capítulo dois - 2018

18 2 0
                                    

Felizmente nenhum som é emitido durante os minutos seguintes desperdiçados em minha vida. A secretária não tira os olhos do livro — ela não pode me incomodar. O relógio não tem som — ele não pode me incomodar. Só existe eu para consultar — ninguém pode me incomodar.

De tão entediante que esse descanso acaba soando, até a parede me chama mais atenção. Ela é completamente cinzenta. Me sinto em um espelho. Dentro daquele lugar, é tudo uma casa de espelhos. Me vejo refletido na cor das paredes, no tédio que o cômodo carrega, e na longa espera desnecessária que eu levo, apenas porque a psicóloga não está atendendo ninguém hoje e só tem eu do lado de fora. Era um sistema horrível de atendimento. Alô, secretária, eu estou esperando sozinho.

Ela não me ouve pigarrear. Até a droga de um livro de romance soa mais tediante do que eu.

Me fixo em seu rosto. Em sua expressão indiferente. É um romance adolescente, provavelmente está na moda nas livrarias, em que todos os bookholics já leram logo depois de lançar no nosso país. Mas isso não me convence de que ele é interessante, é só uma prática de anti-tédio. Existe coisa melhor para se ler, como por exemplo, a mente humana.

Foi isso o que Yugyeom me recomendou. "Ei, por que você não vai no consultório de uma amiga minha? Ela é muito boa, talvez faça um desconto para ti se você disser que mora comigo." Eu nem vou contar a quantidade de mentiras que essa fala carrega, apenas deixo meus sentimentos se combaterem por dentro, fitando uma parede cinza mais puxada para o branco, onde tudo é inexistente. Seria uma mensagem subliminar?

Yugyeom não me contou onde a conhecera, tampouco me mostrou uma foto sua. Vê-la naquela consulta será como conhecer a futura mulher do meu filho — não literalmente, mas um sentimento parecido. Meu cérebro é o futuro dele.

Resolvo me mexer para pegar um copo d'água. Talvez eu me acalme.

Nesse instante, como se fosse o clichê adolescente do romance da secretária, uma mulher corre imediatamente para o escritório da psicóloga e fecha a porta bruscamente. Não deu para ver seu rosto, apenas um leve deslumbre de cabelos escuros e curtos. Um ser pequeno, rápido, e discreto. Minha atenção não era das melhores.

A secretária, pela segunda vez naquele dia, me olhou — a primeira havia sido quando cheguei ali e confirmei ser um paciente. Ela fez um movimento com a sobrancelha que achei que fosse uma pergunta, do tipo "ei, o que você faz agora, seu maluco? Parou de encarar a parede cinza?" Mas foi só um movimento simples, até ela atender o telefone, me olhar pela terceira vez, séria, e dizer:

— A doutora Park está na sala dela, pode entrar.

Agradeci com um aceno, e inspirei fundo. Odiava a psicologia com todas as forças; ela só trazia mais verdades, e verdades difíceis de serem encaradas, como a cor branca perfurando o cinza infinito da parede.

"O que eu não faço por você, Yug."

A sala, muito pior do que o lado de fora, tinha um ar pesado, sério. Dava um pensamento de que: agora que você pisou aqui, fale a verdade, você não tem escolhas. Havia uma enorme estante de madeira escura de um lado, com um sofá e uma poltrona na frente, e no fundo da sala, uma escrivaninha. Nela, estava a mulher que entrara rapidamente na sala. Até os psicólogos se atrasam. O tempo não é amigo das doenças mentais.

— Você deve ser Park Jinyoung, não é? — Não me aproximei mais. A forma de fala daquela mulher não me deixava confortável.

Park Jihyo, era o seu nome. E agora, entendia porque Yugyeom não me explicou sobre ela. Porque ela era indecifrável. Para uma psicóloga, alguém que deveria ser mais aberta a pensamentos e a ouvir os outros, tinha em si, um mundo misterioso. Jihyo tinha os olhos mais brilhantes do mundo, pelo menos, e um rosto com expressões fortes, rápidas. Ela ficou séria comigo, mas e depois, se sorrisse, sorriria da forma correta. Uma coisa certa sobre si, que eu não teria medo de confirmar: ela era direta. Bem direta. E inteligente, pois...

— Já pode se sentar, não tenha medo de mim.

— Eu não tenho medo de você.

Ela segurou um riso de deboche.

Arrumou-se em sua poltrona, na posição mais clichê de todas as características dadas à psicólogos. Jihyo também era um clichê. Mas ao mesmo tempo diferente.

— Vamos, Jinyoung, sei que posso parecer mais interessante do que sua vida "inútil" — fez aspas com os dedos — mas eu quero saber sobre você. Por favor.

— O que quer saber? Quem te contou da vida inútil? — Questionei. — Não tem medo de acabar magoando um paciente sendo crua e grossa desse jeito?

— Yugyeom me contou sobre como você é, mais ou menos. Não tenho medo de lidar com alguém como você, porque você não é o único. — Rebateu. — Jinyoung, sei que você deve ter se cansado nessa pequena espera, mas agora eu estou aqui e...

— Curta espera?

— Foram cinco minutos que eu deixei a sala para ir ao banheiro, Jinyoung.

O tempo não existe.

Repensei a ideia. Eu estava a reprimindo, tinha medo dela — lógico que não iria confessar. Mas pense: seria uma boa lógica? Sim. Ela tinha noção das coisas porque não era doente, e eu não era doente, mas não tinha noção das coisas. Faria isso por Yugyeom, tiraria a tristeza de mim. Do jeito que eu conseguisse.

Sem nenhum trauma.

— Você não entende.

Ela assentiu. "Por isso ela está aqui, para me entender".

Suspirei. Terei de aguentar isso pelos próximos dias seguidos na semana.

why? ☆ got7Onde histórias criam vida. Descubra agora