56ºCapítulo

1K 90 74
                                    

Mônica 

Acordo e encaro o teto branco do hospital. A uma semana estou aqui, deitada nessa cama sem conseguir me mexer sem a ajuda de alguém, o que é humilhante. Estou incapaz de fazer nada. 

Durante o tempo que estou aqui, ninguém veio me ver. Nenhum dos meus filhos, nem meu ex, nem minha prima. 

Ninguém. 

Até considerei e me agarrei a falsa esperança de que eles apenas não sabiam, mas toda vez que Amanda Lincoln passa por aquela porta para me avaliar, essa esperança se esvai. Claro que ela informou meus familiares que eu estava aqui, eles não vieram por simplesmente não se importarem. 

Não os culpo, com o meu histórico provavelmente, não, com certeza, faria o mesmo. 

Porém não posso dizer que não tenho recebido visitas, a polícia está vindo muito. Ao me acharem quase morta por ferimentos de bala, o que já era motivo suficiente, precisaram fazer uma transfusão de sangue, e ao analisarem o meu tipo sanguíneo acharam resquícios de heroína. Então estou sendo investigada, com direito até a dois policiais à minha porta vinte quatro horas com a desculpa de eu ser uma "figura pública".

Não pude deixar de rir da ironia.

Minha vida toda eu quis ser notada, considerada importante o suficiente para ter pessoas me escoltando, só não imaginava que iria acabar assim.

Mas por outro lado agradeço a segurança extra, só tenho conseguido dormir por conta dos vários remédios que me dão, pois meu cérebro não consegue se desligar de uma pessoa. 

Terry. 

Apenas de pensar em seu nome meu corpo treme e sinto vontade de chorar, entro em pânico, um medo que eu só experimentei a muito tempo atrás, quando eu ainda era praticamente uma criança. 

Apesar das medicações me apagarem, elas infelizmente não conseguem afastar as lembranças que se transformam em sonho, ou melhor dizendo, pesadelos

Aquele homem, naquele quarto escuro e decrépito, e suas mãos tão ásperas. 

Padre Joseph. 

Meus pesadelos têm me transportado novamente para aquela época, onde eu tentava fugir, mas não sei o que tinha feito para merecer ser considerada o brinquedo favorito dele. As outras órfãs provavelmente me achavam sua salvadora, porque a partir do momento que ele se fixou em mim, parou de procurar por elas. 

Eu tentei de tudo, até pensei em suicídio, mas e Gizell?! E se ele fosse atrás dela depois?! 

Então eu continuei, me forcei a continuar viva, passei por cima de tudo que eu sabia que era certo, eu sabia que eu não merecia aquilo, nenhuma daquelas meninas mereciam aquilo. 

Foi um alívio quando finalmente saí de lá, eu queria recomeçar, mas já era tarde demais. 

Eu já estava condenada. 

Já era apenas a casca do que um dia já fui. 

Não tinha mais propósito, perspectiva, moral. 

Só sabia de uma coisa, ninguém nunca mais iria fazer aquilo comigo. Ninguém iria me fazer sentir insignificante, pequena, sem valor. 

Eu não iria permitir que ninguém se aproveitasse de mim de novo. 

Quando Gizell veio morar comigo naquele apartamento minúsculo, que mais parecia uma kitnet, e começou a trabalhar na mesma lanchonete que eu, comecei a sentir algo que nunca havia sentido por ela, raiva. 

A.S.P: True Love (Amor Verdadeiro)Onde histórias criam vida. Descubra agora