[Lucca Zarmora]
Assim que nos rearranjamos em nossas posições, o juiz ajustou seu relógio e apitou a retomada para o segundo tempo. O ânimo dentro de campo não era muito amistoso, a equipe adversaria, com dois gols à frente - os dois sendo marcados minutos antes do primeiro tempo acabar - se sentia confiante e com certeza ficaria na retranca, pouco atacando e evitando o risco de um contra-ataque surpresa. Nós, por outro lado, entre precisar criar jogadas para diminuir a diferença em meio a defesa acirrada, ainda estávamos apreensivos e desesperados em busca de um resultado satisfatório pra torcida que nos acompanhava com gritos e cantos de incentivo.
Precisávamos pelo menos empatar, sabíamos disso.
Um time como o Real Madrid não podia se dar ao luxo de sofrer dois gols por descuido e, assim, perder pontos dentro de casa naquela etapa da competição. Os pontos eram corridos, a parte de cima da tabela estava sendo disputada rodada a rodada, aquele não era o momento de dar bobeira.
As instruções do técnico no intervalo foram claras: priorizar o ataque. E isso, particularmente, era comigo. Era o que eu sabia fazer, e, fazia bem diga-se de passagem. Me movimentei pela grande área - esperando que o armador conseguisse passar pelo zagueiro - e sempre com um marcador na minha cola, mas vi inutilmente a bola passar pela linha de fundo com o desvio feito pelo adversário.
Escanteio.
Me posicionei na extrema esquerda, próximo da segunda trave e esperei que o lançamento fosse feito. Confusão dentro da área, eu odiava aquilo, não importava os anos que passavam ou se eu jogava desde criança, eu sempre odiaria aquilo. Após a nova autorização do arbitro e o lançamento do cobrador, eu subi o máximo que eu conseguia, mesmo tendo a certeza de que algo - ou alguém - me puxava pra baixo. Tudo acontece em câmera lenta nesse momento, mas, ao contrário do que se possa parecer, não é nos dado tempo para tentativas e erros. E eu soube que havia perdido a minha chance assim que consegui cabecear a bola e ela viajou em direção ao gol.
Observei goleiro também subir e espalmar com técnica e certa facilidade, deixando o rebote nos pés do Raul que estava melhor posicionado. Ele não teve que pensar muito, seu marcador também havia dado bobeira, o caminho estava livre para ele ajustar a bola a bater de três dedos, dessa vez sem chances pro goleiro.
Não houve o que comemorar, diminuímos a diferença, mas ainda estávamos atrás e o tempo não parava de passar. Por isso, a bola foi devolvida rapidamente ao centro do campo e a partida reiniciou.
O ânimo mudou completamente depois de marcamos, como se uma faísca de esperança caísse sobre nós. Leo, nosso goleiro, conseguiu segurar bem as tentativas de chute a gol que a outra equipe fazia e no contra-ataque nós conseguíamos criar situações de perigo.
Em uma delas, depois de um arremesso feito no campo de defesa, a bola foi parar nos meus pés quase como se ela fosse feita para estar ali, e naquele momento, eu realmente achava que sim. Meu cão de guarda deu bobeira, eu driblei e passei por ele antes que ele pudesse me parar. O contra-ataque foi mais rápido do que todos podiam imaginar, a bola era leve e eu bom e habilidoso com ela nos pés, a grama deslizava sob sua forma e em poucos segundos eu consegui atravessar metade do campo. O suor escorria pela minha testa, era quente, tenso e eu mal conseguia ouvir o barulho da torcida agora. A poucos metros de mim, o goleiro se preparava para defender seu objetivo, mas nem ele era capaz de me parar agora.
É o que eu sei fazer. Então eu faço.
Com um passo rápido, eu fiz que ia para a esquerda, tirando ele completamente do meu caminho, e segui pela direita, dando um chute fraco, porem preciso em direção as redes.
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Jogo Perigoso
RomanceO meio futebolístico é machista, muitas vezes racista e frequentemente homofóbico. Anualmente são feitas diversas campanhas sobre conscientização com uma mensagem forte e bem montada pra atrair os olhares da mídia, mas aquilo tudo é uma grande menti...