Navegando por mares nunca dantes navegados.

31 3 0
                                    

Meu celular vibra e olho rapidamente esperando ser algo da minha mãe, mas não é, seu sumiço está mais do que estranho. É de Esther.
"Não precisa enfrentar o clima chato com o senhor Miguel agora, saímos e eu dou um jeito nisso. Tem dinheiro para pizza no balcão, se cuidem vocês três."
Sua mensagem acalma meu coração, no fundo tenho medo de que as coisas fiquem mais estranhas do que já estavam entre mim e meu pai, já estávamos fazendo algum progresso e não queria estragar tudo.
"Eles já saíram, não voltam tão cedo." Eu digo olhando para Pedro e esfregando meu nariz no dele de forma carinhosa.
"Porque você está esfregando seu nariz em mim?" Ele diz fazendo careta e rindo, e eu rio mais.
"Minha mãe fazia isso comigo quando eu era pequena, era seu jeito de demonstrar carinho." Olho para baixo.
"Bom, se você gosta, eu também gosto." Ele beija a ponta do meu nariz.
"Ei, está tudo ok?" Ele coloca meu cabelo atrás da orelha como sempre faz.
"Sim, é só que nos últimos dias minha mãe não deu sinal de vida e mesmo sabendo que fiquei doente também não ligou, eu não ligaria se ela não fosse tão possessiva por saber o que acontece a todo minuto, acho que está acontecendo alguma coisa." Ele desvia o olhar.
"Relaxa, não deve ser nada." Ele ainda evita meus olhos.
"Vem, vamos fazer algo já que a casa é toda nossa." Ele diz mudando de assunto.
"Eu ainda tenho um irmão postiço, você se lembra?" Ele pega minha mão e me leva para fora do quarto.
"Um irmão postiço que saiu e não volta tão cedo, então sim, a casa é toda nossa." Ele me olha e pisca, e me derreto pela centésima vez.
"E o que você planeja fazer, hein?" Já passa das quatro da tarde e os cafés estão quase fechando, então não tenho muitas opções em que pensar.
"Vamos fazer coisas clichês de casais." Ele ri. Estamos na cozinha e ele está com uma panela na mão, coisa que nunca vi e não sei se estou preparada para ver. Mas eu rio, somos tudo menos clichês.
"Você sabe que não somos nada clichês, não é?" Eu digo rindo, porque não somos mesmo.
"Não mesmo, por isso vou tentar ser um bom namorado hoje." E eu congelo. Ele disse a palavra, a palavra da qual sempre tive medo mas nas últimas semanas pensei muito sobre. Namorado foi o que ele disse. Não questiono sobre, não quero impor nem cobrar nada, mas sinto um gelo na barriga, daqueles que nos deixa sem ar.
"E o que você pretende fazer com essa panela na mão?" Digo sentando em cima do balcão da cozinha, estamos sozinhos, então me sinto à vontade.
"Existe coisa mais clichê do que fazer brigadeiro e assistir filme?" Ele levanta a sobrancelha e ri, amo seu jeito descontraído, me faz esquecer do mundo e de todos os problemas, e apenas querê-lo.
"Então quer dizer que a versão de Bentinho sabe cozinhar?" Nos livros há uma relação de amor e ódio com Bentinho, há momentos que é impossível não ama-lo, e há momentos que é muito difícil não querer odiá-lo, mas é do Bentinho jovem que eu falo, o que eu gosto de associar à Pedro, aquele que sente gelo na barriga ao ver Capitu, aquele que fica doente ao se distanciar dela, mas o que eu mais temo é a transformação do Bentinho jovem para o adulto Bento Santiago, um casmurro, insensível e frio, tenho medo de acabar desolada como Capitu. Os livros me ensinam muito sobre o amor, mas também me confundem, me deixam medrosa de ter o mesmo final que alguns personagens tiveram.
"Bom, se eu fosse você não me subestimaria, sou capaz de fazer muitas coisas das quais você nem imagina." Ele se aproxima de mim com o dedo sujo de leite condensado, estou imóvel no balcão, é incrível como apenas com suas palavras ele é capaz de me afetar. Ele aproxima seus dedos da minha boca e toca meus lábios, eu os abro e ele coloca dentro da minha boca, eu chupo desejando que não estivéssemos no balcão da cozinha e com brigadeiro no fogo.
"Você também é capaz de muitas coisas, Sarah, só precisa de um incentivo." Ele lambe os dedos e se afasta, não preciso de outro incentivo, ele é o que me motiva.
"Onde você aprendeu fazer brigadeiro?" Eu estou sentada olhando ele fazer um brigadeiro, é a visão do paraíso.
"Minha mãe fazia quase todos os finais de semana para mim antes de eu dormir, eu gostava de comer e assistir desenho, mas depois que meu pai morreu tive que me virar sozinho." Ele diz desligando o fogo e colocando o brigadeiro em um prato.
"Aah, entendi." Não sei muito bem o que dizer quando ele fala do seu pai, o meu me abandonou mas está aqui agora, mesmo que em um clima estranho, o dele não.
"Vem, vamos escolher um filme bem clichê, desses que vocês meninas amam."
"O que?" Eu digo mas não sou capaz de terminar, ele me pega no colo e me leva em direção à sala.
"O que você está fazendo?" Rio. Sou jogada no sofá e minha barriga dói de tanto rir.
"Qual é o filme clichê de hoje?"
"Para sua informação, eu gosto de filmes românticos e clichês mas isso não significa que todas as garotas gostem. Não precisa padronizar as mulheres dessa forma." Faço careta.
"Se tem alguém aqui que padroniza tudo é você com sua cisma por garotos, você já nos odeia antes de nos conhecer."
"O que? Centenas de anos de patriarcado é cisma?" Estou rindo, mas ele sabe que a conversa é seria. E eu sei também que ele ouviu todas as minhas conversas com Mari e Liz sobre homens.
"As paredes dessa casa são finas, Sarah, e você fala alto demais." Ele escutou minhas conversas e provavelmente tudo o que eu falei dele. Enrubesço.
"Eu não tenho privacidade não?" Digo cheia de sarcasmo, porque na verdade também não dei muita privacidade à ele.
"Homens sendo homens" Ele diz com voz fina me imitando. Eu realmente só digo isso.
"Ha-Ha-Ha" Eu reviro os olhos.
Ele está passando os filmes para escolher um. E para em Harry Potter.
"Você gosta desse?" Ele pergunta com indiferença.
"Tá brincando? Eu amo Harry Potter."
"Sério?" Ele pergunta franzindo o cenho. Como assim "sério?" Eu achei que fosse de consenso mundial que Harry Potter é a melhor saga de todas.
"E você não ama?" Eu realmente não entendo como é possível haver um ser humano que não goste dessa saga.
"Eu nunca assisti tudo para falar a verdade, assisti até ser só magia e tal, mas depois começa o romance e estraga tudo."
"Você está brincando, não é?"
"É verdade, não precisava colocar romance nenhum, teria ficado muito melhor." Ele dá de ombros. Estou chocada.
"Você tinha que ter algum defeito."
"Defeito? Qual?"
"Não gostar da melhor saga desse mundo."
Ele está rindo de mim agora.
"Não disse nada disso, só citei alguns defeitos."
"Cala a boca que agora nós vamos assistir todos de onde você parou." Rio pegando o controle de sua mão.
"Você vai me obrigar a fazer isso, não é?" Ele diz fazendo cara de choro.
"Pode apostar que eu vou." Pisco para ele e dou play no filme, é a noite perfeita, está tudo perfeito.
Deito em seu peito e assistimos aos três últimos filmes, comemos todo o brigadeiro e ainda fizemos pipoca, e para variar, no final eu estou chorando. É a melhor saga do mundo e eu não supero o término, não importa quantas vezes eu assista, choro sempre. Olho para ele e está vidrado na TV, amo o seu esforço para me ver feliz.
"Agora sim você pode formular uma opinião sobre a saga." Eu digo levantando de seu peito e ficando por cima.
"Eu mantenho a mesma opinião, mas se for para ver você com esse sorriso no rosto, eu assistiria tudo de novo." Ele sorri genuinamente, meu coração bate mais forte todas as vezes que ele sorri e seus olhos ficam oblíquos, ele preenche meu coração, e não quero passar um segundo dos meus dias longe dele.
"Por que você me observa tanto?" Ele questiona erguendo sua linda sobrancelha.
"Não sei, gosto de ficar te olhando e de pensar em como as coisas em minha vida mudaram." Dou de ombros.
"Mudaram para melhor ou pior?" Ele pergunta, mas esse questionamento eu já me fiz centenas de vezes.
"Não sei dizer, só sei que independente de tudo, eu gosto de quem sou agora, gosto de você e de nós juntos."
Ele abre um sorriso todo bobo.
"Nós? Você disse nós?"
"Sim, gosto de você e quero estar com você, Pedro. Só tenho medo de que seja bom demais para ser verdade, você era todo grosso e fechado e agora está totalmente diferente." Eu desabafo, é o que eu sinto, estou loucamente apaixonada por ele, mas tenho medo de que ele me machuque no final, é tudo muito novo para mim.
"Eu também tenho medo de que isso seja bom demais, você é boa demais para mim." Ele abaixa a cabeça e para de olhar em meus olhos, meu corpo sente a falta de troca de olhares.
"Eu não disse que estou nesse barco com você? Só me ajude a navegar que o barco não afunda, ok?" Estou sorrindo agora, se eu tinha algum psicológico, foi embora quando ele abriu esse sorriso pela primeira vez.
"Vamos navegar juntos, eu te prometo. Sempre juntos." Ele enterra a mão em meu cabelo e eu me aproximo de seus lábios, quero ele todo para mim.
Nossos lábios se tocam e nos beijamos com intensidade e muita vontade, é um beijo envolto de amor e carinho, não tem lugar nenhum no mundo que eu desejasse estar do que aqui e agora, em sua companhia.
Nosso beijo fica mais intenso e eu faço fricção para que que a pressão entre nós seja mais forte, estou por cima, e me sinto no controle agora. Mas é ilusão minha, ele é quem controla meu corpo, meus hormônios são movidos por ele, ele me tem.
Coloco minhas mãos em seu peito e o beijo com prazer, desço as mãos até a barra de sua camiseta e ergo para que ele tire, deixando seu tanquinho dos Deuses à mostra, eu me derreto duas vezes só nesse momento. Olho fixamente em seus olhos, eles me conduzem como o mar conduz uma embarcação.
"Então você quer ficar por cima agora?" Ele pergunta sorrindo e me sinto envergonhada, nunca fiz nada parecido antes, mas quero fazer tudo o que puder com ele.
"Bom, posso fazer muitas coisas se você me ensinar." Sei que estou toda vermelha.
"Quem é você e o que fez com a Sarah que morria de vergonha só de me olhar?" Ele ri colocando as mãos sobre minha coxa.
"Bom, já que você não quer nada disso, então tudo bem." Sei que isso vai provoca-lo e amo isso.
"É claro que quero meu bem, tem uma lista de coisas das quais eu adoraria fazer com você. Mas antes quero fazer outra coisa." Ele sorri de canto.
"O que?" Eu não tenho ideia do que ele quer fazer comigo agora, mas seja lá o que for, permito que ele me conduza.
"Você confia em mim?" Ele me olha nos olhos agora.
"Sim." Eu respondo imediatamente porque confio nele meu corpo e minha sanidade. Não sei se deveria, mas confio.
"Então vem comigo." Ele me tira de cima dele com delicadeza e pega minha mão me guiando para o andar de cima, seja lá pra onde vamos ou o que iremos fazer, ele me possui.
Chegamos ao andar de cima e estamos no quarto do meu pai. É claro, a banheira.
"Quero fazer isso com você desde que te vi sair daqui aquele dia, você nem imagina as coisas que passaram pela minha cabeça." Há semanas atrás eu me sentiria envergonhada por ouvir ele falando esse tipo de coisa, mas agora eu amo e desejo que ele fale mais e mais.
"Toma um banho comigo nessa banheira?" Ele me olha com seu sorriso encantador.
"Tomo." Repondo decidida.
"Sério?" Ele está espantado, eu também estaria há algum tempo, mas não mais.
"Sim, eu estive uma vez com você no chuveiro, nunca na banheira."
Sou totalmente inexperiente em toda e qualquer coisa relacionada a homens.
"Sim, vamos fazer só o que você se sentir confortável, tudo bem? Me diga se não estiver mais se sentindo confortável." Ele diz preocupado e eu assinto.
"Você precisa me dizer se entendeu, Sarah." Ele me olha firme.
"Entendi." Ergo a cabeça e encosto meus lábios nos dele, é tudo o que preciso, tudo o que quero.
Ele me puxa para perto com uma mão enterrada em meu cabelo e outra em meu quadril, nossas respirações estão ofegantes e meu coração quer sair do meu peito. Mas me sinto bem e confortável com ele me guiando.
Graças a Deus hoje coloquei uma langerie que Esther me deu de presente, não é nada comparada ao que ele deve estar acostumado a ver, é simples e básica. Ele me despe, e só paramos de nos beijar para que ele tire sua roupa ficando só de cueca, sua cueca branca que só confirma minha teoria de que ele é um Deus grego enviado do Olimpo.
Ele me conduz até a banheira já cheia, entramos com ele me posicionando em cima dele, vou para beija-lo mas ele para. Não entendo, será que fiz algo de errado?
"Fiz alguma coisa?" Pergunto envergonhada.
"Não, meu bem. Eu só queria te olhar, você é linda, poderia ficar te olhando assim por horas." Ele me olha com extrema atenção e delírio, e nesse momento sei que não é só ele que me leva ao delírio, eu o levo também.
Me aproximo de seus lábios e o beijo com fervor e vontade, coloco minhas mãos em seu pescoço e me mexo em cima dele, não sei muito bem se estou fazendo certo, mas ele parece estar gostando. Não tenho mais vergonha ou medo, ele me conduz agora.
"Não posso perder você, Sarah." Ele diz parando de me beijar e mordendo meus lábios, amo seus pequenos detalhes, a forma como ele me olha, como ele se preocupa, como ele faz eu me sentir bonita e sexy, amo tudo nele.
"Você não vai me perder." Eu afirmo, porque se depender de mim não me perderá nunca mesmo.
"Por que tem tanto medo?"
"Por que sinto que a vida está sendo boa demais comigo, só me aconteceram coisas ruins até agora, e de repente vem você." Ele coloca os dedos no meio dos meus seios e vai descendo, me causando arrepios.
"Você é minha luz no fim do túnel, Sarah." Ele sorri e consigo ver o brilho em seus olhos.
"Navegando juntos, ok?" Eu sorrio.
"Juntos." Ele me completa. Não só nas palavras, mas em tudo, somos tão diferentes e tão compatíveis ao mesmo tempo.
Ele continua a descer seus dedos, é uma correnteza a qual eu não quero que tenha fim. Ele para no elástico da minha calcinha e me olha firmemente.
"Sarah, eu preciso falar..." E eu o interrompo, se ele disser mais uma vez que não me merece ou algo do tipo vou sugerir a ele um psicólogo.
Ele continua seu movimento, elevando minha respiração e fazendo todas as células do meu corpo reagirem á ele. Beija todo meu corpo e me arrepia por inteiro.
"Estou morrendo de fome." Mudo de assunto na esperança de que possamos pedir algo e não cozinhar, essa é uma das muitas artes da qual eu não domino.
"Que tal uma pizza?"
"Que tal duas? Eu amo pizza de brigadeiro." Me posicionou em seu colo animada, não tem nada que eu ame mais do que pizza de brigadeiro.
"O que? Quem come isso?" Ele pergunta rindo mas eu sei que é sério.
"Eu, ué." Dou de ombros. "Qual é o seu sabor preferido?" Questiono.
"Quatro queijos, é claro." Como se fosse uma verdade universal.
Faço careta, odeio queijo desde que minha mãe começou a introduzir alimentos em minha boca. Odeio tudo, o cheiro, a textura, o gosto.
"Vai me dizer que não gosta de pizza de quatro queijos?" Ele está indignado agora.
"Eu odeio queijo." Digo e sei qual vai ser sua reação, a mesma de todos que sabem dessa informação, não existem muitos brasileiros que não gostam de queijo, mas sou um deles.
"Ok, agora você é realmente uma pessoa esquisita." Ele ri. E eu jogo água nele.
"Tudo bem, podemos pedir uma de queijo e uma de brigadeiro." Finalmente acho a solução, considerando o temperamento de Pedro sei que ele arrumaria bem fácil uma discussão por causa de pizza.
"Tudo bem, não acredito que você vai me fazer comer pizza de brigadeiro." Ele ri.
"Eu posso fazer muitas coisas com você." Digo piscando, sei que ele gosta de ouvir essas coisas quando sai da minha boca. Ele já deve estar acostumado, mas quando me ouve é como se nunca tivesse ouvido antes.
"Você anda bem soltinha, não acha?" Ele se aproxima e me beija devagar, sou capaz de saborear sua boca por séculos sem parar. Mas paro, porque estou ficando com frio e fome.
"Bom, acho que você vai ter que descobrir." Sorrio de canto e me desvencilho de cima dele saindo da banheira. Me enrolo na toalha e saio pela porta.
"Te espero lá em baixo. E com roupa." Eu o lembro, conheço sua personalidade e falta de vergonha, sei que ele apareceria fácil pela casa sem roupa. Eu não acharia tão ruim, mas os vizinhos quem sabe.
Estou procurando dentre os vários panfletos da mesa da cozinha um que tenha um número de alguma pizzaria, estou morrendo de fome.
Sinto uma mão em minha barriga e ele me abraça por trás, contraio o corpo ao sentir seu corpo gelado sob o meu. Me viro e ele está apenas com uma bermuda de moletom que não esconde muito bem seu monumento.
"Quer ajuda?" Ele diz me tirando do meu transe e sorri ao perceber onde meu olhar estava focado.
Procuramos uma pizzaria e pedimos as pizzas que combinamos, estou apoiada no balcão pensando na minha mãe, não consigo entender por que ela ainda não me ligou, ela me ligava quase todos os dias mesmo que fosse para falar um oi e tchau. Acho estranho mas não vou ligar para ela porque não suporto o fato de ter que esconder Pedro, ela não está preparada para absorver toda essa informação sobre sua nova filha.
"Tudo bem? Ele pergunta me tirando de meus pensamentos.
"Sim, claro." Mas não o convenço, sei disso, a essa altura conhecemos os olhares um do outro mais do que qualquer um.
"Fala, meu bem." Ele estende a mão e eu entrelaço meus dedos nos dele. "Navegando juntos, lembra?" E ele me lembra da minha própria expressão. Gosto de comparar tudo ao mar, as embarcações, ao oceano e a praia, porque no fundo somos todos como as ondas do mar, tentativas contínuas de engolir nossos problemas, e na maioria das vezes dá certo, não importa o que esteja no caminho, seja uma embarcação ou um barquinho, nós engolimos e seguimos nossos caminhos, é assim que a vida funciona, engula seus problemas ou eles engolem você.
"Só estou pensando em minha mãe, ela ainda não fez nenhum contato e estou um pouco preocupada, você acha que devo ligar? Não sei quando os papéis se inverteram e passamos de briguento e apoiadora para conselheiro e confusa.
Ele não me olha nos olhos de novo.
"Relaxa, Sarah. Deixa sua mãe viver um pouco sem você, vai que ela está aproveitando, hein." Ele Sorri.
"Me poupe de pensar em minha mãe fazendo essas coisas." Eu digo calçando meus chinelos ao ouvir o barulho da moto buzinando, a comida finalmente chegou. Todas as vezes que ouço o entregador saio que nem uma abobalhada correndo como se o entregador fosse fugir com a comida.
Volto com duas caixas de pizza com um cheiro magnífico (tirando o cheiro do queijo, é claro).
Ele estendeu um lençol no tapete da sala, com almofadas e ligou a tv no canal de música, nada poderia ser mais perfeito.
"Vem e coloca as pizzas aqui." Ele me chama.
"Você já pegou os pratos e talheres?"
"Quem come pizza com talheres?" Ele faz uma cara estranha e ri.
"Eu?" Pergunto sem graça.
"Bom, na verdade eu não esperava menos, mas hoje você vai comer com a mão, vem cá." E eu vou. Minha mãe sempre fez de tudo para manter as boas aparências, por isso nunca nem em sonho comemos pizza com a mão em casa, nem nada que nos faça parecer deselegantes.
Sentamos nas almofadas e comemos as pizzas com a mão. Eu estava tão faminta que comi tudo rapidinho.
"Você realmente me surpreende, com essa barriguinha comendo quase uma pizza inteira." Ele ri de mim. Nunca liguei para a opinião alheia sobre meu corpo, então por mim está tudo bem.
Está tocando Onde Direction na TV e cantamos Drag me Down.
"Não sabia que você gostava desse tipo de música." Eu questiono porque ele não faz o tipo de que gosta de boybands.
"Bom, não faço esse tipo mesmo, mas até que curto."
Ele não quer assumir que gosta de uma boyband, mas pela forma que canta sei que ele gosta muito mais do que demonstra. Ouvimos toda a playlist de Imagine Dragons e nós damos um show para os quadros da Esther. Cantamos, pulamos e rimos, é a minha banda preferida nesse mundo e não me contenho quando ouço.
"Eles são muito bons." Ele diz ofegante depois de pularmos em quase todas as músicas.
"É a minha banda preferida." Digo quase sem ar.
Não me lembro qual foi a última vez que me diverti tanto assim, rindo e cantando, geralmente faço isso com minhas melhores amigas, mas ele está aqui agora e é a companhia perfeita.
Nos aproximamos e nos abraçamos, sou tão grata por esse momento, estou tão feliz.
"Obrigada por tanto." Eu digo encostando a cabeça em seu peito e retribuindo o abraço caloroso.
"Esta brincado? Eu devia ajoelhar e agradecer por você estar aqui e ter ficado depois de conhecer meu lado ruim." Ele me abraça como se fosse a última vez. "Tenho medo de que você perceba que é boa demais para mim ou que eu faça algo errado, é só o que eu faço."
Seu coração está acelerado, e sua demonstração de carinho é grande agora, consigo sentir sua alma, suas dores e suas decepções, ninguém lutou por ele durante sua vida, ninguém continuou a nadar depois do naufrágio. Mas eu não, eu estou aqui agora guiando essa embarcação com ele.
"Estou aqui agora e não pretendo nem por um segundo me afastar, ok?" E por um instante eu penso em como seria se morássemos na mesma cidade, não sei como vai ser quando eu voltar para São Paulo, mas no fundo não é o que eu quero.
O clima está triste e não quero permitir que fique, então tenho uma ideia.
"Vamos jogar verdade ou desafio." Eu realmente sei que mudei porque condenei esse jogo a minha vida toda, e cá estou eu querendo jogar. Mas o mundo gira e as ondas se movimentam, é assim que é.
"Não era esse jogo que só adolescentes patéticos jogavam?" Ele questiona me olhando, ele me ouviu conversando com Mari, por isso está me provocando assim.
"Em primeiro lugar eu mereço o mínimo de privacidade, e em segundo, você tem ideia melhor?" Ergo minha sobrancelha em forma de provocação, sei que ele não tem ideia melhor.
"Ok, senta aí que eu pego a garrafa."
Ele vem com uma garrafa de cerveja e posiciona em nosso meio.
"Ok, você começa." Não tenho ideia do que perguntar ou falar.
Ele dá de ombros sorrindo de canto.
"Verdade ou desafio, Sarah?" Ele me olha sério agora e começo a me arrepender da minha ideia, sei que ele não vai se poupar de perguntar o que quiser.
"Verdade" Não sei o que vai me causar mais vergonha.
"É verdade que você sentiu ciúmes quando me viu beijando a Rafaela?" Ele ergue a sobrancelha. Oi? Ele sabe que eu odeio esse assunto e vem jogar em minha cara?
Percebendo meu desconforto ele diz: "Desculpa, eu...Fui idiota."
É mesmo.
"Tudo bem. Se é isso que você quer saber, eu senti sim." E eu senti mesmo, não que eu soubesse no momento que aquela raiva era ciúmes, mas hoje sei que é. Ele sorri como se causar ciúmes em mim fosse o seu novo passatempo preferido.
"Bom, minha vez, verdade ou desafio, Pedro?"
"Verdade." Ele não hesita.
"É verdade que naquele dia em que invadiu meu quarto e eu saí de toalha você foi só para me deixar intrigada?" Sorrio. Hoje eu sei que é, ele gosta de testar as pessoas.
"Sim, queria que sentisse por mim o que eu já sentia por você, só não sabia ainda que era amor."
"É, você olhou com tanta indiferença para mim." Digo me lembrando daquele dia, me senti tão mal porque ele me olhou como se eu fosse só mais uma.
"Eu fiz o máximo que pude para que você se sentisse assim, desculpa. Não sei porque fiz isso, acho que era porque achei que você não estava me dando bola. Idiota, eu sei, mas quando você não estava olhando eu babei por cada parte do seu corpo, você é perfeita, Sarah."
Sorrio e meu coração se derrete novamente, borboletas passam pelo meu estômago como a água passa pelas rochas no mar, vão e vêm com frequência.
"Será que o Enrico volta hoje?" Eu pergunto porque quero falar sobre ele.
"Acho que não, assim como seu pai e Esther não voltam tão cedo, todo ano eles querem dar uma de adolescentes e voltam de madrugada, é o único dia do ano que conseguem." Ele tenta mudar de assunto e não olha em meus olhos, é assim que sei quando ele quer me evitar, não olha em meus olhos.
"Qual é o problema dele?" Eu pergunto direta e reta, não quero que ninguém esconda nada de mim.
"Nenhum, só coisas de adolescentes idiotas, não é assim que você chama?" Ele olha para o lençol.
"Não entendo de muitas coisas mas não sou burra, Pedro. Ele estava mais do que bêbado aquele dia e até agora não fala direito com meu pai, eu quero saber o que está acontecendo." Eu o encaro, não vou desistir e ele sabe disso. "Sem mentiras, lembra?" Eu o lembro caso ele tenha se esquecido.
Mas meu telefone toca e me tira do meu foco, me levanto para ir pega-lo mas ele rapidamente diz: "Espera, eu falo." E eu me sento de volta, seja quem for no telefone, pode esperar.
Ele respira fundo como se fosse difícil para ele falar sobre, e talvez seja mesmo, sei que posso estar exigindo muito dele porque são assuntos delicados, mas ou estou nadando, ou estou no barco, não há um meio termo.
"Nossos pais morreram em épocas muito próximas e de formas muito fúteis, um cara drogado bateu no carro do meu pai, mas com o pai dele foi um erro médico, entende? Ele podia ter sobrevivido e Enrico nunca suportou o fato de ter perdido o pai por negligência médica, nos tornamos muito amigos, e minha vida seria muito complicada se não fosse pela família dele. E quando crescemos, ambos andamos por caminhos tortos, navegamos por correntezas e precisamos de distrações. Mas as minhas distrações eram as brigas, mulheres, bebidas, mas nunca drogas, porque de certa forma foi o que fez alguém tirar a vida do meu pai." Ele me olha nos olhos agora e engole seco. Eu confirmo com a cabeça para que ele continue, preciso saber o que está acontecendo. "Mas as distrações do Enrico foram e são as drogas, ele começou quando começamos a sair e a conhecer os caras, eu já experimentei mas isso não é para mim, saca?" Ele hesita de novo, estou fazendo ele falar sobre um assunto que o machuca, o que me machuca também.
"Já tem um tempo que ele tem perdido o controle, sabe? Usa demais e não consegue parar, e da última vez ele mexeu com os caras errados, um deles é o que tentou fazer... Fazer aquilo com você na festa, lembra?" Faço que sim com a cabeça, não consigo falar agora. "Ele não pagou os caras e aquele cara lembrou de você, perguntou sobre você e disse umas coisas que não foram legais, por favor não me faça repetir as coisas que saíram da boca dele. Seguro sua mão agora. "A sorte é que eles são vizinhos de um amigo do seu pai, que viu e ligou pra ele, seu pai já resolveu tudo, mas é por isso que o clima ficou chato, porque você foi envolvida na história."
"Mas...Eu não..." Quero dizer que não tenho nada a ver com isso e que vai ficar tudo bem, mas ele não me deixa terminar.
"Você não conhece esses caras, Sarah, eles não são caras para quem se diz não ou que se brinca, então nossa amizade ficou um pouco abalada também, porque você é tudo o que eu tenho agora, é tudo o que me importa, mas ele precisa de mim, precisa de nós, entende?" Ele me olha e aperta firmemente minhas mãos.
"Ah... Claro que entendo, Pedro. Mas não sei o que posso fazer." E eu não sei mesmo, não sabia que o poço era tão fundo assim.
"Por favor, não fique mais sozinha pelas ruas para que nenhum cara te encontre e para me poupar de brigas." Ele diz e eu assinto, mas não é o que eu quero, quero levantar e dizer que não é justo que eu tenha que me privar de fazer coisas por medo de outros homens, por medo de homens que pensam que podem fazer o que quiser com os corpos alheios, quero gritar e dizer para o mundo que está tudo errado, eu não quero viver com medo de pegar um táxi, de andar sozinha, de vestir uma roupa curta. Mas não adianta, é como se minha voz não saísse, é como se desde o início a minha voz e a voz de todas as mulheres que vieram antes de mim não saíssem, porque fomos silenciadas, porque somos silenciadas.
"Bom, verdade ou desafio?" Ele diz mudando de assunto.
"Verdade" Eu gosto de verdades.
"Vou te dizer uma verdade então." Ele se aproxima e mira em meus olhos, sou capaz de enxergar a profundidade de sua alma pelos seus olhos.
"Eu te amo, Sarah." Ele diz meu nome como um padre diz uma ladainha, seus lábios foram feitos para isso.
E meu coração se acalma, porque também o amo, passei os últimos dias tentando entender sobre o que se tratava meus sentimentos por Pedro mas não consegui, porque nunca amei ninguém da forma como eu o amo. É disso que se trata o amor, sobre navegar em águas profundas sem saber se são seguras, sobre navegar por mares nunca dantes navegados.
"Eu também te amo, Pedro." Eu sorrio. Amo mesmo e quero gritar isso para o mundo ouvir. Ele me beija com clamor e vontade, enterro minhas mãos em seu cabelo puxando levemente e ele me deita no lençol se posicionando em cima de mim. Sinto inquietações pelo meu corpo todo, meu coração vai sair pela boca e meu corpo explodir, quero senti-lo mais e mais.
Ele me olha e ergue minha blusa, eu a tiro e puxo a dele para que ele possa tirar também, estamos entregues um ao outro agora.
Sinto seus dedos pela minha pele enquanto nos beijamos, meu corpo todo se arrepia e não há uma célula que não queira ser entregue a ele. Meu corpo está em chamas e quanto mais nos beijamos, mais minha inquietação aumenta.
Ele para com esse beijo fervoroso um estante e me olha.
"Eu te amo pra caralho, sabe disso não é?" Ele me olha preocupado, não há com o que se preocupar, quero mergulhar em seu corpo para sempre.
Ele aumenta a fricção entre nós e enterra a mão em meu cabelo puxando de leve. Corro meus dedos por suas costas causando um leve arrepio.
Paro um instante, eu o quero por inteiro.
"Tudo bem?" Ele me olha preocupado.
"Eu quero você por inteiro." Digo decidida.
"Quero senti-lo, Pedro."
Ele me olha como se precisasse me entender, não há o que entender, apenas sentir.
"Você tem certeza? Tipo, aqui mesmo?" Ele me questiona.
"Tenho, quero navegar pelo seu corpo, aqui e agora." Olho no fundo dos seus olhos agora, nunca fui a um momento tão íntimo com alguém, nunca pensei que faria isso antes da faculdade, mas está acontecendo agora e eu não mudaria uma vírgula. Estou decidida à viver minha vida, fazer minhas próprias escolhas sem que alguém me diga se estou me vestindo bem ou não, se estou sendo elegante ou não. Carpe Diem, Sarah.
Ele faz carinho em minha testa e afasta meus cabelos segurando meu rosto para que eu olhe em seus olhos, sinto tanto carinho e tanto amor agora.
"Nada nunca vai mudar nossa conexão." Eu digo mais como um desabafo da minha alma, é o que eu sinto agora.
Ele se afasta de vagar e me guia, tira meu shorts e o ajudo a tirar o que resta de sua roupa.
Ele me olha por inteiro, como se eu fosse uma obra de arte, é assim que me sinto.
"Você é a coisa mais linda que meus olhos já tiveram a oportunidade de olhar." Ele recita como se fosse um poeta e eu a poesia.
Ele tira com delicadeza minhas roupas íntimas e eu não sinto vergonha, é como se meu corpo fosse feito para ser olhado por ele. Ele se posiciona em mim e pela milésima vez pergunta: "Tudo bem mesmo?" Me olhando com preocupação.
"Tudo, Pedro. Eu quero você."
Ele me olha profundo e eu o desejo mais, e mergulha por inteiro em mim como quando nós mergulhamos no mar e sentimos o impacto da água gelada, como quando mergulhamos fundo sem nos preocupar com a profundidade, apenas vamos. E eu não me preocupo o quanto ele vai mergulhar em meu corpo como se eu fosse o mar, não me preocupo o quanto ele vai navegar em meu corpo como se eu fosse o oceano. É o momento mais íntimo que eu já tive com alguém e é tão envolto de amor, nossos olhos se entreolham como se pertencêssemos um ao outro, como almas que se reencontram, somos nós, aqui e agora.
Sempre me preocupei em planejar as coisas em minha vida, sempre quis ter o controle sobre tudo e saber tudo o que eu estava fazendo, mas nesse momento eu não tenho controle e não me importo, ele navega sobre mim e me guia, me sinto completa e envolta de amor, estamos navegando por mares nunca dantes navegados.
É um pouco desconfortável como eu pensei que seria, mas o carinho que sinto supera todo o desconforto, ele me leva à um prazer carnal e feliz. Nesse momento a televisão está tocando Elephant Gun e eu me sinto completa.

InefávelOnde histórias criam vida. Descubra agora