8 - Limites

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Ⅴocê é um ser humano estranho —ouvi a voz rouca dizer as minha costas, dei um sobressalto e me virei, engolindo em seco quando a encontrei sentada sobre o balcão da cozinha me olhando atentamente de braços cruzados

— Eu não…

— Eu decidi algo — me cortou — vocês podem ficar aqui, é até bom, me divirto às custas de vocês… mas … quero algo — disse pensativa olhando curiosa o que eu estava fazendo com as laranjas, que no caso era um suco.

— O-o que? — perguntei nervosa, tentando não transparecer isso para ela, mas não funcionou, visto que continuei apertei a laranja que estava na minha mão, deixando o líquido do suco dela cair no chão, fazendo a "fantasma" se divertir com isso.

— Você, fora daquele lugar, que chama de seu quarto, eu costumo ficar ali... gosto da vista para a floresta que a janela proporciona e lá é fresco — deu de ombros, erguendo uma das sobrancelhas olhando para minha, mão, me fazendo perceber, só então, o que eu estava fazendo.

— Mas você… — me interrompi e acenei com a cabeça, não ter um fantasma determinado a te matar (espero) já era um lucro, larguei a laranja na pia e peguei um pano, começando a passar no chão — certo, eu vou para outro lugar.

— Boa garota! — sorriu, revelando os dentes brancos alinhados, com um ar vencedor e superior

Engoli em seco, terminando de limpar o chão para depois desliguei o micro ondas, tirando a torta de frango de lá a pegando e indo, enfim, para a sala.  Me sentei no sofá, e infelizmente, sendo acompanhada pela garota.

— Nunca vi uma dessas — apontou para a televisão — é engraçada... — sorriu fraco olhando para a mesma, ela estava tentando puxar assunto ou sendo inconveniente? Neguei com a cabeça, ignorando isso e comecei a comer minha torta.

— Os… antigos donos não vinham aqui?

— Não, eu consegui me livrar deles, o primeiro proprietário, por volta de cem anos atrás, me prometeu que me deixaria em paz…— me peguei pensativa sobre suas palavras, quantos "anos" ela deveria ter...? —deixaria minha alma descansar...se isso pode ser chamado de descanso — sorriu sem mostrar os lábios — ...às vezes eles vinham aqui, olhavam as condições da casa e saiam, eu não me importava …só não imaginava que a desgraçada de uma das descendentes de Rafaelo Lynch estava vendendo a casa — disse com raiva, cerrando o maxilar.

— Pensei que eles vinham aqui no verão...— comecei a tentar tirar informações dela.

— Eles tinham medo… algo que todos deviam ter — sorriu macabro, me fazendo engolir em seco novamente e desviar os olhos, comendo novamente minha da torta.

— Pode parecer Ridículo…— comecei, voltando a olhar seus olhos verdes tão profundos que me observavam atentamente — mas...você se alimenta de algo?— não me referia a comida, li que "encosto" suga a energia vital, então imaginava que assim ela se mantinha forte.

— Não sinto fome ou vontade de comer, o gosto parece um pouco sem graça, efeitos pós morte — piscou deixando a postura mais desleixada no sofá.

— Claro...então você só… vaga pela casa? — ela pensou, desviando seus olhos dos meus por alguns segundos, me fazendo achar que ela tinha até ficado um pouco sem graça com a pergunta, mas logo os voltou para os meus.

— O que um espírito pode fazer além disso, garotinha?

— É...foi uma pergunta ridícula… eu tenho livros, revistas e alguns mangás no meu quarto…seu quarto — me corrigi quando ela ergueu uma das sobrancelhas.

— Eu sei, já dei um olhada nas suas coisas — resolvi não falar nada sobre, não queria que ela ficasse queimada e me arrancasse o pescoço — era uma das minhas diversões desde que chegaram…além de infernizar a mente dos outros claro…alguns homens que vieram trazer coisas saíram se mijando nas calças…era divertido — sorriu com os olhos brilhando

— Céus — sussurrei chocada, por isso, um deles chegou na minha antiga casa chorando e falando coisas aleatórias, o coitado estava traumatizado, só não imaginava que era por esse motivo.

— Mas prefiro você, é claro, sua cara com medo é excitante — falou neutra, me fazendo a olhar de olhos arregalados, e o coração acelerado — talvez eu faça mais vezes...

Voltei a comer minha torta em silêncio, enquanto pensava em como tudo era tão louco. Eu estava falando com uma fantasma (com uma pequena possibilidade de ser um demônio que, ou queria minha alma, ou queria meu corpo)

— Porque você tem um órgão sexual masculino, Camila?— a olhei novamente, surpresa e horrorizada com sua pergunta, ela me avaliava atentamente, curiosa.

— Como você sabe meu nome? E pri-princ-ipalmente co-co-como sabe is-isso?! — pronto, eu tinha começado a gaguejar.

— Sou uma fantasma, é claro que sei seu nome, não seja ridícula, e... quanto ao resto, foi quando eu entrei em seu sonho e você tentou ter relações comigo… — crispou os lábios — achei algo estranho…mas depois, vi quando você saiu do banho e você realmente tem algo aí — apontou para minha intimidade escondida pela bermuda, eu senti meu rosto queimar e meu estômago se revirar, olhei para o chão constrangida.

— Era... você no sonho erótico — falei nervosa tampando o rosto com as mãos — não devia ter invadido minha privacidade assim…

— Você tentou me agarrar , e até conseguiu um pouco, esfregou isso em mim — falou neutra — eu somente fui ver se era produto da sua mente ou o que era…

Me levantei nervosa cortando suas palavras, e subi as escadas correndo, quando cheguei ao quarto tranquei a porta(mesmo isso sendo inútil) e me encondi debaixo da coberta, enquanto sentia meu estômago se embrulhar e minhas mãos suarem. Eu odiava que qualquer pessoa me visse nua, eu era diferente, não gostava disso, ser julgada, me olharem como se eu fosse uma maldita aberração. Não importa se ela era um fantasma ou qualquer porra, não podia fazer isso.

BRASAS DE FOGOOnde histórias criam vida. Descubra agora