⁰² || Um estranho conhecido

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      Abri os olhos assustada pelo rugido ensurdecedor do temporal que parecia anunciar o fim dos tempos

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      Abri os olhos assustada pelo rugido ensurdecedor do temporal que parecia anunciar o fim dos tempos. O céu desabava sobre a terra, e os relâmpagos cortavam a escuridão, iluminando meu quarto de maneira intermitente, enquanto sombras dançavam inquietas pelas paredes. Olhei ao redor, percebendo que a noite já havia caído. Sem querer, havia cochilado profundamente. Não era minha intenção adormecer, mas o filme tedioso que eu assistia acabou me arrastando para um sono involuntário.

    Suspirei, frustrada comigo mesma, e fechei a aba do navegador. Meus dedos trêmulos procuraram o relógio no canto da tela: 22h50. Se minha mãe não tivesse entrado para me acordar, era bem provável que estivesse na cozinha preparando aquele jantar especial de toda segunda-feira.

    Essa era nossa rotina: às segundas, ela cozinhava, aproveitando o tempo extra por sair mais cedo do trabalho. Durante o resto da semana, a cozinha ficava sob minha responsabilidade, já que minha irmã — com as melhores intenções do mundo — parecia sempre estar à beira de envenenar a família com suas tentativas desastrosas de cozinhar. Mas naquela noite, algo estava diferente. Quando abri a porta do quarto, esperando ser recebida pelo aroma familiar de comida na panela, fui surpreendida por um silêncio incomum. Em vez disso, a casa parecia envolta em uma quietude quase palpável, quebrada apenas pelo som da chuva lá fora. O cheiro suave de lavanda e eucalipto pairava no ar, misturado ao aroma fresco e úmido da terra molhada.

    Vesti um agasalho grosso para me proteger do frio que parecia ter se intensificado repentinamente e caminhei até a cozinha. Para minha surpresa, ela estava completamente vazia. A ausência de movimento e o eco do meu respirar na sala vazia só serviram para aumentar a sensação de algo estranho naquela noite.

  — Mãe?! — Minha voz ecoou pelos corredores vazios, um som que pareceu desaparecer na vastidão silenciosa da casa.

    Subi novamente as escadas, um desconforto crescente no peito, e entrei no quarto dela. Talvez estivesse deitada, cansada demais para me acordar. Ela vinha reclamando de dores de cabeça e nas costas durante todo o mês, afinal. Mas, ao abrir a porta, encontrei a cama perfeitamente arrumada, exatamente como ela havia deixado pela manhã.

    Não era do feitio dela sair sem deixar um aviso, mesmo que fosse algo de última hora. Minha mãe era meticulosa quanto a isso; fazia questão de ligar, nem que precisasse pedir o celular emprestado a um colega de trabalho, já que frequentemente esquecia o carregador. Porém, não havia registro de mensagens, chamadas ou qualquer sinal dela. Era como se tivesse desaparecido sem deixar rastros.

    Um trovão cortou o céu, uma explosão que reverberou pelas paredes da casa, fazendo-me saltar de susto. O clarão que o acompanhou foi tão intenso que, por um instante, cegou-me. Instintivamente, pressionei os olhos com as mãos enquanto a luz continuava a piscar em intervalos frenéticos. Quando finalmente abri os olhos, percebi que a energia havia caído.

— Ótimo!

    Resmunguei, frustrada. Ainda com as mãos trêmulas, desci até a cozinha, tateando pelos armários em busca de algo que pudesse iluminar o ambiente. Encontrei uma vela esquecida no fundo de uma gaveta e, depois de revirar uma caixinha quase vazia, achei o último palito de fósforo. Acendi a vela e tentei fixá-la no balcão. Antes que conseguisse, o silêncio da casa foi rompido por batidas fortes e apressadas na porta. O susto fez minha mão escorregar, e a vela caiu no chão, rolando para longe enquanto meu coração disparava.

  — Mas que droga! — murmurei entre dentes.

    Emily, pensei, sem dúvida havia esquecido a chave outra vez. Era um hábito recorrente da minha irmã, que, em vez de chamar como qualquer pessoa normal, preferia importunar.

  — Por que você simplesmente não lembra de levar sua droga de chave?! — bradei, furiosa, enquanto agarrava a maçaneta e puxava a porta com força.

Mas, para minha surpresa, não era Emily do outro lado. Em vez dela, encontrei dois policiais, as fardas encharcadas pela chuva, e o clarão incessante de um giroflex piscando contra meus olhos.

MEᑌ ᗪOᑕE CᗩTIᐯEIᖇOOnde histórias criam vida. Descubra agora