O primeiro golpe acertou a primeira criatura da cintura para cima, o sangue jorrou em cima de Gerald e Darkus.O garoto gritou horrorizado, suas vestes agora estavam cobertas de vermelho e um goblin verde e vestido de peles estava caído aos seus pés, imóvel.
Mais goblins saltaram pela mata, erguendo armas e gritando em uma língua asmática e ruidosa.
- Garoto, se esconda e ataque apenas se algum estiver no seu caminho!- Falou Gerald em um tom alto, para deixar ser ouvido durante a chegada dos guerreiros verdes.
Darkus à primeiro momento quase contestou a ordem, ainda aflito demais para falar, porém cedeu. Virou para trás e procurou com um olhar desesperado alguma pedra no caminho, mas o som de Gerald combatendo os goblins lhe chamou a atenção.
O garoto novamente se virou e enxergou o cavaleiro alto erguendo uma espada longa de duas mãos e descendo contra inimigos baixos. Gerald não se achava à toa, a sua lâmina se movia como parte de seu braço e penetrava nas camadas de pele de raposa, tecido e carne, alguns golpes mais precisos decepando até membros.
Um pressentimento trouxe Darkus de volta à realidade quando ouviu o vento assobiar próximo, e o menino abaixou instintivamente para escapar do ataque. Um goblin estava parado à sua frente, as mãos de dedos longos levando um machado pesado de obsidiana, e não parecendo muito amigável.
O machado voltou à tentar ferir Darkus, e o garoto deu alguns passos desajeitados para o lado, mas seu pé prendeu. Um emaranhado de ervas havia se enrolado em seus tornozelos e puxou o garoto contra a terra como se usando a força de um demônio. Suas mãos nervosas e tremidas apalparam em busca de algo para se salvar sua vida, ameaçada pelo golpe do goblin.
A mão do menino agarrou o cabo do facão de caça em sua cintura e tirou a arma da bainha de couro, o aço saiu de sua prisão e se prendeu contra o pescoço da criatura.
O goblin soltou um ruído sufocado e o sangue espirrou do buraco para a lâmina do facão, molhando o braço até o cotovelo. O olhar de Darkus se fixou aterrorizado no goblin que se debatia descontrolado no chão, a boca espumando sangue.
- Socorro..- Murmurou o garoto, se libertando das ervas que prendiam seu pé com um puxão forte e se ajoelhando ao lado da criatura moribunda. O goblin olhou para o jovem em um olhar de súplica, olhos negros e profundos encontrando os vermelhos do órfão. Logo, um daqueles pares já não podia ver e o pequeno monstrinho já parara de se debater.
"Por que tem que ser tão difícil?" Perguntou o menino à si mesmo.
Darkus analisou tristemente o cadáver, reparando nos detalhes do goblin pela primeira vez. Pouco passava da metade do tamanho do garoto, mas agora parecia ainda mais encolhido na morte.
Sua pele verde tinha uma tonalidade mais acinzentada, e seus membros eram longos e ossudos. O rosto parecia animalesco e enrugado, olhos redondos e orelhas anormalmente grandes.
No cinto de corda do goblin havia uma espada humana, provavelmente não usada por não servir bem nas mãos da criatura, que preferia os machados rústicos de sua espécie. Darkus pegou seu pequeno saque e observou a espada longamente.
Em uma análise mais precisa, deveria ser considerada um gládio, curta e larga. Faixas de couro desgastado ficavam enroladas no cabo, deixando-o mais macio para segurar. A lâmina era de ferro e parecia ainda afiada, oque indicava que fora roubada recentemente.
Lançou uma última olhada para a sua vítima e segurou a espada com firmeza na mão suada e ensanguentada, se lançando à corrida para procurar Gerald.
" Não vou me esconder..já me decidi.."
Sua visão se ampliou e notou que a batalha ainda não havia cessado. Gerald cambaleava e matava um número expressivo de goblins, duelando com alguns dos mais habilidosos.
Darkus correu para trás de um e desceu o gládio com força, um golpe que fez uma ferida ensanguentada se abrir nas costas nuas do goblin. A criatura se virou para trás e recebeu um rombo na face.
Antes mesmo da criatura ter caído, Darkus já havia partido para auxiliar Gerald contra outro oponente. A maça da criatura voou pesada contra o rosto de Darkus, mas feriu apenas superficialmente o ombro.
A criatura desmontou com a espada trespassando por entre as costelas, liberando tripas vermelhas no chão. As grotescas serpentes sangrentas pareciam grandes demais para um ser tão pequeno.
O cavaleiro ao seu lado já olhava para os cadáveres ao redor e depois para a mata. Parecia estar contando com muita dificuldade os corpos estirados pela trilha.
- Pelo que eu contei, parecem ser mais ou menos dezoito. Pelo que eu sei de goblins, isso aqui sequer pode compôr uma tribo. Talvez fossem proscritos em sua aldeia e vieram atrás de saques.- Disse Darkus olhando ao redor, para os corpos ao seu entorno.
- Como conhece tanto sobre goblins?- Indagou Gerald, em um tom bastante surpreso.
O garoto encolheu os ombros.
- Vivo em Vila Primaveril há treze anos, goblins são bastante comuns nas redondezas, mas geralmente quem lida com eles é a guarnição da vila. Nunca pensei que..- Mas não precisou terminar a frase, porque o cavaleiro assentiu.
- Procure rastro dos cavalos, devem ter fugido para longe por causa da luta. Apesar de ser mais adequado ir à Passo Verde à pé, não me sinto tão disposto.- Gerald deu uma gargalhada e se sentou em um canto da estrada vazia, tirou um pouco de couro e começou à limpar a espada calmamente.
Darkus assentiu com cansaço e começou à andar seguindo as pegadas dos cavalos na terra. Encontrou os animais não muito longe, pastando em uma clareira no interior da Floresta.
Por viver naquele entorno há muito tempo, conseguiu passar pelos troncos velhos sem grande dificuldade e pegar os animais pelas rédeas. Acariciou o pelo dos cavalos para os acalmar, para não correr o risco de levar uma reação furiosa, e saiu puxando as montarias.
Darkus fez o caminho evitando pisar nos goblins mortos, tanto por temor quanto por uma tentativa esquisita de prestar respeito.
Quando passou as rédeas em silêncio para o cavaleiro, o garoto não pode evitar em pisar no horrendo interior despejado de uma das criaturas, e não pode aguentar. O jovem se dobrou e vomitou como nunca antes havia vomitado, lágrimas lhe subindo aos olhos.
- Foi sua primeira vez, Darkus?- Perguntou Gerald, e pela primeira vez um tom, quase, totalmente gentil estava em sua voz.
- Sim..nunca matei alguém..e nem queria..- Balbuciou o menino um pouco envergonhado.
Gerald se ergueu do chão e colocou uma mão no ombro de Darkus, suspirando.
- E não deve querer. Matar é um trabalho mais difícil do que crêem os inocentes, e me odeio ao dizer que já me acostumei com a sensação graças ao estilo de vida que levo.- Comentou Gerald.
- É para isso que está me levando? Para uma vida em que eu vou ter que matar para sobreviver?- Perguntou com calma, apesar da raiva escondida naquele tom.
Gerald parecia querer falar algo, porém franziu as sombracelhas.
- Monte no cavalo e guarde essa espada aí, não é aço mas deve servir por enquanto. Passo Verde nos espera..-
Os dois não se falaram até chegarem no castelo na mata.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Trono de Ossos - Livro Um
FantasyVestroya, que impedia a passagem dos monstros aos Reinos dos Homens, caiu. O reino outrora poderoso, caiu perante as criaturas das trevas que se banquetearam sob as ruínas da cidade-estado e seus cadáveres. Nova Asgaet, Hyldren e os Estados Pontífic...