Pérola
Eram tantas questões em minha mente naquele momento que a fúria me tomou. Diante de mim estava minha mãe e ao mesmo tempo uma total desconhecida. Já não via mais o abrigo em tempestades em seus braços. Seus olhos não me transmitiam mais as certezas que tempos atrás tiravam minhas dúvidas. A mudança ocorreu para ambas. Por um lado eu passei a enxergar o que realmente me rondava. E por outro ela mergulhou naquele mar sombrio de mentiras e fez dele a sua morada.Era esse abismo entre nós que agora existia e eu não entendia quando ele começou a ser formado.
Isadora: Verena? - ela olhou para minha prima que parecia tão surpresa quanto eu. - Será que eu poderia conversar com a Pérola a sós por um momento? - Verena apenas concordou com um menear de cabeça e foi em direção a cozinha.
Pérola: Se for para falar sobre Pedro, casamento e tudo que vem junto, eu não acho que esse seja o melhor momento. - falei seca já não me importando em fingir.
Isadora: Ele tem outra família. - fiquei tentando entender a quem ela se referia.
Pérola: O Pedro? - tive até vontade de rir.
Isadora: Seu pai. - de repente meu ouvido foi tomado por um zunido quase que ensurdecedor. - É com eles que ele está nesse momento.
Pérola: Que tipo de jogo é esse que você quer me meter agora? - não estava entendendo mais nada. Que família era essa?
Isadora: Eu descobri tem alguns meses. - minha mãe começou a jorrar sua dor sem nenhum pudor e isso me fez ter compaixão dela. Por mais que não fosse mais aquela mãe amorosa de antes, ainda sim era a minha mãe. - Na verdade acho que sempre soube, só não quis aceitar o que estava diante de meus olhos. Eram viagens constantes, Ligações no meio da noite sem motivo. A distância que crescia em nossa cama.Papéis que me fazia assinar sem me dar a chance de lê-los. E agora ele parece já não fazer questão de esconder. - suas lágrimas já duelavam com seu orgulho. - Aí teve um dia que acordei e ao me olhar no espelho também quis distância de mim.
Pérola: Eu... eu nem sei o que dizer. - não era nenhuma surpresa saber disso. Meu pai era vaidoso demais para não enveredar por esse caminho.
Isadora: Eu sei que você deve achar que eu mereço...
Pérola: Ninguém merece ser enganada dessa forma, mãe. Principalmente alguém que seguiu a risca a vontade do marido. Alguém que fez de uma única pessoa o seu mundo e deixou os demais para trás como se não fossem importantes. Embora não entenda esse tipo de lealdade doentia, eu sei que a senhora não merece isso.
Isadora: Eu entendo a sua mágoa. Eu no seu lugar nem estaria aqui ouvindo tudo isso, mas é que estou tão sozinha. - vi seu corpo retrair em busca de consolo e num impulso a abracei. - Me sinto como um trapo velho. Já não sou mais a mulher por quem ele se apaixonou.
Pérola: E nem ele é mais o mesmo, mãe. - parece que os papéis tinham se invertido. Em meus braços eu parecia consolar uma criança machucada.
Isadora: Ela é jovem, Pérola. Deu a ele o filho homem que tanto quis e eu não pude dar. Quando os vi juntos pela primeira vez me senti uma intrusa. Senti como se estivesse me metendo no meio de uma família. Doeu tanto...
Pérola: Não tome uma culpa que não é sua. Pelo menos uma vez na vida enxergue quem ele é de verdade. Chega de querer se iludir. Essa vida que viveu todos esses anos foi falsa e a senhora sabe disso.