Estava descendo a rua da minha casa e vi um rapaz encostado em um muro, olhando atentamente o córrego Biriguizinho.
— Olha só! Uma tartaruga! — ele disse para mim, parecendo ter sido tomado por um espanto aristotélico.
Parei para observar também. A cabeça da tartaruga estava na superfície da água, enquanto seu corpo estava mergulhado no córrego. Ela se refrescava de um calor daqueles de rachar mamona.
Porém, a água era de um tom verde escuro e dela emanava um odor podre. Sacolas plásticas, marmitas de isopor e garrafas pets boiavam ao redor do animal.
Volta e meia eu vejo as tartarugas no Biriguizinho, geralmente, tomando um banho de sol em cima de algum bloco de concreto, que desabou das paredes da canalização.
Esses bichos vivem muito. Alguns mais de cem anos. As tartarugas provavelmente devem ser as mesmas que eu e meus amigos víamos no córrego quando éramos crianças, só que em outra parte da cidade, no bairro São Brás.— Ela estar aí é sinal de que a água não está contaminada — comentou o rapaz.
— Impossível — eu disse. É essa tartaruga que é uma guerreira por conseguir sobreviver em meio a essa sujeira.
Nós dois passamos a caminhar.— É perigoso ela ficar ali e alguém querer matá-la — disse o rapaz.
Pensei que ele iria continuar a caminhar ao meu lado conversando, mas, de repente, apertou o passo, virou a esquina e sumiu.
Ele estava certo naquele ponto. Na época em que ficávamos observando as tartarugas no São Brás, sempre aparecia algum moleque idiota que jogava pedras nelas.
Se outro dia elogiei a bravura do ser humano que luta contra as forças da natureza para sobreviver, nesta crônica sou obrigado a reconhecer a bravura da natureza contra as forças da estupidez humana.***
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Crônicas
RandomCrônicas do escritor e jornalista Ronaldo Ruiz Galdino sobre as coisas do cotidiano, que parecem ser banais à primeira vista, mas que guardam grandes tesouros quando buscamos observá-las com mais cuidado. Toda semana uma crônica nova.