JÚPITER

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Assim que chego ao escritório na segunda feira, percebo que tudo está quieto demais. 

As pessoas estão trabalhando em silencio e consigo ouvir o barulho dos meus saltos no chão enquanto caminho até meu escritório. Meu estomago está agitado pela possibilidade de ver Dominic e reprimo um sorriso intruso de sambar em meus lábios. Sento em minha mesa, ligo o computador e abro os projetos que preciso revisar e mandar para aprovação. 

Eu tinha certeza que tinha nascido para trabalhar com arquitetura desde os meus 15 anos quando percebi que poderia desenhar com muita facilidade qualquer prédio, casa ou construção. Na faculdade, aprimorei todas as minhas habilidades e agora, olhando para o projeto no computador, era impossível não sentir orgulho. E é por isso que eu mal vejo a hora passar conforme pego meu bloco de desenho, meu estojo especial e começo a formar alguns rascunhos. Os traços estão vividos na minha cabeça e tudo toma forma lentamente. Rasgo alguns e começo tudo de novo, e o tempo passa.

Percebo as pessoas passando, aqui e ali, provavelmente em seu horário de almoço. Mas eu estou inspirada e não consigo obrigar minha mão a parar. Por isso permito que os meus dedos continuem em sua dança, tirando o que tem do meu coração. O desenho sempre foi um tipo de eternização para mim e era isso que eu fazia agora. Eu deveria ter desenhado um molde do prédio de um projeto, mas conforme tudo tomava forma, não tive coragem de parar.

Desenhei o dia todo. O sol já não entrava mais pelas persianas e eu tinha câimbras nos antebraços e pulsos. Mas eu estava extremamente satisfeita conforme via os quatro desenhos lado a lado sob a minha mesa, numa mistura quase erótica de grafite, borracha e papel amassado.

Eram quatro imagens especificas. Todas retratavam o bar favorito de Dominic – o lugar estava tão fresco na minha memória quanto o toque de Dominic em cada canto de mim. O primeiro era uma imagem de uma das cabines iluminadas por um pequeno abajur lateral, e duas sombras, um casal, se inclinavam um para o outro num borrão. Me concentrei nas sombras e no sentimento de acolhimento e privacidade que senti quando caminhei por aqueles corredores.

O segundo retratava a parede ao lado da escada, cheia de apetrechos curiosos, quadros e garrafas de cerveja. Era genial. Quase uma composição contemporânea de tudo que havia de bom no mundo. Me lembrava da diversidade das coisas.

O terceiro e o que me dera mais trabalho foi uma imagem da mesa de Dominic do terceiro andar com o céu estrelado ao fundo e o mar. Aquele havia tantos detalhes que eu queria captar que havia me tomado quase a tarde inteira. Mas estava perfeito. Estava exatamente igual ao dia que sentamos e conversamos, no silêncio de nós dois.

O último desenho era o mais intimo de todos. Eu sabia que deveria queimá-lo ou rasga-lo em mil pedaços, mas tinha ficado... Extraordinário. Era um desenho realista muito próximo de uma boca e queixo masculino, quase tocando o pescoço delicado e curvilíneo de uma mulher. Os lábios dela estavam entre abertos, arfando. Era a minha boca e a boca e o queixo de Dominic. Éramos nós num ínfimo segundo de conexão e entrega. Estava tão bonito...

Perdida nos meus próprios pensamentos, mal percebi quando duas batidas leves ecoaram pela sala.

- Eu estava te esperando. – A voz, cujo dono estava retratado na minha frente falou, fazendo-me gritar.

- Stronzo! – exclamei, arrancando uma gargalhada baixa de Dominic. Me apressei a juntar todos os desenhos e enfiar rapidamente na minha pasta, tomando cuidado para que não se esfregassem.

- Você não tem medo do seu chefe mesmo. – Ele brincou, caminhando com as mãos nos bolsos da calça, tão imponente quanto sempre. Bastardo dos infernos. Ele era tão lindo que eu mal podia raciocinar.

O UNIVERSO ENTRE NÓS  - COMPLETOOnde histórias criam vida. Descubra agora