"E quando os antidepressivos e os calmantes não fazem mais efeito, Clarisse sabe que a loucura está presente e sente a essência estranha do que é a morte." - Legião Urbana15 de Agosto de 2019, foi o dia em que para mim, pisei naquele lugar pela primeira vez. Lembro-me do canto dos pássaros e do sol aquecendo minha pele, enquanto em passos leves, ao lado de Thiago, cruzei o portão principal do "Lar de Repouso e Reabilitação Capitãs de Areia"; como eu poderia esquecer de um lugar com um nome desses??
Havia um longo jardim arborizado, alguns canteiros de rosas vermelhas e pessoas vestidas de branco por todo lado, observei uma mulher que aparentava ser paciente, e enxerguei serenidade nos olhos dela, ela parecia feliz?
Era estranho como eu não tinha nenhuma lembrança daquele lugar, mas de alguma forma, ao mesmo tempo, tudo parecia tão familiar.
Thiago, olhou para mim fazendo uma análise de minha reação, eu estava confusa.
- E então? Consegue se lembrar?
Balançei a cabeça negativamente, e, continuei olhando a minha volta. De repente, ouvi uma voz chamar o meu nome:
- Helena?!
Era uma mulher morena de cabelos curtos e estatura baixa, aparentava ter mais ou menos cinquenta anos.
- Que bom revê-la finalmente! - afirmou sorrindo.
- Desculpa, mas não estou me lembrando de você!
- Como não? sou eu, Ercília.
- Sou Thiago, marido de Helena! - exclamou cordialmente estendendo a mão para a mulher, que a apertou prontamente.
- Que ventos trás você de volta Helena? Já que não foi para visitar os velhos conhecidos.
- Eu não consigo me lembrar do tempo que passei aqui! Parece que existe uma lacuna na minha memória.
- Entendo. - disse a mulher categoricamente - Vamos nos sentar, pra gente conversar um pouco?Assenti, e Hercília, então sorriu e caminhou a nossa frente. Thiago, olhou-me reticente e apenas sinalizei que não com a cabeça.
Enquanto seguíamos a mulher de jaleco branco, continuei a observar o jardim. E como era de costume em minha vida, algo estranho aconteceu: avistei minha mãe sentada em um dos bancos, ela estava com um caderno em suas mãos, concentrada, com o olhar fixo nas páginas, escrevia de forma compulsória. Parei de andar e encarei aquela direção.
- Vamos nos sentar naquele banco? - sugeriu Ercília.
- Claro! - respondi tentando sorri.Fomos caminhando em direção ao banco e quando nos aproximamos, percebi a imagem de minha mãe esmaecendo.
Sentamos.
- Como é possível que eu não me lembre de nada?
- Bem, não posso explicar nos melhores termos, afinal, sou apenas enfermeira. Mas, cuidei de você por todo tempo que passou aqui, talvez possa te ajudar de alguma forma!
- As cicatrizes em meus braços, você se lembra?
- Sim, haviam várias quando você chegou aqui!
- Por que ninguém pode ver? - perguntei tocando em meu braço esquerdo.
- Eram ferimentos superficiais, normal que tenham desaparecido!
- Eu falava sobre as cicatrizes?
- Você não era de falar muito, estava sempre lendo, por aqui ou na biblioteca. Mas lembro de ter confessado para outra pessoa, sobre auto mutilação!
- Auto mutilação... - repeti como um zumbi.
Outra pessoa?? Com que eu costumava me abrir??A mulher pareceu um pouco desconfortável diante da minha pergunta, mas respondeu com uma voz de pesar.
- Hugo!
Olhei para Thiago que me encarou incrédulo.
- Hugo? - perguntei sentindo meu coração acelerar.
- Você também não se lembra dele?
Balançei a cabeça negativamente.
- Essa pode ser uma explicação plausível para que não se lembre do tempo que passou aqui!
- Hugo é o nome do nosso filho, mas Helena nunca mencionou que conhecesse alguém com esse nome!
- Porque não conheço! Ou pelo menos não tenho a lembrança de conhecer...
- Hugo era o seu psicoterapeuta. Você confiava muito nele, era com ele que dividia suas aflições, culpas e medos.
- Eu preciso falar com ele, talvez assim eu possa me lembrar e...
- Claro! - concordou Thiago - Se esse nome ficou na memória dela, talvez seja a chave para ela se lembrar...
- Infelizmente isso não será possível! - disse Hercília com tristeza - O doutor Hugo faleceu!
- Faleceu?! - perguntei sem acreditar.
- Foi uma tragédia, ele era muito jovem! Mas, tinha cancer, quando foi descoberto, já era tarde demais; ele morreu seis meses depois!
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O Tempo
Mystery / Thriller"Jamais poderemos entender os mistérios do tempo" O Tempo é uma viagem cronológica cheia de suspense e mistério através de uma mente perturbada. Helena não era uma adolescente como as outras da sua idade e todos seus defeitos e qualidades a faziam...