29. LOUCURAS À PARTE

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— Um copo grande de café, com leite de soja e sem açúcar — pediu apressadamente a jovem diante de si.

Encarando o fundo da bolsa de couro pendurada em seu antebraço – procurou a carteira – mas foi a luz de seu celular que chamou a atenção. Agilmente agarrou o aparelho, encarando novamente o mesmo nome na tela que das últimas 30 ligações anteriores – e de um dia atrás – e horas: Desconhecido

Por culpa daquele desconhecido, havia ficado sem bateria na noite passada, em meio a chuva, com o pneu furado. Sem mencionar o fato de despertar com o zumbido do vibracal, devido a incessante chamada.

— Aqui está — anunciou aquela suave voz feminina roubando seus pensamento.

— Obrigado — suspirou, esquecendo o aparelho e agarrando o dinheiro.

Agarrando o fumegante copo girou os calcanhares, a mulher de cabelos castanhos, trajando um vestido estampado sob o casaco, retumbando seu salto sobre o piso, distraída, enquanto seus lábios bebericavam o quente e reconfortante liquido.

Gentilmente um senhor de idade segurou a porta de vidro para sua passagem, o que a obrigou retribuir com um sorriso sincero de agradecimento, enquanto o gélido ar de Madrid batia sobre suas roupas.

— Até quando pretende ignorar minhas chamadas? — inqueriu uma voz feminina não tão longe, mas não perto o suficiente.

Prontamente seus olhos encararam uma figura que se fazia conhecida – uma imagem perdida em suas memórias – mas a pele clara, olhos escuros tal qual o cabelo, não se faziam estranhos. Forçando a mente, manteve—se parada, encarando a mulher que parecia ter todos os motivos para condena—la, mas nenhum para realmente executa—la.

Lisa Cacéres

— Precisamos conversar senhorita Field  — anunciou diretamente.

Encarando o pálido teto de gesso, enquanto alguns gritos, risadas e murmúrios alcançavam seus tímpanos, remexeu—se sobre o assento uma vez mais, esfregando uma mão na outra, não evitou inquerir—se uma vez mais.

Por que diabos estou aqui?

Talvez pelos motivos nada claro de Lisa. Ou quem sabe por pena. Muito provavelmente curiosidade. Ou realmente nem ela soubesse porque ali estava, em Córdoba.

Seria fácil ignorar uma realidade que a pouco deixaria de ser sua – ou talvez nunca fora – afinal aquele problema era do Tobias , não dela. Não queria se envolver na vida dele por tantos motivos que ela própria desconhecia, mas não conseguia evitar não se envolver.

E bastou um pedido. Um pedido de uma desconhecida. E lá estava ela, arfando o ar entre as narinas e cruzando as pernas pela milésima vez. Fingindo estar em uma reunião de negócios e desejando não ser perturbada.

Felizmente a única pessoa capaz de descobrir seu paradeiro havia sumido naquele dia, como um milagre Tobias  não havia cumprido sua promessa de se vingar e não ligou em nenhum momento desde que a deixou depois de trocar seu pneu, um gesto que ela não queria pensar, afinal não poderia voltar a vê—lo como uma possibilidade de porto seguro.

Contudo lá estava ele: em sua mente. E no presente, encarando seus dedos, fixou o olhar no brilhante diamante reluzente em seu dedo –não raro se pegava fazendo aquilo – pensando no momento em que ele não estaria mais ali e por algum motivo – que ainda não queria compreender – algo lhe dizia que a solidão voltaria ser sua companhia e aquele lugar seguro, que representava um lar, se ruiria. Porém sabia que se não fosse assim fugiria, simplesmente fugiria como uma covarde, onde sentia—se presa em algo que pudesse acabar consigo.

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