória. Austin e eu fomos a um encontro em um galpão que ele decorou com luzes e montou no chão um piquenique. Nós sentamos sobre a toalha xadrez e comemos sob a luz de velas.

Rimos tanto que não reparamos quando um de nós esbarrou em uma vela, que rolou pra perto do sofá velho encostado na parede e começou um incêndio.

Corremos lá pra fora rindo do desastre.

- Vou voltar e consertar isso – disse.

- Não, você não pode. – O fogo iluminou os olhos azuis de Austin.

- O que foi? Qual o problema? – quis saber.

- Se você voltar, aí não vai ter acontecido.

- Tudo bem, ainda vamos nos lembrar.

- Mas o mundo não vai. A realidade não vai. E preciso que se lembrem. Preciso que o mundo se lembre.

- Mas por quê?

- Quero que deixemos marcas no mundo real. Aí vai ter acontecido mesmo quando estivermos velhinhos e não conseguirmos mais nos lembrar. O mundo vai se lembrar por nós.

Então, se você for até lá, vai encontrar um celeiro queimado e, mesmo que não pareça à primeira vista, um pedaço da história de amor de dois adolescentes apaixonados. Ainda está lá. Mas ainda está aqui também. Dentro de mim.

O pigarro de Rick me traz de volta. Olho diretamente para ele.

- Você volta demais no tempo, sabia disso?

- Quem define o limite? – digo com ironia, mas ele balança a cabeça.

- Não devia jogar um jogo que não sabe as regras. – Seu tom é suave e divertido, mas insinua um aviso. Uma advertência.

- O que você quer dizer?

- Toma magia vem com um preço, Maryzinha; te falei isso ontem. Achei que você fosse mais esperta. Me decepcionou.

- O que é? Do que você está falando? – começo a demonstrar meu desespero.

- Cada vez que você volta, esse tempo é tirado de você.

Shooting StarOnde histórias criam vida. Descubra agora