Por quê?

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Pov Zelena Mills.

E mais uma vez o dia nasceu carregado de melancolia, pelo menos para mim. É como se não houvesse um brilho no céu, um riso nos lábios de uma criança e a esperança dentro do meu coração. Eu sei que o correto seria buscar uma solução, mas é difícil enxergar a cura quando estamos envolvidos pela doença. Por mais que as coisas são os resultados das nossas ações, por mais que nós já sabíamos onde tudo iria parar, quando o destino traz o castigo não sabemos como superar. É como se eu tivesse entrado em um ringue sem saber lutar, sem proteção, sem conhecer as regras e mesmo assim estava sorrindo acreditando na vitória. Tolice a minha. A vida não bate, espanca. 

Eu sei que estou agindo errado, mas já faz um tempo que troquei o café por doses de uísque. Pelo menos desta forma não fico na dúvida entre açúcar ou adoçante, apenas tento entender do porquê estar bebendo para esquecer e seguir chorando por remoer o passado com uma intensidade ainda maior. Talvez às lágrimas existam para melhorar o sabor do álcool. Mais uma dose com gelo. Eu suspiro. Eu choro. Eu grito. Eu quebro alguns copos e me sirvo novamente. E ainda não são nem oito e trinta da manhã. As cortinas estão todas fechadas, assim como o meu eu que se trancou em algum canto escuro. 

O rádio ligado. A dor também está em modo on. O meu coração está apertado. Nada parece suprir essa angústia, nem mesmo a presença de Ruby que acabara de chegar. A morena de mechas vermelhas não disfarça a decepção ao me ver em um estado tão deprimente. Eu confesso que se ela não estivesse tão presente nos últimos dias Zelena Mills já teria se tornado apenas uma lembrança. Houve tantos momentos de desespero que nada mais parecia ter importância. É nessas horas em que o nosso maior anseio se torna matar a dor que nos mata... É nessas horas em que desistimos. 

Eu ofereço uma dose de bebida para a bela mulher a minha frente. Ela faz um gesto negativo com a cabeça e eu desabo em lágrimas. Não é agradável ser um alguém desprezível, mas pior que isso é ser um alguém desprezado. Às vezes nós fazemos coisas terríveis em nome das nossas verdades e pagamos o preço da nossa imperfeição. Enfim, Ruby se aproxima e me beija com ternura. O jeito que ela me protege é bom, mas não há nada capaz de suprir o vazio da perda de um filho. O melhor é evitar pensar em demasia. Eu decido me afastar e se sentar no sofá. 

Dizem que quem canta os males espanta, por isso, eu comecei a cantarolar a música: Porquê, do Murta. Uma bela letra para degustar da forma que estou fazendo. Uísque e gelo. Choro. O coração apertado. O medo. A ânsia. Vomitar era uma boa opção, quem sabe dessa maneira eu poderia me sentir aliviada?  Enfim, eu não gosto de ser assim, mas não consigo ver uma outra forma de agir. 

"O profundo sentimento de não saber para onde vai, é sentir um novo mundo enquanto o outro mundo cai. Cai a vida, a morte, a sorte abraça aquele que a procura, água mole e pedra dura tanto bate até que fura."

- Meu amor, não faz assim. Nem tudo vale a ressaca. - Ruby disse docemente e se sentou ao meu lado. - E ainda é tão cedo para se perder em sentimentos dolorosos. Me parte o coração vê-la assim e não conseguir fazer nada. 

- Você é um anjo. Eu amo você. Talvez você pense que só estou dizendo isso por ter bebido, mas eu a amo. Obrigada por estar ao meu lado. Se não fosse você... Ah, meu amor, eu já teria desistido. - Eu disse. Eu segurei em suas mãos e a olhei com ternura, com doçura. - São tantas coisas que se passam na minha cabeça... Tantas outras no meu coração... Mas muito obrigada por tudo. 

- Eu não sei o que você tem de tão especial, mas eu amo você, minha ruiva. E eu prometo que ficará tudo bem. As coisas vão se resolver. - Ruby tirou o copo da minha mão e colocou na mesa de centro. - Mas que tal tomar um banho e descansar um pouco? Eu posso apostar que virou a noite bebendo. - Apenas aceno positivamente e permito ser ajudada por quem tanto me quer bem. 

Ela foi delicada em seus gestos. Me fez carinho. Me abraçou quando foi preciso. Segurou o meu cabelo enquanto eu vomitava. Me ajudou a se manter em pé. O seu olhar intenso era um bom remédio para a alma. Eu me perco em seus detalhes. Eu não sei quando, nem como, nem o porque, mas eu me apaixonei por ela. Enfim, a campainha tocou. Eu coloquei um short jeans e uma camisa qualquer e fui para o meu quarto. Ruby foi atender a porta. A bela mulher já havia se tornado de casa... 

O meu corpo reagiu ao escutar aquela voz. O meu coração estava acelerado. Talvez fosse apenas um delírio ou eu tenha confundido. Eu senti as minhas mãos ficarem geladas, a minha boca secar e a minha cabeça girar. 

- Eu não sei se é uma boa hora para vê-la. Tem sido dias difíceis. E talvez você não goste do que vai encontrar. Ela é humana e caiu de um jeito... enfim, o que posso dizer é que tu não vai se deparar com uma super-mulher que reagiu da melhor forma possível ao seu distanciamento. - Eu escuto Ruby comentar. 

- Eu imagino. Mas de qualquer forma eu acho que preciso vê-la. 

- Regina, ela não precisa de dúvidas. Se for para entrar que seja para resolver, não para piorar. - Ruby era firme em seu tom de voz. 

Logo eu tive que encarar a vida e os meus medos. É difícil encarar quem tanto machucamos sem ter tido a intenção. Regina estava linda, como sempre, mas o seu olhar não brilhava como antes. Ela se aproximou e o meu coração pareceu errar uma batida. Os seus lábios se abriram várias vezes mas as palavras não saíram. Talvez a minha filha estivesse perdida, idem a mim. Eu suspirei. Eu respirei fundo. Ela engoliu em seco, fechou olhos, mordeu o lábio inferior, mexeu os dedos de forma ansiosa e só depois teve coragem para dar mais um passo, ficando apenas um palmo de distância. 

"Ruptura da linha fina que liga a minha razão... E o coração já não bate como batia e essa batida abraça a vida como se a ferida não fosse sarar. Te perguntei o porque, te olhei nos olhos, porque tinha de ser? Éramos só nós dois e eu queria saber... Porque?"

- E-eu sinto saudades! - Eu disse com a voz falha. 

- Por quê fez isso comigo? Por que tem que ser assim? E você bebeu? Não são nem nove horas da manhã. - Ela perguntou. O seu tom de voz não estava muito diferente do meu... Não havia nada mais além de receios. 

- A bebida tem sido uma grande amiga, mas isso não vem ao caso... Eu te amo, minha filha. E espero que um dia você possa vir a me perdoar. 

"Agora não importa aquilo que tu quer, ninguém mais vai dar aquilo que tu deste... Mas honestidade é um valor e você não passou no teste. Eu já não estou em suas mãos, mas preciso de uma explicação... Perguntei-te o porquê? Te olhei nos olhos porque tinha que ser, éramos só nós e eu queria saber, por que? Mas tu não quer dizer... Quem cala consente, é porque está a esconder... Para ser sincero não estou a perceber... Perguntei-te o porquê..."

- É tudo muito complicado, mas nada é capaz de destruir o amor que eu tenho por você, mãe. - Ela disse e me abraçou. Foram tantas emoções que eu não saberia dizer exatamente o que estava sentindo.


A namorada do meu primoOnde histórias criam vida. Descubra agora