XII - Realidade sombria

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Lunar:

— Com quantos ataques se imobiliza uma sombra?

— Dependendo do nível em que ela se encontra, com três feixes luminosos conseguimos imobilizá-las.

— Até onde se estende os poderes da lua durante o dia?

— Reduz 80% devido ao sol, mas com a magia das estrelas eu consigo me fortificar 65% durante o dia.

— Uma sombra tem poderes reduzidos?

— Durante o dia e a noite, tanto um quanto outro pode ser a fraqueza delas.

— Acho que você está pronta, já pode começar com pequenas magias.

— Obrigada, Stel — agradeço realmente contente, já estava a duas horas fazendo essa prova oral com ela para ver como os meus conhecimentos estão.

— Muita cautela e responsabilidade, você está no mundo dos humanos como uma deusa muito poderosa, todo cuidado é pouco.

— Sim — confirmo e vejo minha amiga me procurando com uma mochila nas costas — SAMMY — grito e ela vem sorrindo até a gente.

— Vamos? Sua mãe já está quase me prendendo por sequestro.

— Estou tão aflita, não sei como agir com a minha família humana agora.

— Naturalmente, agora vamos — com nossos braços entrelaçados, nos despedimos de Stel e abrimos um portal para uma área no fundo da minha casa onde ninguém nunca frequenta.

Eu tinha a sensação de ter ficado um ano fora de casa e tenho certeza que a minha mãe também.

Sei que não posso mais continuar vivendo como humana, mas também não estou pronta para deixar tudo isso para trás. Minha mãe, minha avó e até o meu pai. Eles ainda são a minha família, mesmo com as adversidades.

Quem nunca discutiu com a mãe? Ou quem nunca se magoou com o abandono do pai?

— Você acha que a minha mãe sabe que eu não sou normal? Digo, já peguei algumas conversas dela com o meu pai que agora me parecem bem suspeitas.

— Talvez você já tenha feito algo fora do normal sem ter consciência, acontece mais vezes do que você imagina.

— Do que está falando?

— No dia em que te vi pela primeira vez, seus olhos brilharam quando peguei sua mão, foi um brilho tão intenso que até o seu pai disfarçou.

É, o meu pai é bom nisso, disfarçar.

Consigo me lembrar de diversos momentos em que ele disfarçava a curiosidade sobre mim quando ele conversava com a minha mãe. Eu preciso conversar com ele para entender melhor.

— Teve uma vez na escola que você brigou com um garoto, na oitava série você se lembra? Tive que fazer um feitiço de contenção em você senão o garoto ia estar morto há muitos anos hoje em dia. E eu só consegui te conter porque você não sabia quem era, foi muito insano.

Eu lembro do Isaac, era um garoto muito chato que me perturbou até o ensino médio e depois que nos formamos eu nunca mais ouvi falar dele.

Quanto mais íamos nos aproximando, mais conseguíamos ouvir a voz do Chuck Berry pelo antigo rádio do vovô. Só de pensar na vovó o meu peito enche de amor, agora seria uma das horas em que ela estaria tomando café e eu contando histórias para vê-la feliz.

— Bate — falo com Sammy assim que chegamos na porta.

Uma dor de barriga começou a me atingir e eu sentia como se fosse… Deixa pra lá.

— Eu não, bate você.

— Você que falou com ela que estamos chegando.

— Mas a casa é sua.

— Oi meninas — minha mãe abriu a porta de uma vez e nos encarou bem séria, o medo que eu senti foi real — Lembrou que tem casa, Selena.

—  Oi mamãe, tudo bem com a senhora? Quanto tempo, não?

— Descarada — juro que pensei que ela estava brava, mas assim que senti seus braços me envolver em um abraço caloroso, consegui tirar todo o peso dos meus ombros.

— Nervosa por quê? Matou alguém?

— Eu tô tranquila, bem tranquila — como ela faz isso? Digo, saber o que eu sinto mesmo com os esforços que faço para disfarçar — Essa é a Sammy.

— A gente já se conhece — Sammy sussurra entredentes e eu dou um sorriso sem graça, eu só quero mudar o foco da minha mãe de mim — Como vai, tia Let?

— Bem, você sumiu hein menina? Entra aí que fiz aquele bolo de amora quentinho que vocês gostam, acabei de tirar do forno.

Esperei Sammy entrar e fui logo atrás, confesso que estava com medo de chegar e não me sentir mais em casa. Mas com esse carinho que a minha mãe transmite, fica impossível não ficar a vontade.

— Bom que Selena me ajuda com a avó dela, agora cismou que a neta não é mais da Terra, vocês acreditam? Fica falando que Selena agora pertence a outro plano, sua avó acha que você é a lua minha filha, tenha paciência.

Sammy e eu nos encaramos aflitas, não é possível que a minha avó saiba dessas coisas. Ou pode até ser que seja, porém devido ao alzheimer acredito que ninguém irá dar tanto crédito.

O cheiro do bolo de amora estava por toda parte, Sammy foi direto para a cozinha com a minha mãe, enquanto fui até o quarto da vovó.

Só vendo minha velhinha sentada na cama, escutando o seu tão admirado Chuck Berry e com sua boneca no colo, que eu vi o quanto senti falta de casa.

Essas humanas que fizeram a minha estadia na Terra a melhor possível, eu nunca vou as abandonar, independente do que o destino me reserva.

— Oi vovó — me abaixo para dar um beijo na bochecha da senhorinha que eu tanto amo, mas me afasto quando vejo seus olhos ficando completamente negros, seu rosto fica da cor cinza e ela dá um sorriso macabro para mim.

— Oi minha netinha.

Não pode ser.

Astros: Lua MinguanteOnde histórias criam vida. Descubra agora