O dia se transformou em noite. A chuva caía torrencialmente. Milla suspirou, seu hálito se transformou em uma mancha no vidro da janela do carro. Em outro momento, desenharia uma carinha sorridente, mas esse não era um desses momentos.
- Nervosa? -Andrew perguntou, observando-a com o canto dos olhos. Desde que saíram de casa, há três horas, ele não pronunciou mais que monossílabos. Milla já havia desistindo de manter um diálogo com o namorado. Ele estava mais abalado com a morte de Verônica do que queria demonstrar. Milla não entendia o porquê de homens, como Andrew, esconderem suas emoções, era compreensível que se sentisse triste, conhecia Verônica desde que eram crianças, anos depois se transformou na Senhora McCarter. Casou-se com o irmão mais velho de Andrew, Alec.
- Preocupada - respondeu com sinceridade.
- Eles vão te achar encantadora - ele respondeu sem demonstrar que realmente pensava assim. E isso deixou Milla ainda mais preocupada.
- Não é isso. Eu romantizei o meu encontro com a sua família, decorei as falas, ponderei o assunto. Mas nunca imaginei que ele se daria em um velório. Como elogiarei o vestido da sua mãe, o cabelo da sua irmã, o sorriso da sua cunhada... - nesse momento ela se calou. - Desculpa.
- A culpa é minha, eu fiquei protelando esse encontro e, agora , ele se dará no pior momento. - falou colocando sua mão sobre a dela. Milla não respondeu, ele tinha razão. Nos dois anos que compartilhavam o mesmo teto, mais de uma vez receberam convites para ir até a Casa McCarter. Natais, aniversários, as bodas dos pais. Em todas as ocasiões Andrew arrumava uma desculpa qualquer para não ir. E agora...
Milla voltou a suspirar, seus dedos passearam pelo vidro e a nuvem branca ganhou os contornos de uma carinha triste.
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O carro estacionou em frente a uma casa de três pisos, estilo vitoriano, Milla sabia que a família do noivo era rica, mesmo assim se impressionou com a imponência da construção.
Um mordomo veio recebê-los.
- Senhor McCarter, seja bem-vindo - disse polido, recolhendo o sobretudo de Andrew, quando foi pegar o casaco da moça, seu olhar se suavizou. E ela sorriu para ele.
- Onde estão todos? - A secura na voz do noivo fez Milla estremecer.
- O Senhor e Senhora McCarter estão na biblioteca. A Senhorita ,no quarto e seu irmão está na cidade resolvendo pessoalmente os detalhes. Posso pegar a bagagem no carro?
- Não trouxemos bagagem, não vamos ficar. Pretendo voltar ainda hoje.
- Sim, senhor. Vou comunicar a sua chegada.
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- Como assim não vai ficar, querido? - Elisa McCarter questionou depois de abraçar o filho e ouvir que partiria nas próximas horas.
- É melhor assim - Ele disse quando se afastaram. A senhora de cabelos grisalhos, presos num coque tinha os olhos vermelhos, mas não havia derramado uma lágrima. Milla permanecia à porta. Não se atreveu a entrar na sala com estantes que iam até o teto, cobrindo as paredes com livros.
- Ele tem razão, Elisa - a voz severa de George McCarter soou no recinto. Milla poderia jurar que os lustres estremeceram. Ele se aproximou do filho, apertaram a mão em um cumprimento formal.
- Quero apresentar minha noiva, Milla - Andrew disse para os pais olhando para Milla.
- A jornalista - Elisa McCarter comentou, se aproximando da garota de cabelos negros, presos em um rabo de cavalo. - Sinto nos conhecermos nesse momento tão triste para a nossa família. - Milla foi abraçada por uma estátua. Assim ela descreveria aquele gesto tão intimo que Elisa McCarter consegui deixar impessoal.