TRÊS

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Estava frio. Era sempre frio aqui. Mas hoje em específico, Toronto decidiu dar o máximo de si.

E se eu já era péssimo com horários em dias normais, imagina naqueles que o clima implora para você ficar na cama?! Cheguei na escola no segundo horário, correndo torcendo para não chegar mais atraso que já estava. Por sorte, os alunos estavam acabando entrando na sala de francês.

Me sentei de qualquer jeito, cansado. Que nem percebi quem estava ao meu redor quando ela se virou para entregar a folha de frequência para mim.

— Achou a sala de artes? — perguntei, assinando meu nome.

— Por pouco não chego atrasada, obrigada — sorri para Kimberly antes de passar a folha para trás.

A aula começou em seguida e como eu, ninguém se mostrou muito interessado. Nem mesmo o professor já que o mesmo abria a boca em um bocejo de cinco em cinco minutos. Se não tivesse câmeras em todas as salas, com certeza ele optaria por uma aula vaga onde todos estariam liberados para dormir.

Quando o sinal bateu, todos se levantaram se preparando para seguir o próprio horário. Me aproximei de Kimberly, segurando as alças da mochila.

— Pra qual aula vai agora? — ela me olhou por cima do ombro.

— Educação física — resmungou — E você?

— Matemática, infelizmente.

— Não quer trocar? — ri, balançando a cabeça.

— Se eu pudesse, juro que faria com prazer essa troca — ela sorriu, antes de se despedir com a mão indo para o corredor que dava na quadra.

Segui reto encontrando-me com Becca por alguns segundos. Nossos olhares se cruzaram e era como se eu tivesse tomado um banho de água gelada. Não se fazia nem vinte quatro horas e eu já estava morrendo de saudades. Se meu coração comandasse no lugar do meu cérebro, eu estaria implorando para voltar.

Segui até a sala da Sra. Fell. Encontrei meu amigo no meio do caminho, ele me contou que também foi escalado para ajudar no novo time desse ano. Mas eu sabia que ele só estaria lá para zuar com a cara dos caras que caíssem quando pisassem no gelo.

Ao entrar na sala, a professora que eu só odiava por conta da matéria nos cumprimentou. Marco e eu nos sentamos no fundo da classe, essa era a única matéria  que tínhamos aulas juntos então aproveitavámos para colocar o assunto em dia. E como diria outras pessoas: fofocar.

Os alunos ainda se acomodavam, quando a gêmea sem humor entrou na sala com seu moletom azul que sempre usava. Passou os olhos por toda a sala e revirou os olhos quando viu que o único lugar vago seria na minha frente.

— Se eu fosse você não estressava ela hoje — me virei para Marco — Falei "bom dia" para ela, e Marley simplesmente tacou a maçã que comia em mim.

Levantei às mãos em rendição e de fato não mexi com ela a aula inteira. Não é que eu a odiava nem nada, não tenho motivo para tal sentimento. Só que, eu sei que ela me odeia e isso é o suficiente para atiçar minha vontade de vê-la tão nervosa ao ponto de seu nariz ficar vermelho.

Claro que, eu não faço nada que possa magoa-la de verdade. Até porque ela é irmã do meu melhor amigo e ele trata ela como a mais preciosa jóia do mundo. É tudo pela diversão.

Só que no momento que a hora do intervalo foi anunciada a sala simplesmente virou uma bagunça. Um cara se desequilibrou e me empurrou, para não derrubar a garota na minha frente que tentava passar no corredor de cadeiras eu puxei sua mochila e retomei meu equilíbrio.

Porém, Marley se virou quase soltando fumaça pelos ouvidos em minha direção.

— Calma lá. Foi sem querer — ouvi a risada de Marco quando ela me atacou com a mochila — Ou, doeu.

Sorri, pegando seus pulsos fazendo ela ficar com mais raiva ainda.

E lá estava o nariz vermelho.

— Me solta — rosnou, fazendo-me dar um passo para trás ainda a segurando.

— Prometa que não vai me bater.

Marley cerrou os olhos em mim, deixando os ombros relaxarem antes de assentir. Soltei seus pulsos arrumando minha jaqueta do time.

Quando levantei o olhar, ela já não estava mais lá.

— Ainda vou descobrir o porquê ela é assim comigo  — Marco riu.

Nós dois seguimos para o refeitório nos sentando com o restante do time que discutia sobre algumas estratégias de jogo. Becca entrou pela porta junto com algumas amigas mas ao contrário do que fazia, se sentou na mesa ao lado e não na minha.

Aquilo doeu.

Ela me olhou e sorriu sem mostrar os dentes mas logo voltou a conversar com as garotas. Também foquei na conversa do time apesar de não entender o que estavam falando, parecia um zumbido insistente no meu ouvido que me impedia de raciocinar e só, reviver os momentos e pensar onde foi que eu errei. Queria estar com Becca.

O refeitório tinha uma grande abertura que dava visão para o corredor das salas. Eu sabia que a irmã do meu melhor amigo sofria bullying, pelo fato de ser quietinha e nerd, eu acho. E, merda, ela não podia ir com minha cara mas eu cresci com Marley  não ia deixar aqueles idiotas continuarem.

Cutuquei Marco e em segundos estávamos indo em direção a ela. Empurrei Brandon para longe, fazendo suas costas baterem no armário enquanto Marco tirava a irmã de lá. O outro que era igualmente grande, Dimitri, me puxou pela camisa imobilizando-me.

Os dois me puxaram para longe da vista das pessoas que comiam e eu soube que estaria ferrado.

— A gente só tava brincando — revirei os olhos para Brandon.

— O que custa deixá-la em paz? Vocês são dois idiotas burros que... — o primeiro soco veio. Odiava valentões.

Aproveitei que estavam rindo para chutar o meio das pernas Brandon. Gargalhei, esquecendo que o outro ainda me segurava.

— Porra! Dá pra parar de me bater? — resmunguei ao levar outro soco no rosto.

Cuspi um pouco de sangue que se juntou na minha boca depois que meus próprios dentes cortaram minha bochecha.

— Vocês três, para minha sala!

Te vejo no futuro.Onde histórias criam vida. Descubra agora