Gregório

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    Depois que Candinha saiu, me levantei e pensei. Andei de um lado pro outro e resolvi que seria eu mesmo. Saí do quarto e fui na direção do dela.
    Quando fui bater na porta, meu punho parou no ar. Baixei a cabeça e respirei fundo, mentalizando para ficar calmo. Finalmente bati. Ouvi sua voz fraca e entrei.
    Ela me olhou e arrumou o cabelo pro lado, fazendo uma careta de dor. Encostei a porta e fiquei do lado do tapete que ficava no meio do quarto. Abri a boca mas não consegui falar, e comecei a ficar nervoso. Ela abriu espaço do seu lado e deu umas batidinhas, me chamando para sentar. Sentei e me virei na sua direção.
    - Oi.
    - Oi. Quer falar algo?
    - Sim, quero sim.
      Ela me olhou, encorajando a continuar.
    - Eu... Eu estou...
      Engasguei no meio da frase e sorri de nervoso.
    - Desculpa.
      Baixei a cabeça e respirei fundo. Ela pegou uma das minhas mãos e levantou meu rosto.
    - Tá tudo bem, pode falar.
    - Desde quando você chegou, pude ter a experiência de conviver com algo novo. No morro em maioria são homens e as poucas mulheres não são tão confiáveis e...
    - Eu entendi...
    - Pude ter experiências profundas com você aqui. Nunca senti nada disso antes, de querer cuidar e estar sempre perto de alguém. Exceto Candinha, mas mesmo assim, eu nunca senti tanto. E com você, comecei a ter contato diário, pude ver que mudei de alguma forma.
      Parei, e vi que ela me ouvia com atenção. Quando fui começar novamente, ela tocou meu rosto e meu corpo todo se arrepiou. Fechei os olhos e pressionei sua mão contra meu ombro. Senti ela me tocar novamente, dessa vez no pescoço. Tocou minha tatuagem ali, sussurrando.
    - Uma rosa. Ela é linda.
    - Obrigado. Representa minha mãe.
    - Eu imaginei.
      Ela se aproximou e tirou a mão do meu rosto, me fazendo abrir os olhos.
    - Continue.
      A encarei, e minha mente gritava. Tive vontade de apertar seu corpo contra o meu num abraço apertado, mas não tive reação.
    - Eu mudei. Pude passar a organização do morro pra um amigo confiável, estou mais em casa, ajudo mais Candinha. Quando você sumiu, eu rodei tudo pra te encontrar. Fiz de tudo. Fui pra todo canto, e a encontrei num dos lugares mais improváveis. E quando te vi, quando tive certeza de que podia te tirar dali, eu tive forças. Fiquei feliz. E agora está aqui...
    Toquei seu rosto de leve, com medo de que ela pudesse assustar.
    - Raquel, eu...
      Seus olhos estavam fixos em mim, esperando. E então, deixei que saísse.
    - Eu estou apaixonado por você.

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Blue Hill (Morro Azul)Onde histórias criam vida. Descubra agora