capítulo dois

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— Faltava muito pouco. Havia ali, literalmente, apenas dois seres: a pistola e eu. Cabia a mim decidir o que fazer com ela. Se eu atirava na minha cabeça ou no meu peito. Se eu diria minhas últimas palavras, ou morresse em silêncio acompanhado da madrugada. Não tinha escolha de parar. Existia somente um caminho: a morte; mas tinha maneiras de eu executá-la concretamente. — As palavras voaram pela minha boca. Era um escape para contar absolutamente tudo sem deixar com que aqueles sentimentos amargos me invadissem de novo, eu começasse a chorar, e Jihyo não se convencesse, me mandando para a cadeia após ligar à polícia. — Foi quando eu ia pressionar o gatinho, acabei ouvindo um barulho, e desisti daquilo.

"Primeiro, olhei ao redor da onde estava, não enxergando ninguém. Então, quando olhei de novo para a arma em minha mão, ouve um repulso gigantesco dentro de mim em segurar aquilo, e atirei para longe. Fitei aquele objeto preto e brilhante na grama, parecendo que me encarava, aguardando que eu concretizasse. 'E aí, não vai terminar seu prazo?' Senti nojo de mim, e comecei a chorar.

"Continuei chorando e chorando, sem pensar em mais nada, só em meu deus eu ia puxar o gatilho aquilo iria me matar eu ia deixar fazer uma coisa dessas comigo me matar me matar santo deus eu ia me MATAR! E de novo, outro disparo, desta vez muito mais alto e parecido com..."

Jihyo se aproximou. Procurei pensar em uma comparação sensata, bem próxima e longe do que minha mente tinha imaginado naquela noite.

— ... Com alguém explodindo uma lata de tinta.

— Tiro? — Jihyo sugere.

É, eu não tinha imaginado.

— Tiro. — Assenti. — E dos grandes. Assustado, senti meu corpo todo tremer, e percebi que o barulho vinha de um dos condomínios próximos aonde Mark morava. Mesmo com medo da arma, peguei ela, e fui até a área de onde os barulhos vinham. Acabei esbarrando na parede do muro da mansão de Mark, e fiquei parado, apenas prestando atenção no que acontecia lá dentro — ou o que parecia estar acontecendo. Naquele instante, não estava pensando direito. Eu tinha acabado de quase cometer suicídio, não tinha uma cabeça muito dentro da consciência.

"Houveram gritos. Me arrepiei. Aí, terceiro estouro. Desta vez, o de porta sendo arrombada. Perto da floresta. Segui até lá, e corri feito louco. Os sons sumiam com se eu não os acompanhasse. Quando vi, estava não muito longe da mansão branca, mas ao mesmo tempo, bem escondido. Os sons se intensificaram. Era sons de passos, cochichos. Concentrado em encontrá-los, me assustei quando ouvi um som de arma. Fui atirar bem na direção, e tudo se calou.

"Fiquei alguns segundos parado esperando pelo pior, mas como ninguém apareceu, segui pela linha qual tinha atirado. Até me deparar com uma pequena clareira, bem mínima, e ali, deitado no chão, um corpo."

Limpei a garganta, procurando segurar o choro. Mas não adiantava. Aquela imagem em minha lembrança, de sonhos interrompidos e sorrisos encantadores, de alguém qual tinha depositado todo meu amor e esperança. Morto. Ele estava...

— Morto. — Respirei fundo, sendo o único som emitido pelo consultório inteiro. Aliás, não havia consultório mais. Não havia Jihyo para me ouvir, não havia uma vida lá fora me esperando e nem um confessionário, praticamente. Só eu e aquela imagem. Aquele rosto, apagado, como um rabisco cheio de potencial, mas esquecido. Todos os desejos e histórias tinham sido descartados. — Mark tinha uma abertura feita por uma bala na cabeça, os olhos estavam abertos, e ele não respirava. Eu tinha matado ele.

— Mas, como você saberia? — Jihyo argumentou. — A bala era a mesma...

— Demorei para chegar nessa conclusão. — Respondi, fitando-a. Agora, faltava bem pouco para a corda qual me segurava se arrebentar, e uma crise me atingir à qualquer instante. Se eu saísse da linha, era tarde demais. — Só depois do noticiário avisaram que era uma bala 45 ACP. A mesma que a minha. Decidido, eu me assustei. Ao invés de chorar feito louco como naquela noite, eu estava muito assustado. Tanto que não dormi a noite inteira, com medo de a polícia me pegar, ou de algo surgir, me culpando pela morte dele. Carreguei isso durante a vida toda. Quer dizer, até agora. — Suspirei. — Meu maior medo é de que eu jamais seja perdoado por ele novamente. Posso derreter no inferno, mas sem o perdão dele... E agora que ele está morto... — Uma lágrima escorreu pela minha bochecha, e Jihyo enxugou-a. Assim, começaram a virem milhares delas.

— Sh, sh, calma, Jinyoung. Tudo bem, você está seguro... — Jihyo me consolava, mas tudo o que eu fazia era me entregar ao choro. Um choro. Não era uma crise. Era apenas um choro. De tristeza, culpa, e saudades.

— Somente me lembro... — Funguei. — S-somente me lembro de ficar deitado do lado dele, fechar os olhos dele, e acompanhá-lo pela metade da noite. Perto de amanhecer, fui para casa e joguei minha roupa fora. Eu estava usando minha camiseta favorita na época. Depois, seguindo com o dia e as notícias, tentei agir como alguém que estava extremamente abalado, e não foi difícil. O tempo foi passando, minha vida se deixando, e após o Ensino Médio, me mudei para a capital depois que um amigo meu do colégio me recomendou Yugyeom. Estou aqui há três anos, quase nunca saio de casa, não tenho emprego e nem vida social. Minha vida acabou, Jihyo. Ela está morta, assim como ele.

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