XX-Planos para a viagem -I-

10 1 0
                                    

Corro pela praça o mais rápido que posso. Esbarro em uma senhora e tropeço em uma cesta de frutas, mas eu não posso chegar atrasado!
Vai demorar muito esperar os guardas abrirem o portão. Pulo para um muro baixo da onde posso agarrar o parapeito de um telhado. A senhora que eu atropelei a algum tempo atrás ainda estava me perseguindo e agora gritava palavras más para mim. Bem eu mereço. Mas o papai tem só 45 minutos para me ouvir! Depois de me equilibrar bem salto para o parapeito da janela da casa de guarda.

A senhora grita assustada e tropeça nós próprios pés. Os guardas vão ajudar ela, tenho que contar meus planos da viagem para o papai!

Eu entro pela janela e corro direto para a muralha escapando dos guardas.
Acidentalmente olho para baixo e congelo. O meu sangue gela e um arrepio passa pela minhas costas. Não vou me machucar, mas o medo toma conta.
A voz dos guardas aumentam, eles vão me alcançar. Alguns machucados para contar para o papai? Claro! Fecho os olhos e pulo da muralha enquanto gritava. Os guardas gritam também. Porque agente sempre repete isso? Por um estante meus pés ganham apoio da parede. Uso o impulso e me jogo para o telhado do segundo andar. Depois de me equilibrar desso o resto com um pulo.
Amorteço minha queda mas o barulho assusta uma criada que dá um pulo na frente da entrada do prédio.
Viu? Nunca é tão alto quanto parece.

A janela da sala de jantar era no segundo andar. Hoje eu vou pelas escadas mesmo. Desvio da empregada em choque e corro escadas a cima, subindo 2 degraus a cada passo. Erro, escorrego e caio de joelhos. Me levanto e continuo a correr. Espero que ninguém tenha visto. Mili me encara do lado de fora da porta, ela viu.

— Estás atrasado pequeno príncipe. Não pense que sairá impune, mas aproveite a refeitório. Hoje temos cervo. —  Cervo! Espera, Mili está ou não está brava comigo? Penso nisso depois. Moli abre a porta. Papai está bravo. Ou talvez só cansado? Me sento ao seu lado na mesa e nós começamos na comer. Cervo com batatas é bom demais!

— Como foi seu dia meu pequenino? — Ele pergunta, está realmente cansado.

— Recebi as notícias! Quando vamos partir! — Respondo animado, ele sempre fica animado quando eu estou. Ele sorri para mim e responde.

— Quando estiver pronto meu pequeno, quando estiver pronto.

— O que há para se preparar? — O dia de hoje está bem confuso.

Ele inspira lentamente antes de responder.
— Muitas coisas, a maioria você mesmo. Vais sem mim ou qualquer outro criado nesta viagem, não posso te deixar ir despreparado. — Uma má ansiedade enche meu peito.

— Sozinho? Com o olhos vermelhos! Porque?

— Vão em busca do herdeiro do profeta, este só aparece para aqueles que precisam de sua ajuda. Seria muito perigoso mandar o príncipe de Kreg sozinho e o único que está envolvido na professora além dele és tu. Já és um garoto grande e sabes cuidar de si mesmo. Eu confio em ti. Iras nesta missão como representante de toda Castela. — Muita coisa de uma vez só. Como em silêncio enquanto reflito suas palavras. Nó fim usei somente 20 dos 45 minutos para contar a novidade. Minha próxima aula é cartografia e depois estudo das ervas. Provavelmente minha preparação para a viajem. Melhor prestar atenção.
Passamos o resto da refeição em silêncio. Papai termina primeiro e deixa a sala depois de deixar seu prato com uma criada. Depois que termino a minha comida repito o mesmo gesto e Moli me acompanha para a sala de aula.

Como será a viagem? Como é andar de barco? Tudo parece tão exitante que o peso da responsabilidade lentamente desaparece dos meus ombros.

— Também será sua primeira vez fora de Kreg não é Lion?

Eu fiz a pergunta pela força do hábito, mas mesmo assim viro para o lado esperando uma confirmação. Não há ninguém. Olho ao redor, somente Moli se encontra no corredor comigo. Ela me olha com compaixão. Algo dentro de mim quebra. Minha cabeça começa a doer e eu me lembro que aquilo não foi um sonho. Minha respiração fica passada e minhas pernas começam a perder a força. Eu não posso desabar aqui, não agora, na frente dela. Eu corro, pulo escalo. Meu corpo age sozinho, eu não consigo pensar direito. O rosto dele fica cada vez mais vivido. Chego a um ponto onde não tenho mais o que escalar, não posso mais fugir. Olho para baixo e vejo todo o meu lar em miniatura, o lar dele.
Essa deve ser a décima vez que meus olhos ardem desse jeito. Acontece toda vez que me lembro do seu rosto. Meu coração acelera e meu peito dói. Lágrimas correm involuntariamente pelo meu rosto, meu nariz entope. Eu grito em desespero, o  sentimento de perda queima no meu peito. Mesmo que já tenham se passado um ano. Eu grito minha angustia para fora do meu corpo, mas ela só cresce conforme sua imagem vai ficando mais clara nas minhas lembranças.
Eu queria vê-lo de novo.
Só seu sorriso.
O abraçar e rir com ele.
Queria que ele acariciasse meus cabelos uma última vez.
Queria que estivesse ao meu lado para me dar força. Para me motivar a continuar. Minha garganta aranha, minha voz está rouca mas eu não consigo parar de gritar.
Tudo era mais fácil quando estávamos juntos, o mundo era mais brilhante. Sei que sou amado, mas me sinto tão só e perdido!
Meu corpo inteiro arde como se estivesse em brasas. Minhas lágrimas secam. A saudade é substituída por raiva. Grito para que todos ouçam como me sinto.
Sei que não foi culpa dos olhos vermelhos mesmo que eu o odeie. Sei que foi consequência da guerra. Inevitável tragédia que os homens trazem a si mesmos.
Mas nada disso muda a raiva que sinto, a última vez que eu o vi ele estava chorando. Não pude fazer nada para evitar seu destino. Mesmo sendo abençoado com uma colher de prata e dons extraordinários. Não pude fazer nada. Deixei que o tomassem de mim. E ele não se rebelou, ele chorou, mas não revidou. Obediente subiu na carruagem, bravamente lutou no campo de batalha. Mesmo que eu não o tenha visto sei, que ele deu seu máximo até o final. Talvez seja raiva de mim mesmo o que estou sentindo. Eu não estava lá para o apoiar. Ele não tinha ninguém com quem sorrir. E agora eu também não. Dói, sinto como se alguém tivesse cavando a força um buraco no meu peito. Dói tanto que faz a dor na minha cabeça e na minha garganta parecerem arranhões. Eu grito e esmagou as vigas de concreto. Minhas mãos ardem, mas meu peito dói mais. Ele não está mais aqui, é isso. Meu fôlego acaba e eu não posso mais gritar. Minha consciência fica nublada e eu volto a me sentar. Minhas pernas balançam no nada, mas eu não sinto medo. So raiva, mas não tenho ninguém a quem culpar. Raiva vira melancolia e o buraco no meu peito cresce. Eu volto a gritar, mas dessa vez de tristeza. Eu nunca mais o verei. Meu fôlego é fraco sinto minha consciência se esvaindo mas eu não consigo parar de chorar. Ele era gentil e inteligente. Meu irmão mais velho, meu mentor e professor. Ele me estava ao meu lado até quando moli não estava. Quando eu chorava ele vinha me consolar. Mas agora não importa quanto eu chore ninguém vira. Eu olho para traz observando as escadas que levam para baixo da torre do sino. É inútil, ele não vira. Eu volto a chorar. Estou sozinho e ninguém vira. Respiro fundo e tento me acalmar. Chorar não vai mudar as coisas, mas eu não consigo parar. Tento imaginar nós dois correndo pelas muralhas e rindo, mas isso só faz o fato de que ele não está aqui mais doloroso. Eu volto a gritar. Quando meu fôlego acaba pela segunda vez me deixo cair no chão de pedra. E frio e duro, mas não tenho mais forças para levantar. O grande sino paira imóvel sobre mim. Até o som da minha respiração pesada é ampliado pela Câmara do sino. Olhos vermelhos concerteza ouviu tudo. A vergonha não é suficiente para me fazer parar de chorar. Na verdade só me faz me sentir mais patético.
Eu preciso parar de chorar. Preciso pelo menos por agora , esquecer ele. Preciso me concentrar no que tenho agora. A viajem. Verei o mundo de verdade... Sem ele. Uma viagem pode o substituir. Onde a Moli está agora? Ela não me seguiu? Estou mesmo sozinho?

Viro para o lado. Ela estava alí. Esteve o tempo todo. Em silêncio. Ela também está chorando. Ela olha para mim e sorri.
Eu a abraço e volto a chorar. Ele não deixou somente eu sozinho. Seu pai deve sentir muito sua falta também.  O colo da moli é quente e confortável. Eu relaxo meu corpo e me deixo ser levado pela exaustão.


Herdeiros de TheiaOnde histórias criam vida. Descubra agora