Capítulo 29 - Estórias

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Permaneci de pé a encarando, confesso que um pouco cautelosa. A latina guardava alguns papéis espalhados na mesa numa pasta, quando levantou o olhar pra mim.

- Acho que está aqui porque quer uma explicação. Então por que não fecha a porta e senta.

Ela não estava nem mesmo brava por alguém vim acusa-la de algo assim. Fiz o que me pediu, fechei a porta e sentei na cadeira a sua frente.

- Você está bem tranquila pra alguém que está sendo acusada de assassinato.

- O que te faz pensar que fui eu?

- Bom, seu carro é da mesma marca da cena do crime e aquele 'faria qualquer coisa por ela' foi um pouco estranho.

- Imagino que saiba da marca do carro porque viu o relatório do caso com sua irmã.

- O que isso importa? A questão aqui é que você não tá negando.

- Fiz o que precisava ser feito pra ajudar a Lena.

- Matando o irmão dela?

Apesar de odiar aquele cara, ele ainda era a única família da Lena e tinha medo dela estar negando essa realidade pela excitação de me ter de volta.

- Era o único jeito de você voltar.

- Não entendo. Sei que ama ela, por que me queria de volta?

Ela riu como se eu tivesse dito a maior besteira do mundo.

- Kara, não é esse tipo de amor que tenho por ela. Se fosse, era você quem estaria morta.

Pisquei algumas vezes com essa frase. Quem imaginaria que essa mulher pudesse puxar o gatilho e agir como se nada tivesse acontecido.

- Então por que deixou que ela pensasse que matou o irmão?

- Quando ela saiu naquela noite a brecha foi aberta e a culpa caiu sobre ela. Se eu lhe garantisse que não tinha sido ela, teria que explicar como sabia. Fiz o que fiz pra salva-la, e vou fazer isso quantas vezes for preciso.

- Salva-la? Salva-la do que?

Será que eu tava na frente de outra Lena? Outra história sobre salvamento das mulheres no mundo?

- Do programa que tá rodando na mente dela.

'Não acredito'. - disse internamente.

- Do que tá falando? - aí está, lá vinha outra história de crença, lavagem cerebral ou sei lá o que.

- Kara, todos nós representamos papéis nesse mundo. A empresária, a funcionária, a mãe, a esposa. E tem outros papéis que adquirimos inconscientemente. Alguns veem suas vidas como os contos de fadas. Acho que conhece a cinderela, bela adormecida, o patinho feio. A que mais me chamou atenção foi da Bela e a Fera. Esse conto não se trata de um príncipe salvando a princesa, e sim o contrário. Mas há algo de mais profundo nessa superficialidade. Quero que preste atenção Kara, e me diga se esse não é o papel que está prestes a representar.

Andrea se levantou e tinha aquele mesmo olhar que vi na Lena quando discutimos na sua casa. Talvez ela também tenha passado por aquele 'processo' que Lena mencionou, e pode ser onde as duas acabaram se conhecendo.

- Outro lado da submissão das mulheres é a ideia de salvação. Claro que isso está num nível oculto, invisível, nenhuma percebe. Muitas se encontram num relacionamento abusivo, onde inconscientemente tentam salvar suas feras. Nesse conto a feiura poderia ser substituída por algum vício. Bebida, droga, raiva, abusos físicos. As Belas acreditam que podem fazer surgir o príncipe por de baixo dessa camada, mas como você sabe na vida real príncipe não existe. Mas elas continuam tentando porque amam suas feras, e o amor vai cura-los. Besteira.

Minha Nova Chefe (Concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora