Capítulo XX - A Última Cidadela

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    Aledrac era a face do medo. Não se encontrava uma única pessoa nas ruas pavimentadas de tijolos de pedra. Deixaram as enormes muralhas às costas, após atravessarem as duas muralhas completamente invisíveis.

    O feitiço perdeu o efeito quando todos já atravessaram os portões, mas não se preocuparam em se esconder. Os homens nas muralhas estavam mais ocupados observando a movimentação do Duque de Lerna.
     Se direcionaram à uma caserna atulhada de soldados aledracos em período de descanso. Gerald abriu a porta sem sequer bater, adentrando no salão principal onde os homens comiam em mesas de madeira, o local era iluminado por uma lareira que rugia.
    Receberam olhares de confusão, os menos bêbados sacaram suas espadas. Darkus e Aella quase fizeram o mesmo, mas o Rei da Montanha interviu.
    - Sou Gerald de Elizaet, Rei da Montanha, Senhor de Engarth, Conquistador dos Vagnos e Matador de Dragões.- Disse o cavaleiro com seu tom seco e ríspido. - Gostaria de falar com seu rei, avisem-o que cheguei.-
      Todos embainharam as espadas.

     Andaram longamente pelos estabelecimentos, prédios e bairros residenciais. No meio do caminho também encontraram as luxuosas e enormes mansões que pertenciam aos nobres e comerciantes ricos que compunham a alta sociedade de Aledrac.
    Naquela cidade e cultura tanto os nobres quanto comerciantes ricos tinham poderes equivalentes na prática, os nobres com seu alto nascimento e os burgueses com seus cofres cheios de ouro. Nas épocas de guerra, segundo dissera Gerald há tempos atrás, essas famílias colocavam seus estandartes na frente de suas casas.
   E era verdade, agora o rapaz havia roseiras douradas em fundo azul, luas crescentes em fundo negro, espadas cruzadas em fundo verde e moedas de ouro em fundo rosa. Enquanto andavam mais e mais, encontraram a maior das mansões que havia, com belos estandartes de uvas vermelhas em fundo verde.
   - Os Alarte são os das crescentes, os Vennile são os das uvas. Os Vennile são os mais ricos de Aledrac, são donos das vinícolas de Colinas de Cobre.- Comentava Anya animada, a alegria dela fez Darkus dar um sorriso apesar do nervosismo.
    No centro da cidade havia uma praça e um pequeno lago com uma estátua no centro. A estátua era de um homem vestido de armadura e manto, com um martelo em uma mão e um escudo na outra. Olhando melhor, na base da estátua estava "Alesar I de Albechior, Primeiro Martelo de Vau Thyr e Construtor das Muralhas Internas".
    " É um homem bem amado para ter uma estátua no centro da cidade, talvez tenha algo haver com essa construção das muralhas. São uma das glórias de Aledrac." pensou o Bastardo de Primavera.
      Passaram pela Biblioteca de Aledrac, uma grande construção fortificada que além de abrigo para os vários registros históricos e livros armazenados por séculos, também servia de refúgio em caso de invasão. Nunca havia sido necessário, Aledrac nunca caiu.
     Dentro do lago, erguido em uma ilha no meio da água e atrás da estátua, estava um enorme palácio que abrigava o governo e a nobreza da corte. Em uma cidade de pedra escura, o palácio contratava com um cinzento claro, só sendo possível ser acessado através de barcos. E assim foram, os soldados os colocaram em duas embarcações à remo que partiram pelas águas calmas do Lago Virtuoso.
     - Se portem bem, em breve iremos descobrir a real situação de Aledrac, embora não pareça que seja esperançosa.- Comentou Gerald, sentado à popa enquanto o barqueiro remava, demoraram quase uma hora para aportar à frente do palácio.  

    Foram guiados por dezenas de corredores até o enorme salão de reuniões do palácio. Uma grande quantidade de assentos havia sido disposta, assentos esses que estavam sendo ocupados por representantes das famílias nobres e comerciantes cujas tão humildes moradias haviam visto no caminho, com ricos estandartes à vista.
      O rei, em seu cadeirão de madeira rica com gravuras de ouro e rubis, era mais exótico para o bastardo do que régio. O Rei de Aledrac era um homem extremamente magro, sua pele parecia colada ao osso, e uma farta barba branca lhe cobria o queixo sem estar acompanhada por um bigode. Era calvo e usava uma belíssima coroa de jade ornada com relevos de ouro e obsidiana.
    Gerald não se curvou, e aquilo preocupou Darkus. Era uma corte estrangeira, mas aquele costume provavelmente era respeitado ali.
     Um dos nobres falou no ouvido do rei em uma língua que o bastardo não sabia, provavelmente a língua do sul da qual Anya guardava sotaque.
    O rei concordou com a cabeça e afastou o conselheiro com uma mão repleta de anéis e pulseiras cravejadas de pedras preciosas. Ele falou na língua do norte, mas Darkus queria não ter entendido.
     - Meus conselheiros dizem que vocês não são convidados, isto é, não foram formalmente convocados para Aledrac. Dizem que com certeza são traidores por trazerem essa imundice....- O homem cuspiu aos pés de Anya, fazendo a garota demônio recuar. - ...para dentro de nossos portões. Essas criaturas abomináveis e selvagens agora cercam nossas muralhas!-
      Gerald franziu o cenho com tanta força que era de se surpreender que não houvesse passado aqueles aledracos à fio de espada. Anya o segurou, mas Darkus já estava com os dedos fechados sobre o cabo da espada.
     - Me acusa de traição, Sua Graça? Logo quando envio doze mil homens para defender vossa cidade às vésperas do Duque de Lerna atravessar e queimar os urzais das Colinas de Ferro? Quando sou eu que venho para trazer a vitória? Tragam os homens que enviei para cá, ou ao menos os comandantes.- Disse o Rei da Montanha, e dos aposentos no palácio são chamados Adelard, Rymond, os capitães mercenários e os chefes tribais vagnos, todos que compunham o exército liderado por Gerald de Elizaet.

  - Falas sobre vitória, meu senhor, quando tudo está perdido. Aledrac irá cair logo, contratarei um punhado de navios para levar a corte até vossas terras. Meus conselheiros dizem que toda a produção de uvas nas Colinas de Ferro fora destruída, Vau Thyr foi devastada e as terras agrícolas saqueadas.- O rei parecia um covarde, Darkus não gostava dele. - Acabou-se!-
     Os nobres e burgueses pareciam ter uma memória terrível, levando em conta que a dinastia que aconselhavam ordenou a prisão e morte de seus antepassados. Darkus não questionou, Gerald falara para se comportarem.
     Mas Gerald não parecia estar calmo, parecia furioso.
      - Mas que crime vil você cometeu, meu senhor! Que covardia! Nunca vi um rei capaz de algo tão sujo. Irá abandonar sua cidade à própria sorte, fugir para um local seguro e entregar seu povo sem sequer lutar? Seu reino vem de uma história honrosa, resistiu à inúmeros ataques e não sucumbiu por ter líderes valorosos que prezavam Aledrac acima de tudo.-
     " Suas ações não são nada menos do que desrespeitosas. Você joga fora tudo oque seus antepassados e os antepassados desses homens fizeram para o lixo por causa de covardia. Nenhum homem deve continuar leal àquele que não é leal à própria pátria, em minha terra nenhum ser iria se curvar, não és digno nem de seu mais inútil criado."
      - O que está insinuando, pedinte de Engarth?!- O Rei de Aledrac estava colérico, nobres e burgueses se ergueram de seus assentos, pensativos. Naquele mesmo momento aqueles que o cavaleiro requisitou atravessavam a porta.
      - Já que a Coroa de Aledrac é podre de ferrugem e seus homens se tornaram fracos sem qualquer honra, terei de eu mesmo salvar o seu povo. Chame seus navios e vá, deixe a cidade comigo. Parta para os darlos ou Asgaetia, que seja. Convido todos os homens nesse salão à jurarem suas espadas à mim e defenderem a Última Cidadela!-
      As palavras de Gerald causaram um efeito enorme na moral dos homens, aquele que estava em pé como um pediente agora fizera vários se ergueram de suas cadeiras. Ao verem a desvantagem, os poucos legalistas que sobravam não demoraram mais que dois segundos para virar a casaca. Aquele era o bom de homens de posse, amavam as suas mais do que qualquer coroa.
      Guardas não se ergueram contra o desafio. Os comandantes de Gerald se curvaram diante dele, assim como Darkus, Aella e Anya.    
    - A Última Cidadela não irá ruir sem lutar.- Proclamou Gerald de Elizaet. - Por agora serei seu campeão.-
    
 

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