Capítulo 1 - Lisandra

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Encaro o teste de gravidez na minha mão sem saber ao certo o que fazer diante do resultado.

Grávida.

Olho a imagem no espelho. Ele reflete o vazio de uma vida amargurada e condenada, alguém que a muito tempo perdeu o direito sobre si mesma, e não vamos falar sobre características físicas, deploráveis.

Três batidas forte contra a porta me assustam e o teste cai dentro da pia.

- Vamos Lisandra! Eu não te pago para ficar de bobeira no banheiro! - o grito vem seguido de mais uma sequência de socos.

Piso no pedal da lixeira e jogo o teste fora. Já esperava esse resultado, assim como minha decisão sobre isso não é nenhuma surpresa, só não queria acreditar.

Lavo as mãos tendo que enxugá-las no jeans surrado, esse lugar é uma espelunca, uma lavagem digna e papel higiênico é sonho de deuses, papel para enxugar as mãos apenas quando os lucros são exorbitantes, e como isso nunca acontece...

Vini abre os braços esperando uma resposta assim que saio do banheiro.

- Os pedidos não vão aprontar sozinhos. Anda!

Passo pelo corredor mal iluminado e entro no cubículo que ele chama de restaurante mas que só serve bebidas, lanches e pó, muito pó.

- E então? - Paloma pergunta assim que passo pela porta.

- Nada, alarme falso.

- Graças a Deus! - ela suspira levando a não ao crucifixo no pescoço.

Pego os pedidos sobre o balcão e vou até a chapa prepará-los.

- Eu disse para você que tudo ia dar certo.

A julgar que foi ela quem percebeu primeiro e chegou hoje com um teste, parecia bem otimista mesmo.

Ela ocupa seu lugar ao meu lado colocando pequenos pastéis no óleo. O cheiro misturado com o barulho da fritura me da ânsia, então acabo o pedido o mais rápido possível e saio de trás do balcão.

O lugar é tão pequeno e estreito que só cabem duas únicas mesas aqui dentro deixando as demais espalhadas pela calçada e rua.

-Seu hambúrguer- deixo na mesa em questão mas antes de ter a chance de voltar uma outra pessoa me chama, claramente chapada.

Acho que o plano de Vini quando montou o lugar fosse para encobrir seus verdadeiros negócios, mas acabou que as pessoas vinham comer aqui apenas para ter acesso as drogas e agora a comida passou a ser apenas um utensílio básico levando em consideração que desde que ele pague o carro da polícia que passa fazendo ronda, nada e ninguém vai atrapalhar os negócios.

-Uma cerveja! - a voz do homem sai arrastada - Não, não, melhor, traz uma dose de ca...chaça - ele tenta apontar o dedo e acaba errando a direção e sendo alvo de risos começando por ele mesmo.

Viro rumo ao balcão quando uma mão me segura.

- Sabe Lisandra, não sei como uma viciada como você consegue a cada dia que passa ficar mais gostosa.

Rufos, o fornecedor e o cara de quem eu compro o pó antes de Vini as batizar. Ele é corpulento, gordo e seu vício não são as drogas, é a bebida e assediar garotas.

Olho para os homens na mesma mesa se drogando enquanto ele passeia a mão por minha bunda. Se tem algo tão bom quanto a erva, é o pó de Rufos, depois disso só os injetáveis. Fecho os olhos lembrando da última vez que experimentei e meu corpo logo anseia por elas. Talvez precise de algo bem forte hoje.

Mesmo que você me deixe - Série ConfiançaOnde histórias criam vida. Descubra agora