1 - Novo Lar?

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dia estava ensolarado, o sol brilhava forte e o clima estava quente, e isso aumentou ainda mais minha carranca. Eu queria que o dia estivesse como meu humor, nublado.

Neguei com a cabeça, revoltada, pela centésima vez no dia enquanto ouvia uma música indie e olhava a paisagem pelo vidro do carro com a cara fechada.

Não era justo, definitivamente não era justo. Eu passei toda minha vida escolar sozinha, sem amigos ou qualquer coisa do tipo. Ninguém queria ficar perto da garota estranha que gaguejava quando recebia atenção, mesmo que a atenção fosse mínima. Eu preferia acreditar que gostava disso, afinal, não queria que ninguém soubesse que eu era diferente das outras garotas. Então no início do meu segundo ano do ensino médio, quando finalmente eu consegui fazer amizade com um aluno novo do meu antigo colégio, Shawn era o nome dele, que me entendia, pois ele também era diferente e sofria rejeição por isso, e tudo estava flores e arco-íris...e então minha mãe resolveu ir morar em em outro estado.

Isso me tirou do sério, pela primeira vez em anos eu tinha com quem sair no final de semana, tinha com quem rir e falar dos meus problemas adolescentes, e do nada meus pais resolvem se separar? Isso era definitivamente injusto. Não que eu não imaginasse que isso um dia iria acontecer, afinal, mamãe e papai já não eram um casal a anos, me pergunto se um dia eles chegaram a ser realmente, mas não esperava que fosse tão brusco e logo quando eu estava pela primeira vez, um pouco fora da solidão e rejeição social.

— Hija, chegamos — ouvi minha mãe dizer, dando um tapinha na minha perna, ela animada, saiu do carro e foi em direção ao grande portão de ferro, abrindo com um molho de chaves que tirou do bolso abrindo o cadeado que prendia as duas correntes que segurava os dois lados do portão.

Quando mamãe voltou ao carro, e finalmente parou na frente da construção, eu, bufando, sai da caminhonete, segurando minha mochila firme contra o corpo, enquanto olhava ao redor.

O lugar era isolado de tudo e todos, a casa mais próxima era alguns bons quilómetros de distância, nosso quintal era rodeado por muros, algo que eu devo admitir que eu não era familiarizada. Ela era escondida por árvores e mais árvores, com uma pequena estrada de terra frente ao portão de entrada.

A casa era enorme, e linda. Em um estilo de casarão antigo. Com toda certeza, a alguns séculos atrás alguém com muito dinheiro habitava entre aquelas paredes. Ao virar meu rosto pro lado, encontrei minha mãe, ela me olhou também, suspirou e sorriu largo, antes de voltar o olhar para a casa novamente.

— O ar... — inspirou fundo — é tão puro aqui... isso não te acalma? — eu revirei os olhos, e me apoiei na caminhonete de braços cruzados, a olhando com tédio — Vamos, hija! — começou a caminhar até a entrada da casa, eu mesmo que contrariada, a segui — Preparada? — perguntou animada, colocando uma das chaves do molho na fechadura.

— Eu já estive aqui, mamãe — desdénhei, a mulher sem desmanchar o sorriso, abriu a porta me dando espaço para entrar. E admito. Abri a boca ligeiramente, eu já estivesse aqui a algumas semanas atrás, quando mamãe estava fechando a compra, mas a casa estava horrível, parecia as casas de filmes de terror, as paredes desbotadas, janelas quebradas, pó e teias de aranhas pelos móveis antigos, que estavam condenados pelos anos. Mas assim como mamãe, claro que não o admiti em voz alta, vi potencial na casa, suspeitava que uma pintura aqui, um limpeza geral ali, ia fazer milagre, mas com certeza não esperava isso. A casa por fora já estava bem diferente, uma pintura rose, não estava nada estragado ou quebrado, mamãe tinha mandado plantarem algumas flores pelo jardim, e a grama estava cortada. Mas por dentro tudo fora mais chocante, estava bem simpática, com uma pintura em tons claros, tudo parecia em perfeita condição, e o chão não fazia os famosos barulhos de casa antiga que fazia na última vez que estive aqui. Mas agora, com a decoração completa, fotos da família espalhada pelas paredes, móveis novos mas ainda com um ar vintage, e cheirando a canela e rosa-branca, que mamãe dizia ter cheiro de lar, além de trazer boas energias, e não o antigo cheiro de mofo foi impossível não ficar admirada.

O lugar estava magnífico. Não que eu não fosse acostumada a lugares chiques, afinal eu era filha da mulher que conquistou o mundo do jazz nos últimos trinta anos, Sinue Estrabão, e o empresário tão conhecido no mundo imobiliário, Alejandro Cabello, mas o lugar era único e aconchegante, como só Sinue conseguia deixar um ambiente.

— Está... incrível — deixei escapar, mesmo irritada com mamãe, não podia negar seu talentos e elogiar seu trabalho.

— Que bom que gostou, hija... — sorriu — Eu deixei o último cômodo ao lado esquerdo no segundo andar para você. Não mexi na decoração, só está com a cama e o guarda roupa — deixei um pequeno sorriso brincar em meu rosto, mamãe era tão atenciosa, mas eu não podia esquecer que estava brava com ela, então logo fechei a cara novamente, acenando com a cabeça.

— Vou lá — falei ríspida, e sem esperar resposta, subi a escada em espiral para o segundo andar. Quando cheguei ao longo corredor, caminhei para a última porta ao lado esquerdo. Tinha uma janela no final do corredor, mostrava mais árvores... mas tinha um balanço também, preso a duas árvores, achei interessante, e automaticamente senti saudades. Quando eu era criança, me lembro que eu e meus pais íamos ao parque todos os domingos, eles brincavam dizendo que era o dia da família. Será que eles eram felizes? Ou só fingiam na minha frente?

Neguei com a cabeça, espantando esses pensamentos e abri a porta, encontrando um cômodo amplo, a parede onde tinha uma grande janela, provavelmente maior que eu, era a única pintada de amarelo, minha cor favorita, e as outras era de um branco impecável, tinha uma cama de casal grande e um guarda roupas escuro simples, sorri satisfeita pela primeira vez olhando ao redor, eu gostava das coisas do meu jeito, e mamãe sabia disso, pretendia fazer design de interiores por isso.

Então larguei a mochila ao meu lado e abri uma das muitas caixas que estavam ao lado da cama, uma das que estavam escrito em vermelho "roupas" encima, aumentei o volume da música que tocava em meus fones no último, e calmamente comecei a dobrar minhas camisetas, as separando por tons claros, escuros, as de ficar em casa, as de sair e tudo perfeitamente organização.

Desastrada do jeito que eu era, tinha derrubado várias coisas sem nem perceber. Não tinha nem completado de arrumar minhas roupas, quando minha mãe me chamou para o jantar, eu estava cansada pelas longas horas de viagem, então resolvi deixar para arrumar o resto das coisas no outro dia. Suspirando, me levantei e fui me alimentar. Não era nada além de macarrão instantâneo, mamãe também estava cansada, arrumando algumas coisas, e como ainda não tinhamos ido ao mercado, tivemos que se virar com o que mamãe tinha conseguido comprar em um mercadinho nas redondezas daqui. Após comer um pouco, eu somente peguei uma garrafa de água e fui para meu quarto. Tomei um banho com água fria, já que o chuveiro aparentemente estava queimado e mamãe tinha esquecido de verificar esse detalhe, tremendo igual um pinscher, eu somente coloquei uma camisa larga que cabia três Camilas dentro e me dirigi a cama, que mais cedo eu tinha colocado lençóis.

Fiquei toda esparramada lá, em meio ao cobertor e não demorou para eu cair no sono, na repleta escuridão do quarto.

BRASAS DE FOGOOnde histórias criam vida. Descubra agora