Capítulo 53 - Horizonte Rubro Negro

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Naquela noite, cercado pelo calor da lava que escorria em um dos vários vulcões ali perto, nos sentávamos em volta de uma fogueira observando o céu estrelado misturando-se à lua nova. 

Eu continuava me virando para Elly, tentando arrumar algum jeito de chegar até ela, que continuava calada enquanto jantávamos.

Amélia brincava maravilhada com os Cat Sith que nos serviam uma sopa de legumes. Fadas-gato que podiam andar em duas patas eram uma personificação dos gostos da barda. 

À nossa frente, humildemente comendo em uma tigela de barro, estava minha mãe.

Os acontecimentos passados, porém, nos mantinham calados e tensos. A conversa não fluiu e apenas nos encaramos desconfortáveis. 

Elly terminou a parca janta e se recolheu. Acompanhei-a com o olhar enquanto os servos de minha mãe arrumavam um local para que dormíssemos.

Ela continuou a querer ficar sozinha, negando qualquer solidariedade ou carinho. Não querendo ser inconveniente, apenas conseguia olhar à distância enquanto ela continuava a se fechar. Nem reparei direito quando minha mãe se aproximou e falou próximo ao meu ouvido:

– Ela é muito bonita, tem bom gosto, filho.

– Ela é mais do que bonita, é a pessoa mais esperta e vivaz que já conheci... e por culpa minha ela acaba de perder tudo.

Queria desesperadamente fazer algo para amenizar sua dor, mas sabia que nada que fizesse agora a alcançaria. Sentia-me fraco e impotente. Minha mãe então me abraçou e deixou o calor de seu corpo me preencher enquanto eu continuava a observar Elly, cabisbaixo.

Ficamos assim por mais algum tempo até que sons foram ouvidos em uma construção de pedra próxima dali. Uma espécie de rocha que se erguia do solo e se assemelhava a um menir. Umbra foi então forçada a se levantar e começou a invocar magias.

No menir, ao longe, via-se uma formação que se assemelhava a um portal lutando para se abrir. Umbra continuou seu cântico até finalmente fechá-lo e voltar ofegante até nós.

– Desculpe, às vezes ele tenta romper meu controle.

– O que é aquilo? – Perguntei.

– É um portal para as Selvas Dracônicas, o plano dos dragões. Abriu-se depois do embate entre mim e Vechtu. Esta dimensão representa os aspectos mais selvagens da criação e muitas criaturas capazes de alterar o equilíbrio do ecossistema tentam atravessar. Não consigo conter os menores estando aqui nos Ermos, mas consigo evitar que grandes criaturas atravessem. Este tem sido meu fardo desde aquela fatídica noite.

Com isso, pude entender o peso que ela carregava e o porquê de morar sozinha em um mausoléu no topo de uma cordilheira vulcânica. 

Ela continuou por mais algum tempo falando sobre todo o esforço de ter que se manter como a guardiã desta região. Até que o assunto chegou em Vechtu e o clima imediatamente ficou pesado.

Contamos o plano de ataque para minha mãe, que logo tratou de nos recusar.

– Mesmo selado, ele pode reconhecer o usuário da magia pelo cheiro da mana. Com este plano, não será possível enganá-lo.

Amélia bufou ao perceber que nossa estratégia já começaria falha, mas a frase de Umbra nos tranquilizou:

– Por isso, creio que deveriam usar a minha mana. Deixem que eu forneça a energia mágica necessária para executarem este plano. – Sorrimos, pois a energia dela nos permitiria levar o plano ainda mais além. – É o mínimo que poderia fazer.

O que se seguiu porém foi uma discussão muito mais sensível: como selar Vechtu.

Dois selos haviam sido rompidos, e dois preços deveriam ser pagos para que ele fosse selado novamente. Minha mãe virou-se para mim e disse:

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