MARCELINE: Garotas

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Se isso fosse um filme, talvez os espectadores tivessem uma visão zenital, onde a câmera que está nas nuvens foca progressivamente em um ponto no chão. Aos poucos, seus formatos se tornam mais nítidos e nós começamos a identificar a grama verde se movimentando por conta do vento, lírios laranjas na grama e a sombra criada pelas folhas da árvore. Um pouco mais de foco e é possível ver uma garota pálida deitada nessa sombra com os olhos fechados e os dedos cruzados em cima da barriga. Ela respira profundamente e sua boca está formando um arco, que indica um estado de paz imperturbável. E então a imagem entra no plano detalhe, focando apenas nos olhos da garota, que, pressentindo os olhos dos espectadores, subitamente se abrem.

Mas como isso não é um filme, o motivo de ela ter aberto os olhos foi outro.

- Cor favorita?

Marceline virou a cabeça para o lado de onde a voz vinha.

Fora da sombra e deitada na grama, Jujuba brincava com o sol, colocando a palma da mão no rosto e abrindo e fechando os dedos para que os raios solares passassem.

- Vermelho? - a vampira respondeu como se fosse óbvio.

- Não Marceline, vermelho é o que você come. Eu me refiro a uma cor que chame sua atenção, que você fica horas observando os mínimos detalhes porque isso te intriga.

- Hum... - ela voltou a fechar os olhos.

"Bonnibel é uma pessoa bem profunda. Ela disse que eu também sou, mas somos profundas de maneiras diferentes. O profundo dela está em coisas boas. O meu profundo está no..."

- Preto.

- Eu já imaginava. - a princesa riu.

- Está dizendo que eu sou previsível?

- Não exatamente, só é bom para mim acertar seus gostos.

- Por quê?

- Porque isso significa que estamos ficando mais próximas, bobinha! - Marceline bufou - Mas você não vai me perguntar minha cor favorita? - ainda deitada, Jujuba virou o corpo todo na direção da vampira.

- Pra quê? Eu já sei.

- Duvido! - Jujuba rolou pela grama até parar perto de Marceline.

"Eu senti um toque no meu braço e quando abri os olhos ela estava do meu lado me encarando com um sorriso gigante. Cara, eu já tinha aberto a boca para responder, mas do nada deu um branco na minha mente e eu só fiquei olhando ela com cara de retardada. Era como se eu tivesse desaprendido a falar, a pensar, a respirar. É difícil explicar"

- R-rosa? - Marceline engoliu em seco.

- Já faz tempo que a minha cor favorita não é rosa...

- E qual é a sua cor favorita?

O sorriso de Jujuba se desfez.

"Eu precisava saber qual era o caralho da cor favorita dela? Não, não, não era isso que eu queria dizer. Eu só queria dizer que ela era linda. Mas que inferno tá acontecendo comigo? Eu não me reconheço mais, eu nunca senti essas porcarias no meu corpo antes. Isso não deve ser bom. Mas ela não me respondeu. Apenas ficamos nos olhando"

E por estarem se encarando por um tempo maior do que necessário, talvez não tivessem percebido alguns sinais como o estranho silêncio que imperava e as coisas ao redor delas que pareciam estáticas. Não notaram também algumas coincidências que como o fato de que as duas estavam respirando pela boca ou os olhos de ambas se procurando.

- Amarelo! - Jujuba se sentou na grama empolgada.

- Amarelo? - Marceline a acompanhou.

- Sim, amarelo. Minha cor favorita: amarelo. Eu amo amarelo.

- Eu odeio amarelo.

- Você é engraçada Marceline, mas eu não posso ficar muito tempo longe do meu reino. - Jujuba ficou de pé e limpou o short - Passa no meu quarto hoje a noite, eu tenho uma surpresa para você.

- O quê?

- Se eu te contar deixa de ser surpresa.

"Ela ENCOSTOU os lábios na minha testa e eu de novo senti uma queimação naquela região. Eu podia senti-los mesmo depois que ela já estava longe. Era como se fosse um carimbo na minha pele para que eu não pudesse esquecer que ela tinha encostado em mim. Mas que porra de mágica é essa que ela faz?"

Parecia impossível para Marceline entender que o que a levava sempre para Jujuba não era explicado por um feitiço muito forte ou um apetrecho de alta tecnologia, mas o que a levava (e levou também naquela noite) a ficar escondida de noite entre os arbustos próximo ao acampamento doce por horas, esperando que Jujuba desse um sinal para que ela pudesse entrar eram as próprias pernas. Uma resposta tão simples, mas ao mesmo tempo tão difícil de enxergar.

Depois de um tedioso tempo de espera, a princesa apareceu na janela do quarto, checando algo atrás de si antes de gesticular indicando que a Marceline já podia subir.

"Ela estava diferente naquele noite. Nunca tinha visto com o cabelo solto, acho até que combina mais com ela"

- Marcy! - Jujuba a recebeu com um sorriso imenso e um abraço.

Não é como se Marceline estivesse acostumada com aquele tipo de reação e por isso achou toda aquela situação doce demais, e por mais esforço que fizesse para achar aquilo ruim, ela não conseguia. São essas pequenas coisas que se outra pessoa fizesse ela ia de encontro aos seus princípios e sugava a alma.

"Ela me jogou uma camisola preta, parecida com a dela e me pediu para vestir"

- Beleza, onde é que eu me troco?

- Aqui mesmo bobinha!

Houve um momento de silêncio.

- Com você me olhando?

- Qual é Marceline, somos garotas! Qual o problema?

"EU NUNCA FIQUEI TÃO CONSTRANGIDA NA MINHA VIDA. Mas tive que trocar de roupa na frente dela, afinal, 'Nós somos garotas, qual o problema?'. Bom, mas depois disso ela disse que teríamos uma 'Noite de Garotas'. Não fazia idéia do que aquilo significava, mas até que não foi tão ruim quanto eu pensava. Ela só me obrigou a jogar uns jogos idiotas e 'comer' as comidas do reino dela antes de dizer que estava com sono"

- Você sabe que eu não durmo, não é?

- Mas você descansa pelo menos?

- É, pode se dizer que sim.

- Então você pode simplesmente deitar comigo?

"Mas porque as perguntas dela são tão embaraçosas?"

- Hã... sei lá eu acho que...

- Mas antes... - Jujuba interrompeu Marceline para vasculhar os objetos do baú que tinha em seu quarto - tcharam!
A garota exibia orgulhosa um espelho de moldura preta e gótica.

- É o meu espelho? - Marceline pegou das mãos de Jujuba.

- Claro! E você nem imagina o que eu tive que fazer!

Enquanto Jujuba contava toda a aventura que foi a confecção do instrumento, Marceline cautelosamente ajustava-o em seu campo de visão para que pudesse ver seu próprio rosto. Era um sensação estranha, que por um momento a fez esquecer do vampirismo que corria em seu corpo.

- Amarelo não é a minha cor favorita. - os olhos de Marceline se desviaram do reflexo do espelho - Talvez seja preto. - Jujuba disse um pouco envergonhada.

- Tudo bem. Talvez a minha seja rosa.

Nesse momento, pela primeira vez, os sentimentos delas assumiram o controle e conversaram entre si. E tudo bem se depois de alguns minutos eles voltassem para o esconderijo de sempre.

"Eu acho que não posso mais fugir isso"

Candy Girl (Bubbline)Onde histórias criam vida. Descubra agora