30. SENTIMENTOS ADORMECIDOS

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Há muitos caminhos para chegar ao mesmo lugar.

Não se recordava o momento, lugar ou autor daquelas palavras, mas jamais sentiu que pudesse haver tantos caminhos e estar justamente onde queria, pelo único caminho que sempre evitava – o destino— com a segurança que independente de chantagens, testamento ou culpa, estaria ali.

Esticando a mão, Emilia deixou escapar um suspiro, ao sentir a febril pele do homem encolhido em meio a enorme cama, envolto em tantas cobertas e lençol, que ela não saberia distinguir, mas ainda assim tremulo.

Desde que chegara, há 2 horas, ele havia ficado ali, imóvel, suavemente ronronando palavras desconexas e inaudíveis e tão quente – muito quente – o que a apavorava, pois ele estava daquele jeito por ajudá—la a trocar um pneu. Não que estivesse retribuindo a ajuda e ele sabia ser mais resmungão que ela para se negar a ser ajudado. Certamente se não fosse a forte exaustão que acometia seu corpo, ele não teria permitido ser ajudado.

Inspirando o ar entre as narinas, Emilia deslizou seu corpo até a cadeira que havia aproximado da cama – praticamente jogando seu corpo – o encarou.

Pela primeira vez em meses, Tobias  não parecia Tobias . Será que isso era lógico? Questionou—se, contorcendo os lábios e estreitando os olhos. Mas ele parecia tão indefeso, um homem que ela não conhecia por completo, mas queria faze—lo, certamente queria.

— Perdão — em um balbuciar tão incoerente, aquelas palavras escaparam da boca do enfermo diante de si — Perdão — suspirou, remexendo o corpo sobre a cama.

Seus ouvidos se tornaram exigentes para ouvir mais, enquanto seus olhos contemplavam a cena preocupada e curiosa, repousando as mãos no apoio o encarou em silêncio.

— Emilia — suspirou sem humor algum.

Inclinando seu corpo, ela buscou qualquer gesto que indicasse que ele estava acordado. Mas seus olhos continuavam fechados e seus lábios entre abertos – devido a estar congestionado – e sua cabeça estava imóvel em direção ao teto.

Enquanto os segundos se tornavam mais presentes a ponto de fazê—la perder a exata noção do tempo. E de repente. Preguiçosos, aqueles olhos verdes se revelaram.

— Est... Água — com os lábios secos e a voz rouca proferiu.

Quase dando um salto da cadeira, agarrou o copo ao lado da cama – sobre um criado mudo – e encheu com o liquido da jarra. Entregando o transparente copo em suas mãos, ele virou em um gole.

— Quer mais?

Ele fez que não, enquanto seu corpo parecia se afundar mais e mais entre os lençóis cinza. Realmente parecia exausto.

— Eu ... — e suas palavras foram interrompidas por uma pesada tosse.

Seu corpo se inclinou para frente, enquanto a tosse persistia e ela se sentia impotente.

— Eu— suspirou mais coerente — Preciso de um banho — decretou, girando a cabeça e a encarando com as pálpebras baixas.

— E lençóis limpos — supôs, curvando os lábios em busca de fazê—lo se sentir melhor.

Ele assentiu. Tentando curvar os lábios. Enquanto jogava o amontoado de cobertas sobre seu corpo, revelando a camiseta branca ensopada de suor e os lençóis em parecido estado.

— Eu ... — prontamente ela agarrou o braço dele.

— Eu posso sozinho — contrariado, garantiu.

— Tobias — rebateu.

Em um resfolego ele se pôs em pé –mesmo cambaleando— curvando os lábios sem humor para ela, enquanto tentava se equilibrar em passos lentos e largos.

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