Aledrac era a face do medo. Não se encontrava uma única pessoa nas ruas pavimentadas de tijolos de pedra. Deixaram as enormes muralhas às costas, após atravessarem as duas muralhas completamente invisíveis.O feitiço perdeu o efeito quando todos já atravessaram os portões, mas não se preocuparam em se esconder. Os homens nas muralhas estavam mais ocupados observando a movimentação do Duque de Lerna.
Se direcionaram à uma caserna atulhada de soldados aledracos em período de descanso. Gerald abriu a porta sem sequer bater, adentrando no salão principal onde os homens comiam em mesas de madeira, o local era iluminado por uma lareira que rugia.
Receberam olhares de confusão, os menos bêbados sacaram suas espadas. Darkus e Aella quase fizeram o mesmo, mas o Rei da Montanha interviu.
- Sou Gerald de Elizaet, Rei da Montanha, Senhor de Engarth, Conquistador dos Vagnos e Matador de Dragões.- Disse o cavaleiro com seu tom seco e ríspido. - Gostaria de falar com seu rei, avisem-o que cheguei.-
Todos embainharam as espadas.Andaram longamente pelos estabelecimentos, prédios e bairros residenciais. No meio do caminho também encontraram as luxuosas e enormes mansões que pertenciam aos nobres e comerciantes ricos que compunham a alta sociedade de Aledrac.
Naquela cidade e cultura tanto os nobres quanto comerciantes ricos tinham poderes equivalentes na prática, os nobres com seu alto nascimento e os burgueses com seus cofres cheios de ouro. Nas épocas de guerra, segundo dissera Gerald há tempos atrás, essas famílias colocavam seus estandartes na frente de suas casas.
E era verdade, agora o rapaz havia roseiras douradas em fundo azul, luas crescentes em fundo negro, espadas cruzadas em fundo verde e moedas de ouro em fundo rosa. Enquanto andavam mais e mais, encontraram a maior das mansões que havia, com belos estandartes de uvas vermelhas em fundo verde.
- Os Alarte são os das crescentes, os Vennile são os das uvas. Os Vennile são os mais ricos de Aledrac, são donos das vinícolas de Colinas de Cobre.- Comentava Anya animada, a alegria dela fez Darkus dar um sorriso apesar do nervosismo.
No centro da cidade havia uma praça e um pequeno lago com uma estátua no centro. A estátua era de um homem vestido de armadura e manto, com um martelo em uma mão e um escudo na outra. Olhando melhor, na base da estátua estava "Alesar I de Albechior, Primeiro Martelo de Vau Thyr e Construtor das Muralhas Internas".
" É um homem bem amado para ter uma estátua no centro da cidade, talvez tenha algo haver com essa construção das muralhas. São uma das glórias de Aledrac." pensou o Bastardo de Primavera.
Passaram pela Biblioteca de Aledrac, uma grande construção fortificada que além de abrigo para os vários registros históricos e livros armazenados por séculos, também servia de refúgio em caso de invasão. Nunca havia sido necessário, Aledrac nunca caiu.
Dentro do lago, erguido em uma ilha no meio da água e atrás da estátua, estava um enorme palácio que abrigava o governo e a nobreza da corte. Em uma cidade de pedra escura, o palácio contratava com um cinzento claro, só sendo possível ser acessado através de barcos. E assim foram, os soldados os colocaram em duas embarcações à remo que partiram pelas águas calmas do Lago Virtuoso.
- Se portem bem, em breve iremos descobrir a real situação de Aledrac, embora não pareça que seja esperançosa.- Comentou Gerald, sentado à popa enquanto o barqueiro remava, demoraram quase uma hora para aportar à frente do palácio.Foram guiados por dezenas de corredores até o enorme salão de reuniões do palácio. Uma grande quantidade de assentos havia sido disposta, assentos esses que estavam sendo ocupados por representantes das famílias nobres e comerciantes cujas tão humildes moradias haviam visto no caminho, com ricos estandartes à vista.
O rei, em seu cadeirão de madeira rica com gravuras de ouro e rubis, era mais exótico para o bastardo do que régio. O Rei de Aledrac era um homem extremamente magro, sua pele parecia colada ao osso, e uma farta barba branca lhe cobria o queixo sem estar acompanhada por um bigode. Era calvo e usava uma belíssima coroa de jade ornada com relevos de ouro e obsidiana.
Gerald não se curvou, e aquilo preocupou Darkus. Era uma corte estrangeira, mas aquele costume provavelmente era respeitado ali.
Um dos nobres falou no ouvido do rei em uma língua que o bastardo não sabia, provavelmente a língua do sul da qual Anya guardava sotaque.
O rei concordou com a cabeça e afastou o conselheiro com uma mão repleta de anéis e pulseiras cravejadas de pedras preciosas. Ele falou na língua do norte, mas Darkus queria não ter entendido.
- Meus conselheiros dizem que vocês não são convidados, isto é, não foram formalmente convocados para Aledrac. Dizem que com certeza são traidores por trazerem essa imundice....- O homem cuspiu aos pés de Anya, fazendo a garota demônio recuar. - ...para dentro de nossos portões. Essas criaturas abomináveis e selvagens agora cercam nossas muralhas!-
Gerald franziu o cenho com tanta força que era de se surpreender que não houvesse passado aqueles aledracos à fio de espada. Anya o segurou, mas Darkus já estava com os dedos fechados sobre o cabo da espada.
- Me acusa de traição, Sua Graça? Logo quando envio doze mil homens para defender vossa cidade às vésperas do Duque de Lerna atravessar e queimar os urzais das Colinas de Ferro? Quando sou eu que venho para trazer a vitória? Tragam os homens que enviei para cá, ou ao menos os comandantes.- Disse o Rei da Montanha, e dos aposentos no palácio são chamados Adelard, Rymond, os capitães mercenários e os chefes tribais vagnos, todos que compunham o exército liderado por Gerald de Elizaet.- Falas sobre vitória, meu senhor, quando tudo está perdido. Aledrac irá cair logo, contratarei um punhado de navios para levar a corte até vossas terras. Meus conselheiros dizem que toda a produção de uvas nas Colinas de Ferro fora destruída, Vau Thyr foi devastada e as terras agrícolas saqueadas.- O rei parecia um covarde, Darkus não gostava dele. - Acabou-se!-
Os nobres e burgueses pareciam ter uma memória terrível, levando em conta que a dinastia que aconselhavam ordenou a prisão e morte de seus antepassados. Darkus não questionou, Gerald falara para se comportarem.
Mas Gerald não parecia estar calmo, parecia furioso.
- Mas que crime vil você cometeu, meu senhor! Que covardia! Nunca vi um rei capaz de algo tão sujo. Irá abandonar sua cidade à própria sorte, fugir para um local seguro e entregar seu povo sem sequer lutar? Seu reino vem de uma história honrosa, resistiu à inúmeros ataques e não sucumbiu por ter líderes valorosos que prezavam Aledrac acima de tudo.-
" Suas ações não são nada menos do que desrespeitosas. Você joga fora tudo oque seus antepassados e os antepassados desses homens fizeram para o lixo por causa de covardia. Nenhum homem deve continuar leal àquele que não é leal à própria pátria, em minha terra nenhum ser iria se curvar, não és digno nem de seu mais inútil criado."
- O que está insinuando, pedinte de Engarth?!- O Rei de Aledrac estava colérico, nobres e burgueses se ergueram de seus assentos, pensativos. Naquele mesmo momento aqueles que o cavaleiro requisitou atravessavam a porta.
- Já que a Coroa de Aledrac é podre de ferrugem e seus homens se tornaram fracos sem qualquer honra, terei de eu mesmo salvar o seu povo. Chame seus navios e vá, deixe a cidade comigo. Parta para os darlos ou Asgaetia, que seja. Convido todos os homens nesse salão à jurarem suas espadas à mim e defenderem a Última Cidadela!-
As palavras de Gerald causaram um efeito enorme na moral dos homens, aquele que estava em pé como um pediente agora fizera vários se ergueram de suas cadeiras. Ao verem a desvantagem, os poucos legalistas que sobravam não demoraram mais que dois segundos para virar a casaca. Aquele era o bom de homens de posse, amavam as suas mais do que qualquer coroa.
Guardas não se ergueram contra o desafio. Os comandantes de Gerald se curvaram diante dele, assim como Darkus, Aella e Anya.
- A Última Cidadela não irá ruir sem lutar.- Proclamou Gerald de Elizaet. - Por agora serei seu campeão.-
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O Trono de Ossos - Livro Um
FantasyVestroya, que impedia a passagem dos monstros aos Reinos dos Homens, caiu. O reino outrora poderoso, caiu perante as criaturas das trevas que se banquetearam sob as ruínas da cidade-estado e seus cadáveres. Nova Asgaet, Hyldren e os Estados Pontífic...