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- Por favor Megan.. Prometa que dará seu melhor na faculdade. É uma oportunidade, única.

É uma oportunidade única. Essa frase se repetiu na minha mente tantas vezes que seria incapaz de contar...

Meus olhos captam todas as imagens possíveis do lado externo do ônibus, todas as imagens do mundo que eu não conheço. O céu tem mais azul, os montes são altos e estão esverdeados. Há alguns rebanhos e poucas casas construídas. Encostei no vidro da janela e fechei os olhos. É uma oportunidade única. A voz da Joselyn surgiu na minha mente, mais uma vez. Abri os olhos com sonolência, não tinha mais espaço para o verde, não havia mais rebanhos. Eram prédios, prédios, pessoas, pessoas e barulho. Muito barulho. Parecia que eu só tinha fechado os olhos, mas na verdade dormi três horas. Três horas. Perdi tudo isso, em liberdade.

(...)

Fazem dezoito anos que minha vida é uma prisão sem grades; Ou seja, deste que nasci. Com três meses, fui deixada em frente ao Convento das Noviças de Blém, em uma caixa de sapato, com um bilhete que guardo até hoje, tendo escrito apenas o meu nome e minha idade. Podemos imaginar que a mulher que me abandonou tinha motivos, estava fugindo de um vilão ou era muito pobre para me sustentar. Podemos deixá-la no papel de mocinha. É normal abandonarem crianças no convento, e as freiras fazem trabalho comunitário cuidando dessas crianças, as direcionando para os orfanatos. Mas eu, eu não fui para orfanato algum. Fui criada pelas freiras, por todas elas, a única criança para alegrar o dia daquelas mulheres que não possuem famílias.

Até os onze, era só alegria. Trabalhos comunitários, cada dia uma nova tarefa, desenvolver o lado humanitário e espiritual, brincar de bonecas, e puxar o capuz das minhas tias.. Mas aos doze anos, algo mudou, eu mudei. E durante a aula sobre a bíblia, focada na parte do livre arbítrio, eu despertei. Não escolhi nascer, não escolhi crescer com freiras, não escolhi ser um projeto de noviça, não escolhi ler a bíblia, não escolhi não ir para escola, não escolhi só poder sair nas cidades vizinhas nos sábados, não escolhi nada na minha vida. Então, onde estaria meu livre arbítrio? Nas mãos das freiras? Quem tinha o controle da minha vida? As freiras. Estava tudo determinado, e ninguém nem se quer perguntou como eu me sentia em relação à tudo. É uma oportunidade única.

Estou livre? Estou fora do convento, em um ônibus indo em direção à um lugar totalmente desconhecido, com pessoas desconhecidas, com hábitos diferentes; Quando soube da oportunidade de ir para a faculdade aos dezoito anos, não pensei em mais nada, só queria sair, ver o mundo, decidir o que eu quero pra mim.. E agora que a faculdade é minha chave para o mundo, o curso de psicologia é meu motivo de ir embora, eu vou aproveitar todas as oportunidades, afinal elas podem ser únicas.

(...)

- Bloco A, Terceiro andar, quarto cento e vinte e quatro. - Li o pequeno papel que estava em minha mão, enquanto adentrava o prédio azul. Era muito bem organizado, limpo e bonito. Havia uma senhora sentada em uma poltrona bege, no canto do hall de entrada. - Com licença.. - Interrompi sua leitura. Ela me olhou e sorriu amigavelmente. - Este é o bloco A?

- Sim querida; Pode subir estas escadas e encontrar o seu quarto. - Balancei a cabeça positivamente, e sem esforços consegui subir mais de vinte e oito degraus, passando por dois andares, até finalmente encontrar o quarto de numeração cento e vinte e quatro.

Enquanto arrastei minha pequena e única mala pelas escadas, pude presenciar momentos íntimos de famílias que se importam com seus filhos.. Mães chorando, pais sorrindo, e eu interrompendo este momento, enquanto me aproximava para entrar no quarto em quê eles estavam na frente.

- Ah.. Com licença. - A mãe interrompeu o abraço, limpou a maquiagem e sorriu para mim. - Obrigada. - Eles liberaram a passagem e eu me culpando por interromper o momento da família.

Losin Control (Concluído) Onde histórias criam vida. Descubra agora