Enquanto observava o cenário dos pinheiros cobertos de neve ser substituído pelo clima cosmopolita de Natal, com casas de arquitetura interiorana típicas daquela região da Suíça, Melissa tentava esquecer os motivos que a levaram a passar aquele feriado, tipicamente familiar, sozinha em outro país. Em sua família, bem como na maioria do Brasil, era costume reunir todos os parentes na data comemorativa mais especial do ano. Entretanto, desde a morte de seus avós no último ano, o clima afetivo familiar havia desaparecido, o que levou a matriarca, que agora era a sua mãe, a irmã mais velha do grupo, a cancelar a confraternização anual.
Seus pais, que há muito estavam empenhados em cuidar da frágil saúde de seus avós, aproveitaram a deixa para planejar uma viagem em comemoração às bodas de prata, e fizeram questão de deixar claro aos filhos que seria um programa em casal. Dessa maneira, o irmão de Melissa optou por reunir-se com a família de sua namorada. Os tios, com quem a jovem nem nutria mais tanta intimidade, também fizeram seus planos sem incluir a sobrinha.
Apesar da frustração em passar um Natal completamente solitária, com o tempo a ideia amadureceu no íntimo da médica recém-formada e a levou à escolha de dar o máximo para aproveitar seu fim de ano da melhor forma possível ao invés de encolher-se no sofá e assistir ao especial que era transmitido na TV desde quando nasceu. Afinal, Melissa se deu conta que desde quando começara a sua graduação nunca tivera um tempo exclusivo para si mesma, sempre estava doando todo o tempo livre às pessoas ao seu redor.
Não foi difícil escolher o destino: depois de algumas buscas por destinos turísticos natalinos, os algoritmos finalmente começaram a trabalhar a seu favor e diariamente ela recebia anúncios por e-mail de promoções de passagem, estadia e programas de passeio para os mais diversos lugares. Depois de ler brevemente os prós e os contras de cada país, terminou escolhendo a Suíça. Por que não? O espírito natalino de lá parecia contagiante pelas fotos, os mercados de Natal eram bastante atrativos, a programação era agitada e a culinária parecia deliciosa. Estava decidido. Em menos de uma semana, já estava tudo reservado e Melissa estava pronta para embarcar no mesmo dia se fosse necessário, já que a ansiedade pela primeira viagem sozinha de sua vida a levou a organizar as malas um mês antes da data prevista para o embarque: 20 de dezembro.
Desde então, os dias voaram e a data tão esperada chegou mais cedo que pensava. Depois de conferir milhares de vezes todos os seus documentos, dinheiro e roupas de frio - eram tantas que foi necessário arcar com o custo a mais pela pesagem da bagagem no aeroporto, que excedeu em alguns quilos o permitido - Melissa finalmente cruzou a plataforma de embarque, e em alguns minutos estava decolando do Brasil, direto para o outro hemisfério planetário.
Ao contrário dos meses, que passaram em um piscar de olhos, o vôo pareceu durar uma eternidade diante de tamanha ansiedade para conhecer cada detalhe daquele novo país. Depois de desbravar todo o catálogo de filmes do avião, finalmente uma voz feminina anunciou a frase mais esperada daquela viagem:
— Senhores passageiros, acionem os cintos e permaneçam em seus assentos, o avião aterrisará dentro dos próximos minutos. Esperamos que estejam todos tendo uma excelente viagem.
Melissa respirou fundo e correspondeu às medidas de segurança. Felizmente, todo o restante do processo ocorreu bem, apesar da neve que caía incessantemente e cobria a pista de vôo, obrigando os funcionários a limparem todo o gelo entre um avião e outro. No aeroporto, a jovem pegou suas variadas bagagens e seguiu até a estação ferroviária, onde embarcou em um trem que, bem como todo o restante da capital, estava decorado no clima natalino, já anunciando a fantástica experiência que teria dali até chegar aos Alpes Suíços, o lugar magicamente perfeito para aquela data comemorativa.
Agora, enquanto a diminuição da velocidade da locomotiva indicava que a estação de desembarque estava próxima, Melissa podia finalmente perceber que talvez tudo na vida ocorresse por algum motivo. Talvez o Natal não seja apenas uma data de troca de presentes entre um grupo de pessoas, mas também uma data para presentear a si mesmo. Talvez a magia da data se encontre em compartilhar o espírito de bondade em qualquer lugar, e não apenas na mesma sala de jantar de todos os anos. Talvez todos aqueles acontecimentos tivessem um propósito: o de proporcionar a ela uma experiência de autoconhecimento que há muito tempo estava negligenciada na rotina corrida do trabalho e dos estudos.
E foi com essa pretensão de fazer daquela viagem uma experiência inimaginável que Melissa desceu do trem, pisando na neve diretamente com o pé direito. Depois de pegar todas as suas malas, que formavam uma pilha que chegava quase aos seus 158 centímetros de altura, a jovem se deu conta de que seria impossível levar todas aquelas bagagens sozinha ao hotel, que apesar de não ficar tão longe da estação, contava com um longo caminho coberto de neve até lá. Assim, depois de conseguir um táxi, que a seu pedido passaria pelo percurso mais longo, para que pudesse ter uma primeira impressão daquela cidadezinha interiorana tão reconfortante, finalmente partiu no primeiro passeio de muitos que ainda estavam por vir naquela viagem.
Durante o caminho, Melissa tornou-se ainda mais encantada pelo lugar - e era mágico como o encanto natalino, tão ressaltado pelos anúncios de viagem que recebeu nos últimos meses, não era apenas um jogo publicitário - as luzes, a composição paisagística das ruas da cidade, a neve e o clima frio, absolutamente todos os mínimos detalhes daquele vilarejo remetiam aos filmes clássicos de Natal. Por mais que o feriado brasileiro tivesse um cenário bastante diferente, aquela novidade era mais que suficiente para suprir a confraternização anual da família, mesmo sendo completamente oposta.
Ao chegar no hotel, a estrutura de um dos prédios mais imponentes da cidade também não deixou de impressionar a jovem. A arquitetura romântica do prédio fascinou Melissa em cada detalhe, e em nenhum ponto deixou de condizer com a luxuosidade descrita pelo agente turístico da agência que havia fechado o seu pacote. A hospedagem por si só era tão encantadora que se todos os programas da viagem estivessem resumidos em apenas explorar aquela propriedade a moça já estaria suficientemente satisfeita em aproveitar aqueles dias de descanso no lugar de clima frio. Logo atrás da estalagem, uma das montanhas imponentes encerrava magistralmente a composição da paisagem, fazendo os olhos da turista cintilarem.
— Senhorita? — o motorista que aguardava Melissa com as malas chamou a atenção da jovem, que parecia paralisada.
— Ah, perdão! — respondeu ela, piscando os olhos ao despertar do transe em que estava imersa. A jovem seguiu até o interior do hotel, que ao contrário do exterior, aconchegava todos as pessoas dispostas pelo hall com o calor proporcionado por uma enorme lareira que saltava chamas em um dos cantos do salão. O motorista, que estava praticamente escondido entre a pilha de malas, finalmente pôde repassar aquele fardo para um funcionário do hotel, que seguiu com as bagagens até o elevador de serviços.
— Aqui está o seu pagamento, muito obrigada!
Além do preço habitual da corrida, Melissa fez questão de também deixar uma generosa gorjeta para o motorista, afinal, era uma enorme gentileza fazer aquele tour improvisado pela cidade e ainda carregar todo aquele volume para ela.
Depois de finalizar os procedimentos de entrada no hotel, ao contrário do habitual - que seria partir diretamente para o quarto - Melissa foi diretamente para o hall de jantar da hospedagem. Afinal, que maneira melhor de avaliar um lugar do que pela gastronomia dele?
Por sorte, o jantar ainda estava sendo servido, e a jovem conseguiu experimentar boa parte dos pratos que compunham o imenso buffet do hotel. Era impossível para Melissa não ficar apaixonada pela culinária do país: quase todos os pratos envolviam aquilo que ela mais amava na gastronomia - batata e queijo.
Depois de terminar o jantar - que Melissa sequer conseguiu guardar espaço para a sobremesa - a jovem subiu para o quarto, que apesar de não ser da categoria dos melhores do hotel, em nada deixava a desejar. Além de uma pequena lareira, a cama e uma cômoda, uma sacada com vista direta para as montanhas fazia daquele lugar um dos mais aconchegantes que ela poderia imaginar além de sua casa.
O banho, apesar de relaxante, não durou muito tempo. Em poucos minutos Melissa sentiu os efeitos da diferença de fuso horário e estava quase cochilando ali mesmo na banheira. Quando deitou-se naquele mar de cobertores que compunha o jogo de cama, não demorou mais que um minuto para que ela adormecesse completamente.
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Amor de Natal
RomanceMelissa é uma jovem recém formada, que após o cancelamento da confraternização anual de sua família, se vê deslocada entre os parentes e amigos na noite mais especial do ano. Diante da solidão que a aguardava, a moça decide reverter aquilo que seria...