Quando Rita chegou em casa, já encontrou Clara esperando.
— Puxa, você demorou.
— Não pensei que você já estivesse em casa.
— Vim mais cedo. Estava ansiosa para saber tudo. Como foi?
— Bem. A princípio eu estava constrangida. Não sabia como ele iria reagir. Mas nossa conversa foi melhor do que eu esperava.
— Como assim?
Rita ficou pensativa por alguns segundos, depois considerou:
— Osvaldo está mudado. Parece outra pessoa.
— Mudado como? Está mais velho, magro, abatido ou o quê?
— Nada disso. Fisicamente está até melhor.
— Explique-se.
— Não sei dizer. Seus olhos, sua postura, seu jeito, está diferente. Também está mais bonito, elegante. Apesar de o nosso assunto ser delicado, ele me pareceu mais seguro,
firme. Nossa conversa foi franca, e senti que ele está mais verdadeiro, mais amadurecido.
— Por que demorou tanto?
— Bem, ele me tratou com muito respeito e consideração. Conversamos muito e o tempo foi passando. Quando eu quis vir embora ele me pediu para ficar mais um pouco.
— Deu meu recado sobre Válter? O que ele disse?
— Sim. Ele me pediu que lhe contasse tudo que nos aconteceu durante o tempo que ele esteve ausente.
— Não foi para isso que você foi lá.
— Eu não queria tocar no passado. Sabia que seria dolorido para ele. Não queria que me interpretasse mal. Mas Osvaldo se mostrou interessado. Emocionado, notei que se
esforçava para manter controle.
— Não sei se foi bom ter pedido a você para procurá-lo.
— Ao contrário. Foi ótimo. Adorei ter ido.
Clara ficou calada por alguns instantes. Depois perguntou:
— Sobre o que mais falaram?
— Ele ficou emocionado quando soube que foi você quem me mandou lá, e nervoso quando contei que Válter continuava perseguindo-a. Mandou dizer que não precisa se preocupar. Não vai deixar que ele faça nada.
— Não disse o que pretende fazer para impedir isso? E se for procurar Válter?
— Osvaldo não fará nada disso.
— Por que tem tanta certeza?
— Agora ele conhece a espiritualidade. Desenvolveu mediunidade, trabalha com os
espíritos.
Clara surpreendeu-se:
— Ele? Nunca se interessou por religião.
— Você já sabe a história. Carlos contou. Quando ele se jogou do trem, foi socorrido e assistido por um curador. É assim que são chamados os médiuns no campo. Então, tudo
aconteceu. Tenho certeza de que Osvaldo é dos bons.
— Por quê?
— Quando mencionei Dona Lídia, descreveu-a minuciosamente. Ele a viu mesmo.
— Como pode ser isso?
— Vidência. Garanto que muito verdadeira. Acertou tudo. Isso me acalmou. Tenho certeza de que ele não fará nada errado. Depois, ele olha nos olhos quando fala e inspira muita
confiança.
Clara não respondeu de pronto. Rita continuou:
— Você não precisa ter medo da convivência dele com os meninos. Ele só fará o que for bom.
Clara hesitou um pouco, depois perguntou:
— Ele falou alguma coisa de mim?
— Falamos do passado, de tudo.
— Ele... conseguiu esquecer, refazer sua vida afetiva?
— Não. Quando lhe perguntei se havia perdoado você...
— Não devia ter perguntado isso... — interveio Clara, aflita.
— Ele me deu abertura, e eu quis saber. Respondeu-me que durante todos estes anos pensou que tivesse conseguido perdoar. Mas agora descobriu que a ferida ainda sangra. A mágoa ainda está lá. Clara levantou-se nervosa:
— Ele ainda me odeia! Eu sabia! Suas palavras para os meninos não eram verdadeiras.
— Em nenhum momento ele pareceu odiá-la. Ao contrário. Fala em você com respeito e certa deferência.
— Não creio. Se não me odiasse, teria perdoado e esquecido. Se ainda sofre, é porque me odeia.
— Ou ama. Um amor impossível também dói.
— Você está fantasiando.
— Se eu fosse você, iria conversar com ele.
— Está louca?
— Não. Tenho certeza de que a conversa seria muito oportuna e elucidativa. Vocês teriam muito a se dizer e, quem sabe, poderiam resolver todas as pendências do passado.
— Eu não teria coragem para isso. Já chega a consciência de minha culpa. Não preciso ouvir as acusações dele.
— Lembre-se de que todo assunto mal resolvido retorna para dar a chance a que os envolvidos se libertem. A volta dele é uma excelente oportunidade para isso.
—Não quero ouvir mais nada sobre esse assunto. Fiz a minha parte avisando-o. Agora posso ficar em paz.
Rita não respondeu. Ficou olhando para ela até que desaparecesse na curva da escada.
Depois dirigiu-se à cozinha para cuidar do jantar. Sentia-se leve, alegre, como se tivesse se
libertado de um grande peso. Cuidando dos afazeres, chegou até a cantarolar.
Carlos, que chegava, observou:
— Que bom! Cantando, o jantar vai ficar mais gostoso.
— Vou fazer aquela sobremesa de que você gosta.
— Oba! Mas você só faz em dia de festa.
— Pois vou fazer hoje.
— O que vamos comemorar?
— Nada. Estou alegre, só isso.
— Então você deveria ficar alegre mais vezes.
— Vá tomar banho, que logo o jantar estará pronto.
No dia seguinte, Válter foi procurar Antônio em casa. Convidado a entrar, Neusa apareceu logo e olhou contrariada para ele.
Antônio explicou:
— Válter veio nos ajudar. Estamos precisando, uma vez que quem deveria não faz nada.
Neusa mordeu os lábios com raiva.
— Os filhos são ingratos mesmo.
— Como vai a senhora, Dona Neusa?
— Como Deus quer. Há pessoas que nascem para sofrer...
— Sente-se, Válter — interrompeu Antônio, maneiroso. — Você precisa entender, mãe, que Válter nunca deixou de ser meu amigo.
— Por causa dele você perdeu o emprego.
— Por causa dela, isso sim. Homem é homem. A sem-vergonha foi ela.
— Não falemos do passado. Vim aqui como amigo. Nós sempre fomos amigos.
— Mãe, vá fazer um cafezinho para nós. Queremos conversar.
Depois que ela foi para cozinha, Válter disse baixinho:
— Vim aqui para ajudar mesmo.
— Tem algum emprego para mim?
— Ainda não. Mas estou procurando. Quero encontrar alguma coisa à sua altura. Você precisa ser valorizado, não explorado. Terá de ganhar bem e trabalhar pouco.
— É exatamente o que tenho procurado todos estes anos.
— Sabe que não é fácil. Mas, se me ajudar, tenho certeza de que conseguirei.
— Farei qualquer coisa para ter uma renda boa. É horrível viver sem dinheiro. Minha mãe
está velha, cansada, precisa de conforto.
— Não pensei que estivessem passando necessidade. Seu irmão voltou rico.
Antônio levantou-se nervoso
— Pois ele não dá nada. É como se não existisse. Nem parece da família.
— Por que não mandou sua mãe falar com ele?
— Ela foi, mas ele não fez nada.
— Isso é que é ingratidão. Você perdeu o emprego por causa de Clara.
— Não me conformo.
— Não fiz de propósito. Aquela mulher me alucina.
— Ainda gosta dela?
— Nunca consegui esquecê-la. Daria tudo para que me aceitasse. Eu estava quase conseguindo, mas então Osvaldo voltou, rico,bem-posto, dando tudo para os filhos e para ela. Então ela me rejeitou. Não quer mais saber de mim. Estou desesperado.
— Por que não tenta esquecer? Ela não quer nada com você mesmo.
— Não consigo. Tenho certeza de que, se ele não tivesse aparecido, ela me aceitaria.
Antônio pensou alguns segundos, depois disse:
— Você acha que ele vai voltar a viver com ela depois de tudo?
— Acho. O tempo passou e ele era louco por ela. Pode querer isso mesmo. Por que resolveu voltar?
— Eu Custo a crer que ele tenha o desplante de viver com ela como se nada houvesse acontecido. Precisaria não ter vergonha na cara.
— A paixão é cega. Olhe, preciso que você descubra em que pé estão as coisas entre eles.
— É difícil. Nosso relacionamento não é bom. Ele nem sequer me ouve.
— Não ouve porque você não sabe chegar. Só reclama. Vá lá como quem não quer nada, aproxime-se dele. Fale nos laços de família, diga que são irmãos e precisam entender-se
melhor, que sua mãe sofre por ver que vocês não se dão. Enfim, mostre-se arrependido por
haver brigado com ele. Peça apoio, ajuda. Mostre desinteresse. Não fale em dinheiro, por favor.
— Não sei se poderei fazer isso. Não é do meu feitio.
— Eu sei. Mas preciso que descubra o que quero saber. Em troca arranjo um emprego daqueles para você. Dinheiro no bolso todo mês.
Pouco esforço.
—A oferta é tentadora. Verei o que posso fazer.
— Nada disso. Você vai começar hoje mesmo.
Neusa chegou com o café e serviu-os em silêncio. Havia ficado escondida ouvindo a conversa. Depois que Válter se foi, ela comentou
— Ele está louco. Não sabe o que diz.
—Você ouviu?
— Tudo. Não acredito que Osvaldo esteja pensando em voltar com ela.
— Não sei, não. Ele era louco por Clara, lembra?
— Lembro. Você vai fazer o que ele pediu?
— Estou pensando...
— Seria bom. Ele está com ciúme. Mas o bobo do Osvaldo bem pode estar pensando mesmo em ir viver com ela. Por outro lado seria bom você se aproximar dele, tentar conquistar sua amizade. Assim, ele acabaria por nos ajudar. Seria bom, porque não temos
dinheiro nem para o essencial.
— Vou tentar, mãe. Você sabe que sou bom para representa ser um papel e tanto.
Valter deixou a casa de Antônio satisfeito. Antônio era fácil de manipular e lhe traria todas
as informações sobre o rival. Então faria o plano para tirá-lo do caminho definitivamente.
Uma semana depois, no fim da tarde, Osvaldo, sentado em seu escritório em casa, meditava sobre sua vida. Rever os amigos no interior havia sido maravilhoso, mas ele sentia que
aquele tempo havia acabado. Estava na hora de retomar a vida na cidade.
Além disso, havia os filhos. Eles tinham dado novo sentido à sua vida. Não se sentia com forças para deixá-los. A cada dia, mais se sentia feliz por estar com eles, descobrindo um pouco mais dos seus gostos e preferências, apoiando-os com carinho e firmeza. Esse
carinho preenchera sua solidão.
Independentemente disso, desejava trabalhar, ocupar-se, sentir-se útil. Ainda não decidira o que fazer, mas tinha certeza de que seria alguma coisa voltada à espiritualidade.
Acreditava que a vida lhe colocara nas mãos uma fortuna, para que a usasse em favor do progresso seu e de todos. Nunca tivera ambições próprias. Ao contrário: depois do drama que vivera, acostumara-se a viver na simplicidade do campo, satisfazendo-se com quase
nada. Bastavam-lhe o carinho dos amigos, as belezas da natureza, o trabalho com os espíritos cuja sabedoria e bondade o enterneciam.
As mudanças que ocorreram mostravam que ele precisava mudar o rumo e seguir adiante.
Agora estava vendo claro.
Assumir conceitos de espiritualidade significava viver de acordo com eles todos os instantes de sua vida. Só assim poderia sentir-se verdadeiramente feliz, realizado.
Nos últimos anos, atendendo às pessoas, assistindo ao sofrimento humano, pudera perceber
claramente que a infelicidade do homem é causada pelo desconhecimento das leis
cósmicas. Descobriu que a ingenuidade tem um preço caro e não isenta ninguém da
responsabilidade de suas atitudes.
Estava certo de que a harmonia, a felicidade que o homem deseja só virá quando ele aprender e respeitar as leis cósmicas, olhar a vida como é, desenvolver a consciência
vivenciando os valores eternos da alma. Ninguém a pretexto de assumir uma religião, seja qual for, encontrará o equilíbrio interior cumprindo regras em sua maioria originadas de
crenças sociais, distorcidas da verdade. A conquista da espiritualidade é um trabalho
interior incessante, é o reconhecimento do próprio potencial, o esforço paciente de se ver
sem máscaras ou subterfúgios, aceitando tanto as qualidades como os pontos fracos, sem culpas ou reprimendas, procurando vencê-los com bondade e firmeza.
É fazer o possível para essa conquista, mas aceitando todas as determinações da vida que não pode mudar, procurando tirar delas todo bem que conseguir perceber. A confiança na
vida é fundamental para quem deseja cuidar do seu mundo íntimo e harmonizar-se com as forças positivas do universo.
Osvaldo tinha profunda consciência de todas essas coisas. Suas experiências com os espíritos, os desafios que enfrentou na vida, a ajuda que recebeu de Deus quando descrente e incapaz de pensar com clareza, a proteção divina que nunca o abandonou nesses momentos infundiam-lhe a certeza de que a conquista da felicidade era questão de tempo e de bom desempenho. Ele sentia que estava descobrindo como fazer isso.
Mostrar tudo às pessoas, ensiná-las a observar a vida, buscar caminhos novos de aprimoramento e equilíbrio interior, tudo isso seria a forma de realizar a profilaxia da dor,
dos sofrimentos.
Ajudar quem está sofrendo em um leito de dor, mitigar a fome dos miseráveis são tentativas
válidas de ajudar, são bênçãos de amor que dão mais ao que faz do que ao que recebe.
Contudo, poder evitar a dor antes que ela chegue é dar a cada um o poder de saber que é o criador do próprio destino. É torná-lo consciente do próprio poder, é colocar em suas mãos meios de viver melhor, de conquistar a sabedoria, de tornar-se lúcido e seguro em seus passos.
Essa é a maior ajuda que se pode dar. Porém não é a mais fácil. É preciso que a pessoa queira e se disponha a enfrentar seus medos e suas crenças erradas do passado, deixar o
conforto do comodismo para experimentar o novo, recomeçando sempre, corrigindo rumos,
buscando compreender melhor.
Osvaldo perguntava-se como fazer isso. Os espíritos lhe haviam dito através de Antônio, na reunião de despedida que fizeram antes de seu retorno, que sua tarefa maior era a de cuidar da própria evolução, estudando a vida, estudando a si mesmo. Só assim estaria pronto para
um dia realizar seu desejo de ajudar efetivamente o progresso da humanidade.
Os conflitos que ainda se debatiam dentro dele informavam-no que estava longe de
conseguir o próprio equilíbrio. Não seria cedo para iniciar um trabalho de ajuda espiritual às pessoas? Ele havia feito isso sob a orientação e proteção de Antônio. Sozinho, conseguiria o mesmo sucesso?
Mas ao mesmo tempo sentia-se muito motivado. Fechou os olhos e evocou seu guia espiritual. Queria orientação. Sentiu um calor agradável no peito e nas mãos e uma paz
confortadora. Continuou absorvendo essas energias alguns instantes e de repente ou viu distintamente:
— Quando o trabalhador está pronto, o trabalho aparece. Confie e espere.
Tudo desapareceu e ele abriu os olhos e entendeu que precisava ficar atento e perceber quando as coisas começassem a acontecer. A vida fala com as pessoas através de sinais aos
quais é preciso saber observar. Seus recados são claros, mas há que ter olhos de ver.
O telefone tocou e José entrou dizendo:
— É Rita, quer falar com o senhor.
Ele atendeu em seguida. Depois dos cumprimentos, ela tornou:
— Ontem fui ao centro e conversei com Dona Lídia. Ela se interessou muito pelos trabalhos de cura que você fazia com o curador no interior. Disse que gostaria muito de
conhecê-lo.
Osvaldo sentiu uma sensação agradável e respondeu:
— Ótimo. Eu também gostaria muito. Ela disse quando pode ser?
— Quando quiser.
— O mais rápido possível.
— Bom, hoje ela começa o atendimento às oito. Se chegar antes, poderão conversar com
tranqüilidade.
— Agora são seis e meia. Acha que é muito cedo?
— Não. Pode ir.
Passava um pouco das sete quando Osvaldo chegou à casa de Lídia. Ela o recebeu com alegria e conduziu-o a uma pequena sala onde poderiam conversar à vontade.
Osvaldo gostou dela imediatamente. Seu rosto simpático, sua maneira de sorrir e olhar nos olhos das pessoas transmitiam confiança. Seu jeito simples deixou-o logo à vontade.
Depois de sentarem-se no sofá, ela tornou:
— Havia muito o esperava. Sabia que viria, Isso me dá muito prazer.
— Obrigado. Estou contente por encontrá-la. Ainda há pouco, pedia ao meu guia espiritual urna orientação.
— O trabalho espiritual é uma bênção para o médium. Traz alegria, alimenta a alma. Quem o experimentou um dia não consegue mais viver sem ele.
— Tem razão. Recebi tanto bem, tantas alegrias nos contatos com os trabalhadores do bem que estou ansioso para recomeçar. Nos últimos dias tenho me debatido na dúvida. Deixei a proteção e os cuidados do meu amigo e mestre Antônio, voltei para a cidade, envolvi-me
nos conflitos mal resolvidos do passado. Lá no interior, sentia-me seguro, apoiado, distante
de tudo. Cheguei a imaginar que havia vencido as angústias que me levaram para lá.
Entretanto, os conflitos ainda me afligem. Penso que ainda não estou pronto para os trabalhos espirituais.
— Você teve uma pausa, que o aliviou temporariamente para que pudesse entender a vida como ela é, jogar fora crenças erradas, descobrir o mundo dos espíritos, encontrar seu
mundo interior, suas necessidades como espírito eterno que estão acima dos problemas materiais. É preciso viver no mundo, mas acima de tudo é preciso usar as experiências do
mundo para amadurecer o espírito, tornar-se mais espiritual.
Osvaldo estava comovido. Os olhos de Lídia brilhavam irradiando uma luz que ele sentiu como um banho de energia positiva em seu corpo. As lágrimas começaram a descer pelo
rosto e ele as deixou cair.
— É isso que tenho procurado fazer. Mas às vezes ainda confundo meus sentimentos, misturo emoções, sinto-me perdido.
— Você foi provado no ponto mais difícil. A vaidade cega e complica tudo. Sem ela, você há muito teria percebido a verdade e talvez já houvesse encontrado a felicidade.
Há muito que perdi a vaidade. No campo, vivi na mais absoluta pobreza, convivi com a vida bem simples, onde a vaidade é esquecida.
Apesar disso, a mágoa ainda o desafia. Não é fácil deixar os conceitos do mundo. As regras, as convenções de uma sociedade materialista têm a força de crença da maioria,
assim tomam-se barreiras difíceis de serem derrubadas. Às vezes é preciso muito sofrimento, muita dor, muitas perdas para que a pessoa se dê conta de que a vida tem outros
conceitos, mais verdadeiros.
Eu mudei muito. Antes eu era um homem tranqüilo, seguindo as regras da sociedade, julgando-me inteligente por haver escolhido o caminho da honestidade, da família, do
trabalho. Sempre cumpri com todas as regras e era muito respeitado por todos.
— Mas você precisava crescer. Deixar o comodismo de uma situação conquistada, segura, e buscar os desafios do desenvolvimento.Por isso foi submetido a esse teste. Precisava
despertar para a espiritualidade.
Estava na hora de olhar a vida real, como é, sem as ilusões acomodadas do mundo. Por isso se casou com uma mulher que, apesar de valorosa, deixou-se levar pelas ilusões da vaidade.
Viu-se admirada, sentiu-se valorizada, curiosa, diante dos apelos do sexo. Também ela precisava aprender os verdadeiros valores espirituais. Ela mudou, amadureceu. Reconheça
que ambos cresceram.
— Isso é verdade. Mas agora que meus filhos compreenderam que eu os amo muito e perdoaram os anos de ausência, sinto que não estou tão só. Tenho boa situação financeira,
mas quero trabalhar, ser útil. E, embora não me sinta preparado, preciso do trabalho espiritual. Mas ainda não sei o que e como fazer.
— Não se apresse. A vida lhe mostrará o caminho quando chegar o momento. Agora, quanto ao trabalho espiritual, está mais do que preparado para recomeçar. É isso que está
me dizendo Alberto. Você o conhece?
— É um dos espíritos que nos ajudava a atender às pessoas lá no interior.
— Ele o aconselha a rever seus conhecimentos de cura memorizando e procurando ter um lugar onde possa fazer exatamente o que fazia lá, do mesmo jeito e com as mesmas coisas.
Quando tiver feito isso, o resto virá naturalmente. Está dizendo também que confie em você e não se deixe levar pelas sugestões de espíritos perturbados. Você tem conhecimento e domínio, fé e coragem para não se deixar envolver. Recuse os pensamentos negativos de
qualquer tipo. Procure olhar todos os acontecimentos de forma positiva. Você sabe que só o bem é real. Fora dele, não existe mais nada. O mal é ilusão.
Lídia levantou-se e colocou a mão sobre a cabeça de Osvaldo, dizendo:
— Que Deus o abençoe. Lembre-se de que estaremos a seu lado e o ajudaremos sempre, desde que faça sua parte, conservando pensamentos positivos. Eles são nosso ponto de
ligação porque nos permitem ter acesso ao seu mundo interior. Alberto.
Lídia calou-se e Osvaldo emocionado abriu os olhos sentindo-se aliviado como há muito não se sentia.
— Obrigado, Dona Lídia. Deus a recompense pelo bem que me fez.
Ela o abraçou comovida e respondeu:
— Eu que agradeço pela oportunidade de conhecer você e um espírito como Alberto.
Em seguida ela lhe pediu que explicasse o trabalho que ele e Antônio realizavam, e Osvaldo contou tudo nos mínimos detalhes.
Quando ele se despediu, estava sereno e contente, pensando no que fazer para atender ao que Alberto lhe pedira.
Passava das oito quando chegou em casa e José o esperava para servir o jantar. Enquanto comia, continuava pensando. José comentou;
— Aconteceu alguma coisa? O senhor está calado, parece preocupado.
— Não. Estou bem. Mas gostaria de retomar minhas experiências com as ervas, como fazia no interior. Já lhe falei sobre isso.
— Boa idéia.
— Não é fácil. Estamos na cidade.
— Mas pode fazer isso no sítio. Nunca esteve lá? Dona Ester adorava ir lá, passava dias cuidando das flores. Esse sítio é seu agora.
Osvaldo admirou-se;
— É, há um sítio. Como me esqueci disso? Onde fica?
— Não levará uma hora para chegar lá.
— Você sabe onde é?
— Claro.
— Amanhã mesmo iremos até lá. Quero conhecer o lugar. Puxa, como não pensei nisso antes?
José sorriu alegre e respondeu:
— Tudo vem na hora certa!
Osvaldo olhou sério para ele e disse:
— Deus falou pela sua boca. Como é esse lugar?
— No escritório há documentos, fotos, plantas, tudo. Se quiser, podemos ver agora.
Osvaldo concordou com entusiasmo. No escritório, José abriu um armário e entregou-lhe volumoso pacote que Osvaldo abriu curioso. Tratava-se de uma propriedade de vinte e
cinco alqueires, muito bem cuidada, tendo a casa principal mais a do administrador e algumas casas de empregados, um lago, muitas árvores e flores.
— Iremos para lá amanhã bem cedo.
— Rosa pode ir conosco? Ela adora aquele lugar. Dona Ester quando ia sempre nos levava.
Osvaldo sorriu e considerou:
— Claro. Sairemos ao clarear do dia.
— Combinado. Deixaremos tudo pronto ainda hoje. Vou pedir a Rosa que arrume sua mala.
— Não precisa. Eu mesmo faço. De sítio eu entendo.
Osvaldo foi para o quarto, arrumou a bagagem, depois preparou- se para dormir.
Deitou-se emocionado, lembrando-se dos últimos acontecimentos. Sentia em tudo que acontecera a mão invisível dos amigos espirituais mostrando-lhe o caminho a seguir.
Uma onda de alegria banhou seu coração. Tinha certeza de que estava sendo abençoado pelas forças do bem e conduzido para uma vida melhor.
Naquele instante, em pensamento agradeceu a Deus por tudo que estava recebendo e fez intimamente o voto de dedicar-se ao trabalho espiritual com disposição e sinceridade.
Depois, sentindo-se tranqüilo e alegre, adormeceu.
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Quando é Preciso Voltar
EspiritualA traição da mulher amada doía no fundo do coração de Osvaldo. Açoitado pela desilusão, ele não sabia o que fazer. Como viver carregando o peso dessa dor? Como enfrentar essa dura realidade e continuar vivendo? Amargurado, ele não pensou nos dois fi...