capítulo sete

3 0 0
                                    

Por consequência de não ter contribuído absolutamente nada para a missão, fui despachado da delegacia como o lixo da manhã; descartado com nojo e rancor. O delegado arriscou soltar um riso, sabendo que no fundo estava certo. Me manter próximo à algo do passado não seria inteligente, tanto para minha situação quanto para contribuir ao caso.

E não o julgo, eu estava quase acreditando nisso também.

— Será que eu posso entrar, senhor? — Jaeboum perguntou entre a porta. Me virei para encará-lo. Parecia estar segurando alguma coisa entre as duas mãos, e sua cara mantinha o que ele mais queria fazer: uma boa ação, algum consolo para o cliente desesperado que atingiu novamente o fundo do poço.

— À vontade, Jaeboum. — Respondi, dando uma última olhada para o céu estrelado na minha janela.

— Percebi que não anda muito à vontade desde que voltou da rua. Então, fiz um remédio caseiro para acalmá-lo: chocolate quente da minha querida e falecida bisavó. — Entregou-me a caneca verde com detalhes de flores pintadas, e tomou um gole da sua. Encarando-o, percebi o que o impedia de se manter mais íntimo de mim.

— Você pode ficar aqui, Jaeboum. —O homem deu um suspiro de alívio. — E pare de me chamar de senhor, por favor. — Acrescentei. — Considere-se um novo amigo para mim agora.

— Fico feliz que me considere um amigo, senhor... Quer dizer, Jinyoung.

Assenti, tomando pela primeira vez um gole do chocolate. Estava morno, saboroso e com um toque de lembranças da casa da avó. Não muito diferente daquela pousada.

— Jaeboum, você acertou em cheio. — Elogiei. — Sério, eu precisava disso.

Jaeboum sorriu dengoso.

— Minha bisavó sempre dizia: quando se sentir para baixo, basta novamente provar o doce gosto do chocolate. Ele acalma a alma e alivia a dor no peito, assim como a felicidade. — Citou, pondo a mão no peito cheio de orgulho. Aquele ato fez meu coração se aquecer por dentro.

— Sua bisavó parece ser alguém legal, eu gostaria de conhecê-la.

— Eu também. — Jaeboum soltou, abaixando a cabeça. Arqueei a sobrancelha. — Bem... Ela faleceu antes de eu nascer, então todos os ensinamentos que eu ganhei ao longo da vida foram dados pela minha avó. Mas ela era totalmente o oposto do que minha bisavó aparentava ser... E eu agradeço ela por ter sido assim, porque se não, esta pensão teria ido à falência. — Jaeboum levanta a cabeça, fechando os olhos. — Ainda imagino ela aqui, batendo palmas, acordando todo mundo, preparando camas, comida, consertando canos, indo atrás de ajudantes, fazendo propaganda na cidade. Parece que eu devo isso à ela, por ter feito minha infância um inferno, mas minha vida uma beleza. — E tomou outro gole do chocolate. — Seria tudo ao contrário se minha bisavó estivesse aqui.

Balancei a cabeça concordando. "Então, é por isso que tudo aqui cheira a gente idosa e biscoito de manteiga pronto de manhã." Pensei, sorrindo por dentro, imaginando um Jaeboum criança sendo todo santo dia acordado pela avó para recolher os ovos, ir na feira, correr para ir a escola, aprender como tecer, e no final, ser recompensado por uma caneca de chocolate quente, a sua única lembrança da bisavó que jamais chegou a conhecer.

— Eu devo muito à ela, porque mesmo em tempos difíceis, minha avó me fazia lembrar de acordar para a vida. Era uma situação como: "Você está se sentindo triste? Pois se sinta! Mas não se esqueça que não é o fim do mundo. Agora, vá trabalhar!" — Jaeboum riu baixinho de sua imitação. — Dá para perceber que ela não era uma pessoa tão simpática assim, mas pelo menos, era verdadeira. E também muito fiel às tradições e lembranças, pois sempre que podia, ela me mostrava fotos de nossos antepassados, me levava para comemorar festas de nossa religião, ia em encontros familiares, etc. De tão forte e marcante que ela era, até hoje sinto a sua presença.

— Você... Quer dizer, você sente a presença da sua avó?

Jaeboum encarou-me divertido, os olhinhos de gato brilhando para mim por contar partes de sua vida. Ali, me questiono por quanto tempo ele não tinha companhia, ou com que frequência ele recebia uma...

— Estão nas pequenas coisas, certo? A felicidade, e as lembranças. Tudo me lembra dela... E me fazem sentir que ainda estão aqui. Entende?

— Tudo nas pequenas coisas... — Sussurrei, piscando várias vezes. Um silêncio se instalou entre nós — mas um silêncio reconfortante — até o telefone da residência tocar forte no andar de baixo, e Jaeboum correr com extrema velocidade para atender. Passado alguns minutos, ele sobe, e largo meu chocolate ao pé da cama.

— Jinyoung, é para você.

─━⊱❉⊰━─

Eu tinha um anjo na minha vida, que havia conhecido há pouco tempo, morava à alguns quilômetros longe da pousada, trabalhava na delegacia, e era um completo medroso.

— Pode entrar, Wonpil. Os outros clientes estão dormindo. — Garanti, abrindo a porta para meu amigo e considerado agora meu novo anjo da guarda.

Wonpil largou a papelada que carregava em cima da minha cama, enxugando a testa com o braço esquerdo, e me encarando fixamente. Já pela luz em seus olhos, percebi que não era uma coisa boa vindo aí.

— Jinyoung, saiba que eu estou fazendo isso por você, e porque eu também acho todo esse esquema muito suspeito. — Wonpil explicou. — O que você me disse da sua história... Aquilo me tocou, e quando o delegado te expulsou, eu não me aguentei. Aliás, eu não aguento mais aquele lugar tóxico e nojento. Por isso, vim te ajudar. Todos esses papéis são os arquivos relacionado ao caso da morte do seu amigo. Tem testemunhas, documentos de investigação, a perícia do dia, etc. — Pegou uma das imensas pastas que tinha trazido, e abaixou a cabeça. — Se você quiser, lógico.

Em um verdadeiro impulso, me direcionei ao rapaz e o abracei fortemente. Um sentimento de puro agradecimento explodiu dentro de mim, meu coração saltava quase pela boca, e meus olhos lutavam para não marejarem. Wonpil tinha me trazido o impulso, a noção de viver, junto do chocolate quente da bisavó de Jaeboum. Minha jornada não estava perdida, ela apenas começava — e da maneira certa.

— Ãh, Jinyoung? Você está me sufocando. — Wonpil lembrou, e me afastei dele, com um sorriso de orelha a orelha em meu rosto. Não doía mais nada, e meu sangue fervilhava de prazer.

— Não querendo interromper, mas fiz mais chocolate quente. — Jaeboum adentrou o quarto, trazendo uma bandeja com duas canecas cheias de bebida, e de bônus alguns biscoitinhos caseiros. — Aqui, todo mundo é recebido com imenso carinho.

— Muito obrigado, senhor. Para confessar, estou morrendo de fome. — Wonpil agradece, indo atacar os biscoitos e o chocolate.

— Se precisar, me chamem. — Jaeboum sorri, fechando a porta do meu quarto.

Sozinhos, encaro Wonpil extremamente curioso, e impedindo que ele abocanhe seu quarto biscoito, o interrompo:

— Mas, Wonpil, como você conseguiu toda essa papelada? — Perguntei, analisando a pasta que Wonpil tinha segurado, e arregalando os olhos pela quantidade de informações escritas.

Wonpil respirou fundo, largando do seu biscoito.

— É porque essas não são as pastas oficiais. Você pode perceber como estão todas desorganizadas. Esses são os documentos imprimidos dos originais. Nunca fazem falta e podem ser facilmente pegos, desde que você saiba onde ficam guardados.

— Então, eu não corro o risco da polícia perceber que estou com a documentação do caso? — Questionei, e Wonpil negou.

— Pelo contrário. Você precisa analisar o quanto antes, Jinyoung, se não, eles podem desconfiar. A polícia sempre desconfia, é nosso dever. — Wonpil bebeu o chocolate pela primeira vez, fez uma expressão de imenso gosto, recuperou-se da dormência no sabor e me olhou sério. — Eles acham que eu peguei alguns documentos antigos só para estudar para outro caso, mas podem muito bem querer saber qual caso eu peguei e se é verdade esse caso. Não tem escapatória, praticamente.

— Mas já é o suficiente. Muito obrigado. — Agradeci, olhando para a quantidade de pastas na minha cama em uma mistura de desgosto e empolgação. Se eu precisava de um impulso, eu começaria aproveitando aquele.

why? ☆ got7Onde histórias criam vida. Descubra agora